Política

Psicóloga fala sobre dificuldades e desafios do sonho de adotar uma criança

Cecília Lemos

Cecília Lemos, psicóloga e integrante do grupo Ciranda Foto: Divulgação

Trabalhar e falar sobre adoção através das experiências de seus membros mais antigos, seja com casais que estão aguardando ansiosamente na fila de espera ou com os novos pais que acabaram de receber a guarda de seus filhos: esse é o trabalho do Grupo Ciranda, um grupo de apoio à adoção que atua em Vitória e demais cidades da região metropolitana desde 2008, ano em que foi fundado.

Após a comemoração do Dia Mundial da Adoção (25 de maio), o Folha Vitória debate junto com Cecília Lemos, psicóloga e voluntária no Grupo, as dificuldades e desafios dessa nobre ação.

Na entrevista, Cecília conta um pouco do papel do grupo junto as pessoas interessadas em adotar, da realidade e dificuldade dessa etapa e do motivo para que a fila da adoção não acabe - mesmo com o número de pessoas habilitadas a adotar seja muito maior que o de crianças disponíveis.

Folha Vitória: Como funciona o grupo Ciranda e qual a função que ele desempanha para a adoção?
Cecília Lemos: O Ciranda é um grupo informal, ele foi organizado por uma pessoa que já tinha adotado uma criança e se sentia muito sozinha, não tinha quem compartilhar as angústias, as dificuldades. É um grupo aberto, para quem quer conversar sobre adoção, sejam pessoas que já adotaram, que estão na fila para adotar ou que se interessam pelo tema. O grupo funciona como uma roda de conversa e as nossas reuniões acontecem sempre na segunda quinta-feira do mês, a partir das 19 horas, na Fucape (localizada na Av. Fernando Ferrari, em frente a Ufes). 

F.V: O número de pessoas que quer adotar é muito maior que o número de crianças na fila. Porque essa conta não fecha?
C.L: Algumas situações tem que ser explicadas nesse caso. Quando são pessoas que querem adotar porque não puderem ter filhos biológicos elas começam a pensar em adoção de bebê e estendem esse pensamento até crianças de 3 a 4 anos, no máximo. Mas o que a gente vê no abrigo são crianças um pouco mais velhas e isso já começa a dificultar. Além disso, uma outra questão é o número de irmãos. Quando os pais perdem a guarda, eles perdem a guarda de todos os filhos e a justiça tenta fixar essas crianças todas juntas em uma outra família. Às vezes, em alguns casos, a justiça separa os irmãos, mas essa é uma situação muito complexa. Todas essas situações dificultam o processo de adoção.

F.V: A escolha de raça e sexo também ajuda a causar essa morosidade?
C.L: Cada vez mais a gente percebe que as pessoas estão deixando de lado esta questão de sexo e raça. Muitas pessoas que querem adotar não tem ligado mais tanto para isso e esse é um dado que a gente deve valorizar. Mas, a questão de irmãos é mais difícil mesmo, o processo de adaptação é mais complicado. A adoção não termina quando a criança chega na sua casa, ali está só começando uma nova fase. Às vezes, a pessoa fica com muito medo, ela pensa como que será a adaptação de duas, três crianças. A mídia tem ajudado nesse sentido, eles mostram cada vez mais pessoas que adotaram um grupo de irmãos e isso é bom. Além disso, cada vez mais as pessoas começam a procurar duas crianças, elas já estão pensando que não parece ser tão complicado.

F.V: E com relação a família, existe um perfil de famílias que entra nessa fila de adoção?
C.L: Também não dá para mensurar isso. Uma grande parte é de pessoas que não pode ter filho, mas temos os casos de pessoas que não quiseram ter filho biológico e adotaram, tem gente que já tem um filho biológico e quer completar a família com uma criança adotiva. São pessoas de todos os perfis.

F.V: Quanto tempo demora, em média, uma adoção?
C.L: Isso é muito relativo. Aqui no grupo tem pessoas que conseguiram adotar em um ano, mas teve um caso de um casal que ficou na fila da adoção por quase cinco anos. No geral, a média é de uns dois a três anos. 

F.V: Aumentou nos últimos anos a quantidade de adoção por casais homoafetivos e pessoas solteiras?
C.L: Esses números aumentaram bastante e isso é bem interessante. A adoção monoparental, onde só uma pessoa entra no processo aumentou. E o caso de adoção por casal homoafetivo também aumentou. Antigamente, esses casais que queriam adotar precisavam entrar com pedido monoparental, com todos os direitos sobre a criança, e a outra pessoa da relação ficava apenas como um pai afetivo.

F.V: Quais as maiores dificuldades das pessoas que desejam adotar hoje em dia?
C.L: Uma das grandes dificuldades é a questão da espera. Claro que as pessoas que desejam adotar já sabem que a espera é grande, mas é muito mais complexo que isso. Numa adoção você não sabe quando seu filho chega, com que idade chega, qual o sexo que ele vai ter. É totalmente diferente de uma gravidez, por exemplo, que a pessoa pode saber sexo e sabe que em nove meses a criança vai estar ali. O que a gente faz é dar apoio a essas pessoas que pretendem adotar, para elas terem a oportunidade de falar disso. Existe também o processo de adaptação, que é complicado. Se é uma criança mais velha, se ele tiver sido muito magoado no passado, os pais pensam "como vou fazer para criar uma criança". A gente ajuda a explicar como é o processo de desenvolvimento, tenta auxiliar, falar para sempre contar a verdade, nunca esconder nada da criança.

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