Ciência econômica versus jogo político?

Coube ao ex-ministro Delfim Netto uma excelente provocação na semana. Em artigo publicado no Valor Econômico (02/04), o emérito professor aborda como “bons conselhos” econômicos podem se distanciar de boas soluções políticas. Quando são desconsideradas as complexas redes de relações sociais que estruturam um sistema econômico, injusto ou não, as consequências podem ser ruinosas. Sintetizando a argumentação, não há relação direta e automática entre bons conselhos econômicos e bons resultados políticos. 

Delfim cita o artigo ‘Economics versus politics’, de Daron Acemoglu e James Robinson (fev. 2013). Segundo afirmam esses acadêmicos, alguns atores sociais considerados por alguns como meros entraves à eficiência econômica, as tais “falhas de mercado”, podem muito bem se tornar os construtores institucionais de sistemas políticos democráticos, de baixas desigualdades, e sistemicamente eficientes. Eles apontam as atuações históricas dos sindicatos dos trabalhadores nos países nórdicos. Há outros exemplos interessantes no artigo de Acemoglu e Robinson corroborando a tese de que atores sociais podem civilizar o capitalismo pelas vias de processos político-democráticos, ainda que alguns prefiram combatê-los como falhas de mercado.

Outra matéria da semana merecedora de atenção é a entrevista do economista Marcos Lisboa ao Estadão (01/04). O ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda expõe sua moderada visão sobre as circunstâncias econômicas vigentes no Brasil. Ele aponta a relevância dos ganhos de produtividade como um diferencial das rendas entre os países. Segundo Lisboa, “a produtividade é a raiz do crescimento” e, nesse sentido, “entender por que alguns setores tiveram desempenho tão bom da produtividade e por que em outros ele foi ruim me parece essencial para discutir o futuro do País”. Precisamos de estímulos do lado da oferta doméstica.

Lisboa sugeriu que alguns setores exitosos foram efetivamente beneficiados por reformas institucionais – desenvolvimento de instrumentos de crédito, melhora nas garantias e incentivos à formalização de empresas, por exemplo. Ele apontou ainda o nó nas agências reguladoras de infraestrutura como um elemento causador da perda de competitividade brasileira. Indefinições em relação aos funcionamentos dos órgãos de controle do Estado são também vistas pelo economista como outros elementos causadores de incertezas e inúmeras dificuldades para se elevarem os necessários investimentos. De acordo com Lisboa, “a boa microeconomia e os bons instrumentos de gestão são tão relevantes para o crescimento econômico quanto a boa macroeconomia”. Câmbio e juros são relevantes, porém não encerram a complexa questão da baixa competitividade brasileira.

Conforme pude constatar nessas leituras da semana, a eventual ilusão de uma ciência social integralmente positiva deve ser definitivamente abandonada. Afinal, as instituições nas quais estamos imersos abarcam crenças, convenções, valores e práticas sociais que dificilmente podem ser separadas por processos metodológicos “purificadores”, ainda que estes se julguem portadores de uma verdade científica superior.

Rodrigo Medeiros

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