Operadoras de telefonia cortam investimentos em 2015
Rio - O setor de telecomunicações deve frear os investimentos em infraestrutura neste ano, diante do cenário macroeconômico adverso, o que pode significar a deterioração dos serviços na visão de especialistas. A previsão é de somar R$ 21,7 bilhões, ou 0,37% do Produto Interno Bruto (PIB), queda de 26% frente aos R$ 29,3 bilhões de 2014 e abaixo do patamar de 2013 (R$ 22,2 bilhões), revela estudo da Inter.B Consultoria a que o Broadcast, serviço de notícias em tempo real da Agência Estado, teve acesso com exclusividade.
O presidente da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), João Rezende, disse ao Broadcast que há uma pressão sobre as teles, principalmente as móveis, pela migração acelerada dos usuários do 2G para o 3G, o que faz com que o tráfego de dados aumente - o número de usuários que migra de tecnologia é, em média, de 3 milhões por mês, disse. "Os investimentos têm de ser acelerados para atender a essa demanda, não há dúvida", afirmou.
A retração prevista pela Inter.B significará uma interrupção do movimento de recuperação que ocorreu em 2014 ante o ano anterior. Na passagem de 2012 para 2013, as operadoras de telecomunicações, ao lado da Telebrás, já tinham reduzido os investimentos, e, no período seguinte, elevado.
O levantamento, com base no balanço das companhias, considera apenas gastos com infraestrutura, o que exclui, por exemplo, dispêndios com licenças. "Todo o investimento em infraestrutura está sendo afetado pelas condições macroeconômicas que o País vive, com forte ajuste fiscal e aumento dos juros, que significa elevação do custo do capital. Certamente não é um ambiente que estimule o investimento, principalmente os de capital intensivo, que são muito pesados", afirmou Cláudio Frischtak, sócio da Inter.B.
Na visão do especialista, entre os principais desafios do setor atualmente estão a extensão e a qualidade da cobertura. "As operadoras têm que investir, amortizar e retornar o dinheiro para os acionistas, não é simples essa equação." Um dos parâmetros utilizados para medir a qualidade dos serviços é a velocidade de acesso, explicou.
Para Frischtak, o Brasil está em uma situação que destoa de outros países nesse aspecto. No terceiro trimestre de 2014, a consultoria destaca que a velocidade média da internet em dispositivos móveis foi de 1,5 megabits por segundo (mbps), abaixo da África do Sul (2,5 mbps) e da Índia (1,7 mbps).
Diante de um quadro de possível retração dos investimentos, o presidente da Anatel declarou que a agência continuará pressionando as empresas para melhorarem a qualidade e expansão do serviço. Apesar disso, Rezende ressalta que a decisão dos investimentos é privada e não deve ser "engessada".
"O fato de diminuir os investimentos não significa que vai prejudicar diretamente o serviço, porque pode estar atuando com mais eficiência. Não vou entrar na questão da decisão empresarial", afirmou Rezende. A agência "vai continuar cobrando qualidade dos serviços e que investimentos tenham uma contribuição decisiva para atender a essa demanda crescente por telecomunicações", acrescentou.
Reclamações
Frischtak destaca que, com a disseminação do uso da telefonia móvel e internet, também se observa um aumento de reclamações das teles. "É possível que este aumento esteja relacionado com a queda de investimentos."
O setor é um dos campeões de reclamações no Brasil. Dados da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), do Ministério da Justiça, mostram que os atendimentos em Procons do País relacionados às oito principais operadoras vêm subindo ano a ano. Foram 601.095 em 2014, contra 515.168 em 2013 e 360.513 em 2012, altas de 16,7% e 42,9% na comparações anuais, respectivamente.
É preciso destacar que o número de Procons integrados ao Sindec também subiu no período, mas numa proporção menor: 13,6% entre 2013 e 2014 e 27,3% de 2012 para 2013. Ao final do ano passado, eram 360 Procons, que registram um porcentual médio de resolução de demandas acima de 80%.
"A tendência é que, na medida em que há um cenário de dificuldade econômica e não existam normas que estimulem os investimentos, a situação se agrave", afirmou a advogada Flávia Lefèvre, conselheira da Associação Proteste.
Na visão dela, a Anatel permite que as empresas façam investimentos de acordo com seus interesses econômicos. "Por isso, há uma concentração de investimentos em regiões onde há um número maior de consumidores corporativos e de alta renda. As empresas, ao mesmo tempo, priorizam a distribuição de lucros para sua matrizes e isso causa degradação dos serviços", disse.
O presidente da agência reguladora rebateu a crítica. Para Rezende, as operadoras precisam buscar rentabilidade em mercados mais lucrativos. "Se não fosse assim, não existiriam serviços em áreas que não gerassem rentabilidade. E cobramos isso", afirmou. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.