O professor Frank Muller e seus alunos de jiu-jítsu da Academia Bulldog, em Vila Graúna, Cariacica
O professor Frank Muller e seus alunos de jiu-jítsu da Academia Bulldog, em Vila Graúna, Cariacica. Foto: Thiago Soares/Folha Vitória

Entre as salas de aula de escolas públicas e os tatames, a missão de ensinar crianças e adolescentes sempre acompanha o professor Frank Muller. Responsável pela Academia Bulldog, que dá aulas de jiu-jítsu a jovens carentes em Vila Graúna, Cariacica, ele inspira os alunos através da disciplina e da prática do esporte.

Frank Muller é professor de artes na Serra durante a manhã, regente de sala de aula em uma escola municipal de Cariacica durante a tarde, além de mestre em jiu-jítsu, dando aulas da modalidade durante a noite, em Vila Graúna.

A Academia Bulldog recebe jovens em situação de vulnerabilidade, muitos sem condições de arcar com os custos de equipamentos e treinamentos de jiu-jítsu. O mestre não cobra pelas aulas, que são mantidas através de doações de alguns pais e muito esforço do professor e de membros da comunidade.

Nossa academia só funciona porque nós contamos com o apoio dos pais que contribuem com um valor simbólico para a gente pagar aluguel. A gente não tem qualquer tipo de ajuda externa, nenhuma. Isso não quer dizer que a criança cujos pais não podem contribuir vai deixar de treinar. Ela treina, sim.”

Frank Muller, professor
Iniciativa atende crianças em situação de vulnerabilidade em Cariacica. Foto: Thiago Soares/Folha Vitória

Atualmente, a academia tem cerca de 50 alunos. Frank estima que por volta de 30% das famílias têm condições de contribuir com algum valor para manter a iniciativa viva, enquanto outras ajudam quando podem. Há ainda famílias que não têm condição alguma de ajudar, mas o mestre enfatiza que todas as crianças recebem todos os benefícios.

O mestre também é autista de suporte nível 1, que carece de menos necessidades especiais, e tem alunos autistas na academia, inclusive o filho de cinco anos, de suporte nível 3, o nível que precisa de maiores cuidados.

“Oss”: respeito e disciplina em 1º lugar

Para Frank, o bom comportamento dos alunos no tatame, nas salas de aula e na vida é primordial. “A palavra que a gente usa para tudo é o ‘Oss'”, conta o mestre.

Professor preza pela disciplina nas salas de aula e na academia. Foto: Thiago Soares/Folha Vitória

O “Oss”, palavra muito comum no jiu-jítsu, é derivado do termo japonês “Osu”. A expressão é usada para cumprimentar, tanto na entrada como na saída, para respostas positivas e serve para demonstrar respeito com o professor, os adversários e os colegas.

A aluna de 14 anos, Amanda Davoli, conta que, através das aulas de jiu-jítsu conseguiu melhorar o comportamento e até mesmo a sua relação com as pessoas. Ela tem o objetivo de conquistar títulos importantes no esporte, como o pan-americano e o mundial.

O jiu-jítsu me ajudou a melhorar meu foco, minha memória e me ajudou muito nas relações com as pessoas. Eu era muito tímida e meio explosiva, admito.”

Amanda Davoli, aluna da Academia Bulldog
Amanda melhorou comportamento com as aulas na Academia Bulldog. Foto: Thiago Soares/Folha Vitória

O mestre explica que, semanalmente, os jovens levam um documento para a escola que precisa ser preenchido pelos professores e pelas famílias, de acordo com as atividades realizadas.

Na medida que as marcações da disciplina são preenchidas, os alunos podem graduar a faixa no jiu-jítsu. Quando o aluno atinge o quarto grau em determinada faixa, ele fica apto para progredir para a próxima faixa, mas isso só acontece se ele mantiver a disciplina e o bom comportamento.

Professor promove a inclusão de alunos autistas

Autista, o professor conta que tem quase dez alunos autistas na academia. Ele próprio reconhece as dificuldades, mas vê o potencial de evolução em cada um.

Alguns pais nos procuraram perguntando se a gente aceita aluno autista. Na verdade, eu costumo perguntar se eles vão nos aceitar. Porque o aluno autista tem prioridade em tudo.”

Frank Muller

Segundo o professor, os alunos do espectro costumam ser muito dedicados. No início, os treinos são adaptados até que eles se sintam mais a vontade. “Aos poucos, eles vão se igualando a todo mundo e até passam, se se dedicarem”, comenta o mestre.

É o caso do Ikaney Vieira, de 12 anos, autista de suporte 1 que já é faixa laranja com quatro anos de prática do esporte. Ele ajuda inclusive a ministrar as aulas na Academia Bulldog. Para o adolescente, o jiu-jítsu ajudou muito no seu desenvolvimento.

O jiu-jítsu ajudou muito no desenvolvimento na escola e na vida, porque antes eu fazia muita bagunça e era bastante elétrico. Meu sonho no jiu-jítsu é alcançar o máximo que eu puder.”

Ikaney Vieira, aluno da Academia Bulldog
Ikaney ajuda Frank a ministrar as aulas na Academia Bulldog. Foto: Thiago Soares/Folha Vitória

Aulas de jiu-jítsu começaram dentro de escola

A iniciativa de ensinar jiu-jítsu aos alunos da escola surgiu há quatro anos e tem crescido cada vez mais. Atualmente, são cerca de 50 alunos, a maioria também estuda na escola em que o professor leciona em Cariacica.

O professor começou a ensinar a luta para os alunos dentro da escola após as aulas em 2022. A iniciativa dentro da unidade escolar durou cerca de um ano, mas precisou ser encerrada por questões de logística e grade horária noturna da escola.

Depois do turno, a gente se reunia na escola e lá mesmo a gente fazia o treino. Nós tínhamos o equipamento, os tatames e alguns quimonos. Esse treino aconteceu de 2022 até 2023″

Frank Muller

Frank Muller então cedeu a garagem da própria casa durante meses para não deixar os alunos sem os treinos, até que conseguisse um espaço adequado. A garagem não era coberta e, quando chovia, as aulas tinham que ser canceladas.

Com a ajuda dos pais de alunos, há dois anos, a Academia Bulldog passou a funcionar em um galpão de Vila Graúna, onde segue até hoje.

Além das crianças e adolescentes, Frank Muller também dá aulas para adultos no local. A academia ainda participa de competições de jiu-jítsu no Estado.

Academia Bulldog ganhou 19 medalhas no estadual

A Academia Bulldog marcou presença no Campeonato Estadual Kids de Jiu-Jítsu, realizado no Tancredão, em Vitória, no último dia 4. A competição reuniu mais de 800 crianças entre 3 e 15 anos de idade.

Um dos grandes destaques foi justamente a academia do professor Frank Muller, que levou 24 alunos para competir, dos quais 18 conquistaram medalhas. A academia somou sete medalhas de ouro, oito de prata e três de bronze.

Academia Bulldog (à dir.) sendo premiada na 5ª colocação do Estadual Kids. Foto: Divulgação/Fejjes

Com o resultado, as crianças levaram a Bulldog a conquistar o 5º lugar geral, entre as mais de 30 equipes participantes. O desempenho garantiu um troféu e uma premiação em dinheiro da Federação Capixaba de Jiu-Jítsu (Fejjes), organizadora do campeonato, para a iniciativa.

*Texto sob a supervisão da editora Erika Santos

Enzo Bicalho, estagiário do Folha Vitória
Enzo Bicalho Assis

Repórter

Jornalista formado pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). Foi estagiário do Folha Vitória entre novembro de 2024 e outubro de 2025 e é repórter desde novembro de 2025.

Jornalista formado pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). Foi estagiário do Folha Vitória entre novembro de 2024 e outubro de 2025 e é repórter desde novembro de 2025.