O fim de um ciclo

De acordo com algumas análises, a China estaria crescendo 3,2% anualizado. A desaceleração conhecida do dragão chinês afeta (e afetará ainda mais!) os países da América Latina pelo canal da demanda externa, preços e quantidades, com previsíveis pressões inflacionárias no repasse cambial da desvalorização das moedas da região.

Para se ter uma ideia da fragilidade do modelo que priorizou a inserção internacional através da exportação de commodities, a expressiva queda desde 2014 dos preços internacionais das commodities pode estar retirando algo próximo de 2% do crescimento brasileiro neste ano e, segundo algumas estimativas de mercado, o nosso PIB potencial é de 1%. Não há, portanto, perspectiva de recuperação no horizonte próximo.

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Do ponto de vista das exportações brasileiras, já é um fato bem conhecido que a sua base perdeu complexidade econômica nos últimos trinta anos. A sobrevalorização cambial crônica do real e a desindustrialização prematura integram esse processo regressivo de inserção internacional. Segundo recomenda a literatura sobre desenvolvimento, leis de Engel e Thirwall, por exemplo, o Brasil deveria ter trabalhado efetivamente para elevar a elasticidade-renda da demanda das suas exportações. Reduzir as restrições no balanço de pagamentos é crucial para o crescimento sustentado de um país em desenvolvimento.

A Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) reviu para baixo a projeção de crescimento da região neste ano, de 1% para 0,5%. Segundo foi publicado pelo jornal “Valor Econômico” (30/07/2015): “O fim do ciclo das commodities teve um efeito generalizado na região”, afirmou o secretário-executivo adjunto da Cepal, Antonio Prado.

Do blog “iMFdirect”, Andre Meier e Fabiano Bastos apontam que os embarques da região ainda são dominados por commodities e suas importações da Ásia são compostas por um amplo conjunto de produtos manufaturados. De acordo com os analistas, a região não tem sido capaz de alavancar o crescimento dos fluxos de comércio para transformar as suas estruturas econômicas, que permanecem relativamente não diversificadas.

O boom dos preços das commodities entre 2003 e 2011 contribuiu para reforçar as apostas no modelo de crescimento liderado pelas commodities. Efeitos do fim do ciclo foram sentidos no Brasil. O uso do câmbio para combater a inflação desde 1994, a atração de poupança externa para financiar consumo doméstico e o ciclo recente do boom das commodities acentuaram a sobrevalorização cambial do real e afetaram a taxa de poupança doméstica pelo canal da formação bruta de capital fixo. Esse fato está visível quando a queda do investimento é acompanhada pela redução da poupança.

A insatisfação com a política atinge 71% no Brasil, conforme apurou o Pew Research Center (02/2015). A correlação detectada entre insatisfação e percepção do desempenho econômico é de 0,8 para os países pesquisados. Portanto, com a piora da situação econômica deve-se esperar uma elevação da insatisfação social. Entre nós, 79% acreditam que os mais ricos influenciam muito o sistema político. Não restam mais tantas dúvidas em relação ao fato de que estamos testemunhando o fim de um ciclo. Resta saber o que será colocado no lugar.

Rodrigo Medeiros é professor do Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes)

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