O CABIMENTO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL AO PRODUTOR RURAL

O agronegócio é a aglomeração de diversas atividades produtivas que estão diretamente ou não ligadas aos produtos advindos da agricultura e agropecuária, mercado de alta relevância onde se insere o produtor rural, e representa grande parcela do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, sendo só em 2019 responsável por 21,4% de sua totalidade, segundo estudo capitaneado pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA).

O que se quer dizer com isto é que, efetivamente, não há nada que possa impedir o produtor rural, grande player do mercado transnacional, de pedir a recuperação judicial quando envolvido em problemas econômicos e financeiros.

Durante muito tempo os pedidos de recuperação do produtor rural foram negados na Justiça, ao fundamento da ausência da comprovação do registro de empresa nos órgãos estatais.

Ocorre que esta interpretação soa equivocada, inócua, rigorosa e prejudicial, porque consideramos que o legislador brasileiro, ao edificar no início deste século a então nova lei de recuperação judicial, estava preocupado em manter a fonte produtora que faz a “roda” da economia girar, garantindo postos de emprego e trabalho com distribuição de renda, sem descuidar dos interesses dos credores.

Significa dizer, pois, que o legislador não se preocupou com as formalidades ao exercício da atividade empresarial, e sim na sua verificação fática representada na clara exploração de atividade econômica apta a ser recuperada, conceito bastante atual aplicável até às entidades sem fins lucrativos.

Assim, não é a falta de um requisito formal, como o do registro nos órgãos competentes por parte do produtor rural, que poderá alijá-lo de formalizar na justiça o pedido de recuperação judicial.

Ao nos debruçarmos com bastante atenção sobre a Lei nº 10.406/2002 (Código Civil), verificamos no seu artigo 970, sem dificuldade, a opção do legislador no sentido de assegurar não apenas tratamento favorecido ao empresário rural e pequeno empresário, mas também tratamento diferenciado e simplificado, que ganha relevo no artigo 971 deste mesmo diploma legal.

Isso porque ali é dito com todas as letras que o empresário de atividade rural cuja atividade constitua sua principal profissão, pode, mas não há nada que o obrigue a solicitar o registro nos órgãos competentes.

Desta forma, se ao empreendedor rural a inscrição da empresa nos órgãos estatais não é mais do que uma faculdade, entendida como um incentivo voltado a equipará-lo ao empreendedor comum cuja atividade depende desta inscrição, tem-se que a sua atividade sempre esteve regular, e por essa razão pode sim trilhar pelo caminho da recuperação judicial como tentativa de se recuperar, cumprindo as exigências legais dentre as quais não se apresenta plausível a comprovação documental do exercício de sua atividade por mais de 2 anos nos órgãos estatais.

Raphael Wilson Loureiro Stein é associado do Escritório desde abril de 2019 e atua nas áreas: Contencioso Civil, Comercial e Recuperação de Empresas e Falência.

Foto: Reprodução / Folha Vitória

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *