O significado do “Pibinho”

Ana Paula Vescovi (*)

O IBGE divulgou recentemente os dados sobre o crescimento da economia brasileira em 2012. Contrapondo-se às melhores estimativas do governo e do mercado, o Produto Interno Bruto do Brasil – indicador que mede o fluxo de produção de bens e serviços – cresceu modestos 0,9% comparativamente ao ano anterior. Esse é o mais baixo crescimento da economia brasileira desde 2009 (-0,6%), ano mais severo da crise internacional. Sem contar o resultado atípico de 2009, estaríamos falando do mais baixo crescimento brasileiro dos últimos 14 anos.

Antes de entrar na complexa discussão dos determinantes do baixo crescimento, um primeiro passo é entender o seu significado diante do desempenho histórico da economia brasileira. O Gráfico abaixo revela alguns fatos já bastante documentados na literatura de economia.

 

Gráfico 1 – Variação real do PIB a preços de mercado. Brasil. 1900 a 2012.

Fonte: IBGE. Elaboração própria.

Num primeiro período, até meados dos anos 40, a economia brasileira cresceu 4,3% ao ano, em média, com ciclos muito curtos entre recessões e expansões. Na segunda fase, dos anos 40 aos anos 70, experimentou longo período de expansão da renda, com crescimento médio elevado (7,4%), sem queda no PIB. Em particular, o período compreendido entre 1968 e 1973 ficou conhecido como “milagre brasileiro”, por conta de meia década com crescimento médio de 11,2% ao ano (8,2% per capita).

Nos anos 80 a alcunha mudou radicalmente, para “década perdida” quando, até meados dos anos 90, o crescimento médio foi de apenas 1,4%, com PIB per capita negativo (-0,5%) e ciclos curtíssimos entre expansão e retração. Os desequilíbrios gerados pela marcha forçada do crescimento da década anterior, aliado às duas crises internacionais do petróleo, retirou a economia brasileira do seu trilho de expansão, quando, baseada em déficits gêmeos estruturais, amargou longo período de hiperinflação. A instabilidade e a aceleração inflacionária foi o que mais se destacou nesse período.

Somente a partir de meados dos anos 90 o PIB reagiu, e voltou a crescer em média impulsionado por uma ampla reestruturação na política econômica.  Além dos efeitos da abertura comercial do início da década, ocorreu o retorno no Brasil à comunidade financeira internacional com a renegociação da sua dívida externa; a estabilização monetária; uma reforma do Estado; a flexibilização cambial; e um ajuste fiscal amplo e sólido. De 1993 até a crise de 2008 a economia cresceu em média 3,5%, na esteira de inúmeras reformas estruturais e institucionais, embora respaldada por períodos alternados de crises e prosperidade na economia mundial. Em particular, a partir dos anos 2000, o País colheu os frutos de um boom de preços internacionais de commodities.

Após a crise de 2008, percebe-se alguma perda de ritmo no potencial de crescimento da economia brasileira, que cresceu desde então 2,7% em média. O ano de 2012 trouxe assim, uma expansão notadamente baixa (0,9%) e que merece uma reflexão sobre seus determinantes de curto e longo prazo. E, além disso, a se confirmarem projeções de crescimento entre 3% e 4% para 2013 e 2014, o Brasil está consolidando crescimento potencial de 3%, muito abaixo do potencial dos demais BRICs e principais emergentes, acima de 5% ao ano, ainda que também expostos à crise internacional.

As comparações com outros países tornam-se ainda mais reveladoras. Em 2012, o Brasil foi o País que menos cresceu entre os BRICs. A China teve o maior crescimento (7,8%), seguida pela Índia (5%),  Rússia (3,4%) e África do Sul (2,5%). E também cresceu abaixo dos nossos vizinhos latino-americanos: conforme estimativas da CEPAL, apenas o Paraguai terá crescimento mais baixo do PIB. A Bolívia, o Chile, a Costa Rica, a Nicarágua e a Venezuela devem crescer 5%, enquanto o México terá expansão de 4%.
Mais surpreendente é o fato de que o Brasil também cresceu menos que algumas nações desenvolvidas, onde a crise é mais severa. O Japão teve alta de 1,9%, os Estados Unidos e a Coreia do Sul, de 2,2%, e a Alemanha cresceu os mesmos 0,9%.

Não apenas os dados pontuais mostram a relativa desvantagem. Também ao longo do tempo, o Brasil vem crescendo abaixo do observado para diversos emergentes. Tomando-se o conjunto de seis países (Chile, Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), o Brasil foi o País que apresentou crescimento real mais baixo nos anos 2000, muito próximo ao da África do Sul, mesmo beneficiado pelo ciclo de alta das commodities.

Gráfico 2 – Evolução do PIB real para um conjunto selecionado de Países.
Base 1999=100.

A mesma desvantagem fica aparente numa perspectiva de prazo mais longo. É possível comparar a evolução relativa das economias do Brasil, da Coréia e do Chile, por exemplo, descontando diferenças relacionadas ao tamanho populacional.  Tomando-se os EUA como uma fronteira ou referência para a renda per capita, medida em paridade do poder de compra, é possível notar que o Brasil, no início dos anos 80, tinha uma posição relativa melhor. No início dos anos 80, após o milagre econômico, a renda per capita brasileira se equivalia a 30% da renda per capita dos EUA. A do Chile era 24% e a da Coreana, 19%. A população brasileira, portanto, em 1980, era relativamente mais rica do que  a desses outros dois países.

Passados 30 anos, a renda média dos brasileiros caiu para um quarto da renda média dos EUA, a renda chilena subiu para 35% e a renda coreana saltou para 65%. Segundo as projeções do FMI para 2017, o Brasil manterá sua posição relativa, o Chile alcançará 40% da renda média americana e, a Coreia do Sul, 70%.

Gráfico 3 – Razão da renda per capita em US$ PPP – comparada com a renda per capita dos EUA. Brasil, Chile e Coreia do Sul.

Fonte: IFS/FMI. Elaboração própria.

No caso do Brasil, a tendência persistente de queda se reverteu durante o boom das commodities e em decorrência dos elevados ganhos em termos, mas apenas voltou ao patamar de 1995. A partir de 2010 já é possível observar alguma estagnação.

Assim, em qualquer base de comparação, com o próprio passado ou com outros países, é fácil perceber o significado de um PIB de 0,9% em 2012. Para aqueles que acompanham de perto tal comportamento, intriga saber que o Brasil é um País em desenvolvimento com crescimento potencial abaixo dos seus congêneres. Por que o Brasil, afinal, com tantos potenciais ainda inexplorados não consegue crescer, de modo sustentado, ao mesmo ritmo dos demais emergentes?

Bem, inevitavelmente este é um assunto rico em análises e com diferentes óticas, o que nos confere a possibilidade de várias discussões com os leitores desse espaço. Mas trata-se de um tema para próximos artigos!

(*) Assessora de Economia no Senado Federal e Diretora de conteúdo do IBEF-ES.

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