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Noveletto cobra transparência e diz que governo pode intervir na CBF

Redação Folha Vitória

Porto Alegre - Chico é um dos poucos presidentes de federação que fazem oposição declarada a Marco Polo Del Nero. Tentou, inclusive, a presidência da CBF. Chico é Francisco Novelletto Neto, de 60 anos, presidente da Federação Gaúcha de Futebol. Ele fala com cautela da crise, mas entende que, se a administração não for passada a limpo, há risco até de intervenção no futebol brasileiro. "Se a gente não der uma cara de transparência, de organização, vão intervir", acredita.

Novelletto foi uma das vozes mais ativas contra a manobra que Del Nero tentou dar, ao propor alteração no estatuto da CBF para que o vice mais velho (hoje Delfim Peixoto, presidente da Federação Catarinense) não assuma a presidência em caso de vacância do cargo. A manobra não passou na assembleia extraordinária da CBF que ocorreu na última quinta-feira. "Não se pode mudar a regra no meio do jogo", disse Novelletto à reportagem, em entrevista concedida na nova sede da Federação Gaúcha, inaugurada há um mês. Ele preside a entidade desde 2004 e, lá, todos os chamam de Chico, da recepcionista ao vice-presidente.

Confira a entrevista:

Para onde vai o futebol brasileiro com tudo isso que está acontecendo?

É ruim. O pior na vida, no esporte, ou em qualquer lugar que seja é perder a credibilidade. Só o que eu quero é que sejam apuradas (as denúncias de corrupção). Não estou condenando o Marin, nem ninguém. Eu não conheço o processo. Agora, quem realmente estiver envolvido... espero que limpe de uma vez, porque tem gente boa, muita gente boa, no futebol, e está todo mundo na vala comum.

A imagem do dirigente está bem ruim... Cartola é tudo safado. Essa é a imagem. Eu, que me dedico seis a sete horas por dia aqui (na Federação Gaúcha), e no telefone (celular) 24 horas, que não é da federação, é meu, pago com meu dinheiro, atendendo quem precisa de alguma coisa... Falam: "Ah, ele também é cartola, ficou rico por causa do futebol". Ao contrário, tem dinheiro meu aqui dentro (da federação). Eu queria que de uma vez por todas que cortasse esse cordão (com os maus dirigentes).

O que os dirigentes de federação podem fazer para mudar o quadro?

Muito pouco. Oposição, o que tem lá (na CBF)? Eu, o da Paranaense (presidente Hélio Cury). Eu sou a favor da mudança no estatuto. Não acho justo perpetuar no cargo, 40 anos. Dois mandatos é o ideal. Vamos seguir o que é na política (cargos executivos), nos clubes muitos já podem mais renovar o mandato. Estou de acordo.

E sobre esse artigo que garante ao vice-presidente mais velho assumir a presidência em caso de vacância?

Quando eu cheguei na CBF e entendi como se escolhia o sucessor, achei um absurdo. Por que o mais velho?

Mas o senhor foi contra mudar o estatuto. O Delfim Peixoto chegou a dizer que queriam dar um golpe na vez dele...

Não podemos mudar o jogo no meio, passar por cima do regulamento. Estou de acordo com a mudança do estatuto, mas tem de ver quando. Até porque gato escaldado tem medo de água fria. Aconteceu com o Ricardo Teixeira. Ele disse que iria até o fim e saiu antes.

O senhor esperava que Ricardo Teixeira fosse renunciar?

Eu fui um dos que ele cobrou, quando o questionei sobre os comentários de que iria renunciar. Ele me disse que eu tinha de confiar na palavra dele, que era meu amigo, em vez de confiar na imprensa, nos fofoqueiros. Disse: "Eu vou cumprir o meu mandato" e 15 dias depois me deixou na mão.

E agora, o senhor acredita que o Marco Polo vai até o final?

Eu não vou pagar o mico duas vezes.

Dizem que foi um agrado do Del Nero te colocar como chefe da delegação no jogo entre Brasil e Honduras (realizado quarta-feira, em Porto Alegre)...

Eu não preciso de agrado. O Marco Polo sabe que eu sou independente. Não preciso de agrado. Ele deu (a chefia) porque eu estava aqui, vivo aqui.

Marco Polo tem condições de reverter a situação, com pressão do próprio ambiente do futebol, do Congresso, CPI...

Foi uma jogada inteligente dele ter ido ao Congresso. Ele não foi convocado, foi convidado, saiu na frente. Futebol tem de ter credibilidade. Não pode ter rabo preso. Atrapalha o trabalho ter de parar para explicar.

O futebol está bem dentro de campo?

Não dá para dizer que está indo bem depois de levar sete (referência aos 7 a 1 da Alemanha).

Mas isso vai fazer um ano?

Agora temos um técnico (Dunga) que é um brigão, mas está muito mudado, agora tem retaguarda. Antes era vidraça. E sabe onde quer chegar. É brigão, cara amarrada. Mas se você quer um bonzinho leva o Novelleto (para ser treinador da seleção). Novelletto não enche o saco de ninguém, mas não vai ganhar.

E o futebol interno? Há, por exemplo, um movimento para mudar a fórmula do Brasileiro...

Sou contra. A gente está indo contra o mundo. O clube que chega até a final (no sistema mata-mata), ótimo, vai ganhar dinheiro. E aquele que morre no meio do caminho? Você faz contrato com o jogador até dezembro, em outubro sai do campeonato e com faz para pagar os dois meses de salário?

Os clubes vão ter autonomia para decidir a fórmula. As federações podem opinar nesse processo?

Eu só digo o seguinte: vai ser um grande prejuízo para o futebol brasileiro se formarem a tal Liga. Eu estou defendendo o Marco Polo nessa. Porque mal ou bem existe o interesse da CBF em organizar. Agora, fazendo uma Liga, são 20 interesses diferentes. Cada um querendo ferrar o outro. É Torre de Babel. Fazer Liga é trocar seis por meia dúzia.

Em relação as cotas de televisão, defende mudança?

No mundo funciona assim. Time com mais torcida, e mais audiência, ganha mais. Mudar vai ser pior. Na Liga os clubes são se matar, cada um querendo mais.

O senhor teme que toda essa confusão, essas denúncias, mudem a estrutura de poder do futebol brasileiro?

Se não der transparência, se não descobrir quem está no rolo, quem não está... A gente viu isso com o Ricardo Teixeira. Era todo dia batendo, batendo, batendo... Se a gente não der uma cara de transparência, de organização, vão intervir. Não sei de que maneira, mas vão. Vão tirar o Campeonato Brasileiro (da CBF).

Essa intervenção seria do governo?

Até do governo.

Mas o senhor acredita que o Marin não tem culpa?

Uma vez eu tive uma bronca com um dirigente aqui no Sul, por um negócio esquisito, fiz uma crítica a ele. Passou dois anos ele me esfregou na cara que foi absolvido. Paguei um mico. O que vale é o final. Acho que Deus crucificou o Marin, se é que ele está envolvido, para dar exemplos para nós. Mas o ser humano às vezes não quer aprender.

A credibilidade do futebol brasileiro internacionalmente foi muito afetada com esse escândalo?

Está cada vez pior. É hora de banir, de limpar. Não estou condenando ninguém. Tem de ter provas. As evidências são fortes, mas eu quero ver pra depois bater. Até para minha posição de oposição. Se eu sair falando aqui, vão me chamar de oportunista. Mau caráter eu não sou.

O senhor está preocupado com a sua imagem?

Também, mesmo eu não precisando. Está tudo mundo mesmo barco. Por exemplo: fui questionado porque minha rede de lojas (Multisom, de instrumentos musicais, informática e eletrônicos, com 130 lojas no Sul) estava vendendo ingressos para Brasil e Honduras. A CBF me pediu, eu indiquei (as lojas) porque minha rede vende 90% dos ingressos de shows aqui e em Santa Catarina. Eu não ganho nada. Pelo contrário, tenho de pagar para fazer show. Por que faço isso? Para levar gente lá pra dentro. Aí, quando você quiser comprar instrumento, lembra da loja, vai lá e compra.

O senhor se candidataria à presidência da CBF?

Tudo na vida eu tento uma vez (tentou concorrer contra Del Nero em 2014, mas, sem apoio, não apresentou a candidatura), eu não forço barra. Naquela ocasião eu botei a cara e mantive. Não digo que não me candidataria, mas não corro atrás. Aqui (na Gaúcha) eu nunca pedi um voto.

Essa nova sede da federação custou R$ 20 milhões. Já está paga?

Vendi os naming rigths (para uma empresa de seguros). Tem dois estádios aí (beira-rio e Arena Grêmio) que os clubes não conseguem vender. Eu vendi um prédio.

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