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Após ouro e festa, Serginho sabe o que fará nesta 2ª: 'comer a comida da mãe'

Redação Folha Vitória

Rio -

Serginho tem um compromisso nesta segunda-feira, em São Paulo, no bairro de Pirituba, na zona norte da cidade. O maior medalhista olímpico brasileiro em esportes coletivos já reservou na agenda a inadiável programação de se sentar em uma mesa e degustar a comida preparada pela mãe. Quer almoçar frango com pirão, acompanhado por tubaína e, para sobremesa, bolo de cenoura com chocolate na cobertura. O cardápio do líbero dono de quatro medalhas está tão definido quanto o futuro dele na seleção brasileira.

O título obtido sobre a Itália, no ginásio do Maracanãzinho, neste domingo encerrou a carreira dele pelo Brasil. Os 3 sets a 0 marcaram o adeus do jogador de 40 anos, mais de uma década de seleção, duas medalhas de ouro e duas de prata. Ele não quer voltar atrás na decisão, como fez em 2015. Ao longo de dois anos e nove meses ele ficou longe da seleção, decisão tomada ao fim dos Jogos de Londres. Um pedido do técnico Bernardinho para ajudar no ciclo olímpico o fez mudar de ideia.

Atuar em uma posição cujo papel é defender e não marcar pontos lhe rendeu em troca elogios e admiração. Os colegas o têm como ídolo e o mundo do vôlei admira o talento pela facilidade em defender os ataques junto com a capacidade de agilizar o jogo a partir da recepção. Mesmo aposentado da seleção, Serginho vai continuar em quadra pelo Sesi-SP na Superliga.

“O que eu mereço depois do título? Mereço a minha casa agora. Mereço buscar os meus filhos na escola, quero andar a cavalo, quero ir embora daqui o quanto antes”, comentou, cercado pelos três filhos. Curiosamente, o único que pratica esporte é o do meio, Matheus. A escolha foi pelo basquete.

O mais velho, Marlon, já cursa faculdade de arquitetura e foi quem mais acompanhou a carreira do pai. “Agora meu pai vai descansar. Temos que aproveitar ao máximo, porque acabou a seleção. Em 2013 foi o primeiro aniversário que ele passou comigo. Como é em maio, sempre tem Liga Mundial”, comentou Marlon.

Serginho, dono de um haras em Jarinu (SP), fez várias piadas durante a entrevista neste domingo. As declarações engraçadas do líbero ao sair do ginásio vieram depois dele ir aos prantos na quadra. Na cerimônia de premiação ele teve o nome gritado pela torcida, foi jogado para o alto pelos companheiros e não se intimidou com o microfone nas mãos. Primeiro, comandou o “peixinho”, depois agradeceu o público e estendeu no piso da quadra a camisa utilizada na final.

Na volta olímpica pelo ginásio, o líbero estava com a medalha e os três filhos. Após conquistar medalhas em outros países, saiu do Maracanãzinho contente por ter participado de um ciclo de renovação e ainda atendido à expectativa familiar. “Não devo mais nada para nenhum filho porque o mais novo estava me cobrando para eu ser campeão olímpico. Nem todos tinham visto. Foi a vitória de um grupo que merecia. Valeu cada bolada forte que levei nos treinos em Saquarema daquele canhão de bolas maldito”, comentou.

Se a final lhe trouxe risos, a campanha rumo ao momento alegre foi complicada. As duas derrotas na fase de grupos para Estados Unidos e Itália fizeram o líbero virar um líder exigente. “Ele costuma chamar para dar bronca quando é preciso”, contou Wallace. O veterano recorreu a um exemplo pesado para motivar o grupo antes do jogo com a França. Era ganhar ou passar o vexame do adeus precoce.

O “presidente”, como é chamado por alguns companheiros, precisou agir como ditador, falar duro para que lhe entendessem. O capitão e levantador Bruninho afirmou que o discurso do veterano motivou o grupo. “O principal e mais tocante foi quando ele disse que estava na UTI, que era a última chance dele de medalha, de glória. Ele disse que não podia morrer sendo de uma geração do ‘quase’ e que merecíamos o ouro”.

As duas pratas em 2008 e 2012 foram combustível para a emoção do líbero, que logo após o jogo terminar, ajoelhou-se para chorar. O recorde olímpico de quatro decisões no vôlei pertence ao Brasil e teve em Serginho um personagem que começou na seleção como fã, para terminar como a referência.

Serginho viu pela televisão o ouro em 1992 e se lembrou de ter corrido até a rua para pular de alegria. Cerca de 10 anos depois, ele dividia a concentração com jogadores que tinha como ídolos, como Maurício e Giovane. Depois, estreou em Olimpíada em 2004 ao ganhar o ouro em cima da mesma Itália que ajudou a derrotar neste domingo.

A carreira vivida entre tantas gerações até o confunde na memória. “O sentimento da conquista é igual. Em 2004 fui campeão olímpico com alguns que eram meus ídolos lá de 1992. Querendo ou não, a gente acha que o Giba está do lado. Mas é o Lipe. Tem horas que o Lucarelli parecia o Dante”, comparou.

Agora são os colegas que o reverenciam. “Se alguém merece isso aqui é ele. Chegou a quatro finais consecutivas, é bicampeão olímpico, é alguém para ficar no coração de todo brasileiro. Precisamos fazer todas as homenagens possíveis”, elogiou o levantador William.

Serginho disse que não se deslumbra com a carreira e logo vai esquecer que fez história. Entre familiares, cavalos e cicatrizes deixadas pelo vôlei, o líbero afirmou ter em mente pensamentos mais urgentes, já para esta segunda-feira. “O vôlei me deu uma hérnia de disco, uma operação no joelho, outra com quatro parafusos nas costas, mas me deu quatro medalhas e amizades verdadeiras. Tenho os pés no chão, sou simples sei quem sou e de onde vim. Amanhã (segunda) já estarei comendo o frango da dona Didi (mãe do jogador)”, afirmou.

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