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Drama de guerra 'A Estrada 47' é vencedor do Cine Ceará

Redação Folha Vitória

Fortaleza - Depois de vencer o Festival de Gramado em agosto, A Estrada 47, de Vicente Ferraz, faturou o troféu Mucuripe de melhor filme no Cine Ceará 2014. Com uma história que tem por heróis os pracinhas brasileiros na Itália, durante a 2ª Guerra Mundial, A Estrada 47 levou também o prêmio de melhor direção de arte.

O longa, com estreia prevista para 2015, concorreu com produções do México, Equador, Porto Rico, Chile e Espanha, além de outras duas do Brasil. Algumas palavras sobre o vencedor. Revisto, continua parecendo um filme digno sobre episódio ainda controverso da História brasileira. Afinal, sabe-se hoje que Getúlio Vargas, então presidente, trocou vantagens econômicas junto ao governo americano pela participação de tropas brasileiras no esforço de guerra. Há muitos depoimentos sobre essa presença nacional em solo italiano, inclusive por gente que lá esteve, como Joel Silveira, Boris Schnaiderman e outros. O cinema às vezes foi cruel com a "incompetência" nacional para o combate, como no documentário Rádio Auriverde, de Sylvio Back. A Estrada 47 procura mostrar o reverso dessa história.

Nela, um pelotão brasileiro tenta limpar de minas antitanque a tal A Estrada 47, permitindo assim a passagem de tropas norte-americanas. O filme tem um miolo um tanto insosso, mas que prepara um desfecho muito bom, sobre a grandeza dos pequenos heróis, dos anônimos que se sacrificam pela glória alheia. Com um elenco bem afinado - Francisco Gaspar, Thogun Teixeira, Julio Andrade, Daniel de Oliveira, além do italiano Sergio Rubini e do alemão Richard Sammel - A Estrada 47 consegue bom equilíbrio entre o intimismo e as cenas de ação. Falta-lhe outro tanto de sentido épico e por isso às vezes parece morno. O final o redime.

Embora não vencedor, o espanhol Os Fenômenos foi bem premiado, ficando com os troféus de trilha sonora, roteiro e fotografia. Seu tema é a crise econômica do país e a maneira como afeta a classe trabalhadora. A almodovariana Lola Duenãs faz a mãe de família obrigada a se empregar na construção civil por falta de alternativas. O filme é crítico e não se concede a facilidade da autoindulgência. Duenãs, no papel de Neneta, é uma lutadora e vencedora, apesar de ter tudo contra si. Em especial, uma sociedade economicamente indiferente para com os mais desprotegidos. Belo filme, que poderia perfeitamente ter vencido o festival.

Também agradou ao júri o mexicano Obediência Perfeita, que ficou com os troféus de direção (Luiz Urquiza) e ator (Sebastián Aguirre). Forneceu ao festival seus momentos mais polêmicos com a história de pedofilia numa organização católica. Talvez um pouco solene em determinadas passagens, mas sempre incisivo, mostra que o cinema mexicano atravessa excelente fase e não se intimida diante de temas difíceis. Pode servir de exemplo a cinematografias mais acomodadas.

O melhor curta, para o júri oficial, foi a animação Edifício Tatuapé Mahal, de Fernanda Salloum e Carolina Markowicz. Narra a saga de um boneco de maquete imobiliário, argentino e que trabalha em São Paulo. Com a história contada em primeira pessoa, com voz over, o curta é inventivo e engraçado, sem deixar de fazer uma crítica bem-humorada dos engodos da especulação imobiliária.

A crítica, representada em júri organizado pela Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine), escolheu o documentário A Vida Privada dos Hipopótamos, de Matias Mariani e Maíra Bühler, como melhor longa e História Natural, de Julio Cavani, como melhor curta. Buscou destacar o que havia de mais inovador no cardápio oferecido pelo Cine Ceará.

Tudo somado, foi um bom festival. Poderia até ter sido melhor, caso a curadoria privilegiasse a seleção de títulos inéditos para a mostra competitiva. Cometeu algumas repetições, a exemplo de outros festivais no Brasil, é bom que se diga.

A retrospectiva Foco Argentina, pelo contrário, buscou a originalidade ao oferecer títulos pouco conhecidos do país vizinho, em especial os do gênero terror, que pouco circulam por aqui. Acertou, também, ao homenagear o diretor Daniel Burman (de Abraço Partido e Ninho Vazio) que faz um cinema inteligente, porém de diálogo popular. Burman teve um encontro interessante com os jornalistas. Perguntaram-lhe por que motivo os roteiros argentinos são tão bons, na média. Burman não titubeou na resposta: "É o hábito de leitura do meu país. As pessoas leem muito, há muitas livrarias, e isso cria uma prática que se reflete na hora de escrever um roteiro". Burman disse ainda que parte do segredo desse hábito disseminado está no preço acessível dos livros. "Aqui no Brasil, pelo contrário, fiquei espantado pelo custo dos livros nas livrarias". Não apenas você, Burman. Sem leitura, não há solução.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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