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Exposição da obra de Lilly Ebstein será aberta hoje no Museu da Santa Casa

Redação Folha Vitória

São Paulo - Num livro recém-lançado, Anatomias - Uma História Cultural do Corpo Humano (Editora Record, 364 págs., R$ 44,90), o escritor e curador de arte inglês Hugh Aldersey Williams chama a atenção para o fato de que o homem contemporâneo não dá a devida importância ao corpo, a despeito do avanço da ciência e da nanotecnologia, que hoje permite explorá-lo sob todos os ângulos. As artes, defende o autor, "podem nos fazer revelações sobre nosso corpo que a medicina e a biologia não fazem". Para isso, ele se dispôs a frequentar um curso de desenho anatômico, mas não demonstrou grande talento para a tarefa. Não é o único. Até mesmo um gênio como Rembrandt, na tela A Lição de Anatomia do doutor Tulp, teve dificuldades para pintar o braço do morto que está sendo dissecado. Em contrapartida, a desenhista alemã Lilly Ebstein Lowenstein (1897-1966) teria feito o braço com a maior facilidade. Prova disso é a exposição Ciência e Arte - A Trajetória de Lilly Ebstein entre Berlim e São Paulo (1910-1960), que o Museu da Santa Casa de São Paulo abre nesta quarta, 25, às 11 horas.

A mostra marca os 50 anos de morte da ilustradora, que colaborou com os médicos brasileiros mais ilustres do século passado, entre eles Alfonso Bovero. Durante 30 anos, desde sua chegada a São Paulo, em 1925, ela ilustrou teses de doutoramento, revistas científicas e documentou aulas de professores de Medicina, como fez Rembrandt para o doutor Tulp, renomado cirurgião holandês. Tornou-se uma referência na área, ao assumir, em 1932, a chefia da seção de Desenho e Fotografia da Faculdade de Medicina e Cirurgia de São Paulo (hoje Faculdade de Medicina da USP).

A exposição de Lilly Ebstein inaugura uma nova fase do Museu da Santa Casa, instalado ao lado da Provedoria. Ele completa 15 anos com planos de expansão, graças ao apoio do novo provedor, o pediatra José Luiz Egydio Setúbal, lembra a diretora June Locke Arruda. "A mostra ocupa uma nova área no prédio da Santa Casa e abre espaço para outras exposições temporárias que pretendemos organizar", diz a diretora do museu, que recebeu como doação da neta da ilustradora, Ester Lowenstein, um álbum com desenhos originais de anatomia humana. Eles revelam a perícia e a sensibilidade de sua avó, não por acaso casada com um entusiasta das artes, dono da Metalúrgica Aliança, que ocupava o mesmo prédio onde funcionou a primeira sede do Masp, em 1947. Segundo Ester, o museu cobiçava a coleção das obras do pintor e escultor italiano Ernesto de Fiori do acervo da família Lowenstein.

Como De Fiori, Lilly passou alguns anos exercitando seus dons artísticos em Berlim. O período alemão da ilustradora foi marcante. Monica Musatti Cytrynowicz, curadora da mostra e autora do texto do livro dedicado a Lilly Ebstein, cita como seu mestre maior o anatomista Hans Virchow (1850-1940), um professor da Faculdade de Medicina de Berlim e também da Universität der Künste Berlin (Universidade das Artes de Berlim). "Ela foi uma mulher emancipada, que passou pela escola Lette-Verein de Berlim entre 1911 e 1914, quando só havia entre 4.500 e 5.000 mulheres universitárias na Alemanha, França e Itália." A escola alemã, fundada em 1866, está completando 150 anos e vai receber a mesma exposição itinerante do Museu da Santa Casa.

Lilly Ebstein, lembra a neta, era uma mulher corajosa, capaz de entrar numa sala de dissecação, segurar um coração numa das mãos e desenhá-lo com a outra. E não ficou conhecida apenas pelos desenhos anatômicos do corpo humano. Suas fotomicrografias (fotografias de imagens microscópicas) para o Instituto Biológico, de 1926 em diante, foram de grande valia para o registro de doenças em animais (especialmente aves). Para melhor visualização, nos trabalhos ilustrados por Lilly é possível observar, segundo a curadora da exposição, colorizações desses registros. Lilly, segundo Monica, "também desenhava diretamente com base na observação ao microscópio".

E prosseguiu nessa sua investigação liliputiana mesmo após se aposentar, em 1955, segundo a neta. "Ela passou seus últimos dias no Guarujá e gostava de pintar xícaras de porcelana com motivos como células", lembra Ester Lowenstein. Mas Lilly nunca encarou sua atividade como artística. Por isso, ela não deixou desenhos ou pinturas fora da área científica, revela. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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