Economia

Real fraco deve garantir remuneração à soja em 2015

Redação Folha Vitória

- A desvalorização do real deve garantir um ano remunerador para o setor de soja do País, apesar da perspectiva de colheita doméstica de 95,80 milhões de toneladas na sequência da safra norte-americana de 107,73 milhões de toneladas. Ainda que os contratos futuros negociados na Bolsa de Chicago estejam abaixo dos US$ 12 a US$ 13 por bushel de janeiro de 2014, se mantém acima de US$ 10/bushel o que, com o dólar acima de R$ 2,60, permite negociações no mercado brasileiro em níveis de preço próximos aos de um ano atrás. Além disso, o bom desempenho do setor de proteína animal no mundo e o aumento da mistura de biodiesel no diesel no Brasil tendem a estimular exportações e consumo interno da oleaginosa brasileira em 2015.

"Houve aumento sensível no câmbio, o que de certa forma reduziu um pouco a perda de valor da soja por preço de mercado no mercado internacional. A mudança do dólar compensou pelo menos 1/3 ou 1/4 da diferença na queda do preço da soja na exportação", disse o presidente executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), Carlo Lovatelli. A associação prevê que o preço médio por tonelada da soja em dólar recue para US$ 370 em 2015 ante US$ 510 em 2014. O presidente da Aprosoja Brasil, Almir Dalpasquale, ressalta que a disparada do dólar ocorreu em um momento em que boa parte do custo da safra 2014/15 já havia sido acertada. "O produtor veio numa boa maré de custo de produção em relação a preço, pois fez compras de insumos com o dólar entre R$ 2 e R$ 2,20 e agora o câmbio já está em mais de R$ 2,60. É um spread bom. Permite obter receita sobre o que gastou."

O câmbio favorável para exportação no Brasil, aliado à CBOT próxima de US$ 10/bushel, dá algum ânimo ao produtor brasileiro, segundo o analista Renato Rasmussen, do Rabobank. "Será um ano de margens menos positivas do que nos últimos anos, mas a queda não deve ser tão expressiva." O analista Pedro Dejneka, da AGR Brasil, reitera que o real em queda ante o dólar compensa parte da tendência de baixa em Chicago para o sojicultor nacional. "O forte movimento de alta do dólar este ano é um presente para os produtores nacionais que em alguns locais recebem mais pela soja hoje do que recebiam na mesma época do ano passado, quando o grão operava a US$ 2,50 por bushel acima de onde opera hoje", explica.

Daqui para frente, produtores brasileiros devem aproveitar picos de câmbio e futuros para negociar volumes maiores. "O produtor conseguiu nas últimas safras brasileiras colheitas boas e preços bons e ficou em uma situação financeira tranquila", salienta o presidente da Aprosoja Brasil. "Ele comprou grande parte do custeio com recursos próprios. Isso dá mais tranquilidade para fazer a opção de arriscar um pouco mais e buscar o valor que acredita que pode obter." Fábio Trigueirinho, secretário geral da Abiove, pondera, entretanto, que a velocidade de negociação deve continuar mais lenta do que em 2013/14, movimento já observado na comercialização antecipada. "Quando o preço está mais alto, roda bem rápido. Com preço mais baixo, o produtor fica mais reticente, vai com mais cuidado."

O piso de US$ 10/bushel na CBOT, que vem se mantendo apesar da tendência de reposição dos estoques globais, ainda é uma incógnita por dois fatores: crescimento da demanda e influência de fundos especulativos. "Os preços são incongruentes com a atual conjuntura de oferta. Por uma ótica histórica, deveríamos ter cotações abaixo de US$ 9/bushel", destaca Rasmussen. Para ele, o mercado pode estar passando por uma mudança de patamar. "Temos a sinalização de que haverá um excedente no fim de 2014/15. Apesar disso, os preços estão resilientes em US$ 10/bushel", salientou. "Mas tem de ficar claro que o espaço para queda ainda está na mesa." A analista Aline Ferro, da consultoria Céleres, pondera que a colheita brasileira deve pressionar o mercado, mas talvez não tanto como se esperava há alguns meses. "A CBOT pode voltar a US$ 9,50/bushel, mas não projetamos que vá muito abaixo disso. Temos uma demanda firme", assinala. "Existe um balanço confortável, então no curto prazo a tendência é de que os movimentos baixistas persistam. À medida que a safra for andando na América do Sul, a demanda volta a exercer influência positiva, mais para o segundo semestre."

Andrea Cordeiro, analista da corretora Labhoro, acredita que condições climáticas normais na América do Sul, com regularidade de chuvas no verão, dão ao mercado maior vulnerabilidade à queda em janeiro do que dezembro. Além de o produtor brasileiro estar mais disposto a negociar com a proximidade da colheita, o sojicultor dos EUA deve desovar estoques aproveitando o novo ano fiscal. Mas o impulso especulativo recente sobre o mercado futuro de grãos também precisa ser levado em conta, segundo a analista. "Se o clima não for favorável, podemos ter compras desproporcionais. É um outro mercado no caso de estoques mundiais repostos", afirma. "O 'sonho altista' depende de uma frustração da safra da América do Sul. Se a gente tiver uma situação de safra normal, o mercado deve sentir o peso disso."

"A cada semana de clima favorável, há menos espaço para alta", diz Dejneka. "Qualquer número acima de 90 milhões de toneladas para a safra brasileira é um número amigável." Segundo ele, outro fator-chave para o direcionamento dos preços no início de 2015 é o relatório de oferta e demanda do dia 12 de janeiro do Departamento de Agricultura dos EUA, mostrando o tamanho final da colheita dos EUA.

Apesar do aumento da oferta, as perspectivas para a demanda, tanto externa quanto internamente, são positivas. "Tanto o Brasil como os EUA vêm com safras grandes. Em compensação, tivemos um grande aumento de consumo de farelo com o preço das carnes elevado", diz André Mesquita, vice-presidente de produtos do Banco Indusval. "Se tivesse muita oferta e preço da carne baixo, o cenário de preço seria pior para a soja. Mas temos uma demanda razoavelmente forte." Ele assinala que o preço da proteína animal atingiu em 2014 um dos maiores níveis da História. "Vale a pena gastar mais para produzir mais carne", destaca. "A cadeia de carnes bovinas vai demorar um tempo para ajustar. Suínos e aves podem ter ajustes mais rápidos."

Aline, da Céleres, destaca que o mercado de carnes continua em um nível relativamente elevado, o que estimula a procura por alimentação animal. "Estamos caminhando para uma tendência de aumento do consumo de ração até metade de 2015", avalia Rasmussen, do Rabobank. "Com o preço bom da proteína animal no mundo, temos um movimento de aumentar o confinamento. Para produzir essa ração, vai precisar de bastante soja. As exportações brasileiras devem se expandir." Como o farelo de soja é essencial na produção de ração, em virtude do nível proteico, a perspectiva é de crescimento do volume exportado não só na soja em grão como no derivado, segundo a Abiove. O setor de carnes no Brasil também está aquecido e deve aumentar o consumo de farelo. "A proteína da soja permite que o Brasil tenha uma performance bastante favorável também no mercado de carnes de frangos, suínos, avicultura de postura, alguma coisa de leite, então é um setor que tem uma ligação muito forte com a parte de carnes", salienta Trigueirinho.

Outro elemento que deve aumentar a procura por soja internamente em 2015 é a lei 13.033, que aumentou o porcentual de mistura do biodiesel no óleo diesel para 6% (B6) a partir de julho de 2014 e para 7% (B7) desde novembro de 2014. Segundo o assessor econômico da Abiove, Leonardo Zilio, até o momento a vigência do B7 no país decorreu sem maiores transtornos. "É importante o governo ter dado esse passo e, especialmente pensando em 2015, nós temos agora uma previsibilidade de vigência do B7 por 12 meses e isso facilita e torna mais eficiente a programação e o planejamento de safra, de compras e de transformação da soja em derivados pelas processadoras", aponta. A meta da associação é que o Brasil alcance o nível B10 em 2020. A Abiove avalia que a mistura de 10% de biodiesel no diesel contribuiria para o desenvolvimento do setor e beneficiaria o produtor rural, a indústria e a sociedade. "Nós temos uma capacidade ociosa (de esmagamento) superior a 40% ainda", diz Lovatelli.

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