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Argentinos 'bombam' estátua de Lionel Messi em apelo por sua volta à seleção

Redação Folha Vitória

Buenos Aires - Tambores rufam e Lionel Messi repentinamente aparece de calção e camiseta ao lado de um braço do rio da Prata, em Buenos Aires. Os aplausos são estranhamente sinceros para o frio que faz. Quem só ouve a ovação, pode pensar que se trata do verdadeiro, de apelido "pulga", e não uma escultura de 2 metros que, embora fiel aos traços, não passaria em um antidoping para estátuas.

A homenagem da prefeitura de Buenos Aires nesta terça-feira ao melhor jogador do mundo, dois dias depois de ele anunciar a sua aposentadoria do time nacional, retrata Messi como o super-herói do qual ele parece querer se afastar. O 10 idealizado, maior, mais forte e invulnerável, recebe as boas-vindas do locutor de voz impostada onipresente nessas cerimônias: "Impressionante. Impressionante a escultura de Lionel Messi. Com a bola no pé, com os olhos bem abertos, tentando sempre ir para frente, com essa camiseta da Argentina flanando..."

Há uma mistura de admiração e culpa entre os 40 curiosos que pararam para ver por que mais de 40 cinegrafistas e fotógrafos apontam para uma estátua. Com o boné do Boca Juniors, o taxista Walter Bustamante aproxima-se da peça de fibra de vidro e resina recheada de concreto e metal, tão logo os políticos deixam o lugar. Diz ter parado o táxi ao ver o "quilombo", expressão argentina para bagunça, em uma das áreas mais caras de Puerto Madero. "Messi está muito dolorido, é melhor ficar um tempo sem jogar pela seleção", afirmou, emocionado com a homenagem.

A estátua seria instalada no Passeio da Glória, um panteão dedicado aos principais atletas argentinos, mas a campanha desencadeada para que Messi mude de ideia deu outra dimensão ao ato. "Quem puder venha, tire uma foto e suba nas redes sociais", pediu o prefeito Horacio Larreta, que mandou um recado aos brasileiros que eventualmente estão felizes com a decisão de Messi. "Fiquem tranquilos, ele vai voltar", disse.

Quem conhece o futebol argentino, como Larreta e o presidente Mauricio Macri, ex-comandante do Boca Juniors, sabe que o anúncio de Messi não foi só uma declaração de cabeça quente. Jornalistas próximos ao craque, que deixou o país aos 13 anos para ir ao Barcelona e não perdeu o sotaque natal, alertam periodicamente sobre o "cansaço de Lío". Carlos Bilardo, técnico da seleção de 1986, homenageada nesta terça-feira pelos 30 anos do bicampeonato mundial, disse que os argentinos deveriam pedir seu retorno "de joelhos" e se colocou entre os que avisaram que Messi um dia diria basta.

A reação do 10 tem relação direta com a situação da Associação de Futebol Argentino (AFA). Em meio a um escândalo de corrupção por desvio de verbas referente à transmissão na TV pública, a entidade tem fiscais do Executivo e do Judiciário argentinos, bem como da Fifa. A interferência dos dois primeiros é vedada pelo organismo máximo do futebol mundial, o que poderia levar o país à desfiliação, uma hipótese improvável por tratar-se do primeiro do ranking. Nesta quinta-feira, as partes tentarão chegar a um consenso.

Messi reclamou por Twitter dois dias antes da final perdida para o Chile por 4 a 2 nos pênaltis, após um empate sem gols, da falta de organização da AFA. Atrasos em voos, chegada a hotéis com quartos por fazer, falta de times com que treinar na concentração foram problemas que a imprensa argentina divulgou depois do tuíte do jogador. Sem levar um título há 23 anos, havia uma pressão de um Mundial pela conquista da Copa América Centenário. Em todas as entrevistas, os jogadores falavam da obrigação de levantar a taça. A ansiedade foi uma das razões apontadas para a terceira derrota seguida em finais, ofuscada pelo anúncio de Messi.

"Isso gerou uma reação em todos os meios e redes sociais de apoio a Messi, não sei se ele esperava. Vocês como brasileiros sabem perfeitamente o que é jogar bem o futebol e sabem perfeitamente que ter Leo em frente, prefeririam não tê-lo", disse o escultor Carlos Benavidez, responsável pela estátua "bombada" de Messi. Sua obra atraiu o enfermeiro Ignacio Moyano, a mulher dele, a dona de casa Flavia Gómez, e a cadela do casal, Loli. Eles estavam na região para "recolher uma papelada" quando viram a inauguração de algo. "Não tínhamos certeza se era de Messi ou de Maradona", disse Ignacio, para quem Messi, considerado por parte da torcida um "pecho frío" - expressão para jogador ou time sem garra -, deve voltar se notar que todo o povo o apoia, "incluindo os que o criticaram".

A freira María Rosa Reynoso, que se apresenta como fanática de Messi e do papa Francisco, não é tão flexível. "Sou psicóloga social e o povo argentino não sabe reconhecer os valores. Agora o amamos. Mas e se ele fica e voltar a perder, o que vai ocorrer?", indagou. Questionada se a "pulga", chamada por alguns de "messias", deveria perdoar seus críticos e rever sua decisão, a irmã que foi especialmente de seu convento para a inauguração da estátua não amacia. "Não sei se ele tem que perdoar. Sei que nós temos de pedir perdão, mas ele tem que ficar firme e não ceder".

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