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Primeiro caso de covid-19 completa um ano; ES teve 38 infectados por hora

O Espírito Santo teve seu primeiro caso de coronavírus confirmado pelo Ministério da Saúde no dia 5 de março de 2020; veja como a pandemia impactou a rotina dos capixabas e a avaliação dos especialistas sobre volta à "normalidade"

Foto: Diego Simao

O Espírito Santo teve seu primeiro caso de coronavírus (Sars-CoV-2) confirmado pelo Ministério da Saúde no dia 5 de março do ano passado. 365 dias depois, contados até esta quinta-feira (04), - considerando que 2020 foi ano bissexto - o Estado chegou a 331.328 casos de covid-19. Isso significa uma média de 38 capixabas infectados por hora durante o período, levando em conta a última atualização dos dados. Ao todo, 6.499 vidas foram perdidas por causa da doença.

A covid-19, até então misteriosa e desconhecida, avançou rapidamente e causou uma crise sanitária, econômica e social no país e no mundo. Um ano depois, a opinião de especialistas é que aprendemos pouco sobre a doença e o alerta é para a população não reduzir os cuidados. 

Mesmo o Espírito Santo não ocupando condições tão graves em relação aos estados vizinhos, o número de mortes e ocupação de leitos - já passam de mil pessoas internadas  - mostra que estamos longe de vencermos a covid.

O exemplo de como a doença pode mudar a situação do Espírito Santo de uma hora para a outra é o quadro em Santa Catarina. Há cinco semanas, o estado do Sul  socorria pacientes do Amazonas, pois estava com apenas 55% dos leitos de UTI ocupados. Nesta semana, aproximadamente 200 pessoas já aguardavam por um leito, e pacientes estão sendo transferidos para outros estados, inclusive para o Espírito Santo. 

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Para evitar o colapso na rede hospitalar, o secretário de Saúde do Espírito Santo, Nésio Fernandes, diz que o estado já se prepara para a nova fase da doença. “Entre os meses de março e abril já temos histórico de aumento das doenças respiratórias agudas graves. Por isso, já estamos prevendo essa nova fase. O estado está se preparando. Estamos em nível de atenção, adquirindo testes rápidos e preparando a rede hospitalar para que não entre em colapso", afirmou.

O subsecretário de Vigilância em Saúde da Sesa, Luiz Carlos Reblin, também destaca que o governo trabalha na ampliação preventiva dos leitos. "Vamos aumentar os leitos de UTI e finalizar o mês de abril com 900 ocupações disponíveis."

CHEGADA DA VACINA

A tão esperada vacina chegou, mas vem em ritmo lento para os estados. Por isso, é preciso manter o alerta. “No primeiro momento a notícia foi encantadora e todos ficaram muito alegres, mas fomos caindo na realidade. Percebemos um ritmo de vacinação muito pequeno e que há interesses maiores do que só a vacinação. Isso atrasa o processo. As pessoas banalizaram o uso de máscara e os cuidados e isso pode refletir no aumento de casos”, explica o médico infectologista Crispim Cerutti.

A doutora em epidemiologia e professora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Ethel Maciel, ressalta que mesmo com a chegada da doses, não é momento do capixaba relaxar. "Só podemos ficar tranquilos quando mais de 70% da população estiver vacinada, enquanto isso o vírus vai continuar circulando", alertou.

Foto: Reprodução TV Vitória
Ethel Maciel é doutora em epidemiologia e professora da Ufes

Sobre a circulação do vírus, a epidemiologista lembrou das duas variantes da covid-19 que foram identificadas no Espírito Santo, P1 e P2, sendo a primeira, de acordo com ela, a mais perigosa, pois combina a mutação das variantes inglesa e da África do Sul, que é de rápida transmissão e mais resistente ao sistema imunológico. 

A m´édica destaca a falta de articulação do governo federal em avaliar os riscos de uma pandemia no Brasil. "Era preciso ter campanhas de informação para a população, para informar o que era preciso fazer e também sobre a gravidade do momento. Informar sobre a importância do uso das máscaras e das vacinas. As nossas lideranças, principalmente em nível federal, falharam muito nisso."

Além disso, Ethel explicou que a polarização atrapalhou e atrapalha a imunização em massa. "Criou-se um clima muito difícil para que a gente pudesse instituir medidas mais duras. Essa polarização leva um grupo da população a não aderir às medidas de segurança. Em um momento da maior crise sanitária dos últimos cem anos, a gente deveria ter se unido em prol do país" opinou. 

Ao avaliar a pandemia, o médico infectologista Crispim Cerutti afirma que muitos aspectos poderiam ter sido tratados trabalhados de uma maneira melhor. "Quando tudo começou, poderia ter havido uma ação coordenada por parte das autoridades de Saúde em nível nacional, com uma mensagem mais clara dos riscos e um convencimento melhor de como se proteger. Em termos de economia, poderia ter havido mais estímulos para e-commerce e delivery, por exemplo. No desdobramento da pandemia, poderia ter havido um planejamento melhor a respeito das perspectivas de imunização", disse.

Para o médico, ações deveriam ter sido realizadas quando a vacina ainda era apenas uma promessa. "Quando se começou a ter os testes de vacinas e a promessa de que, em médio prazo, se disporia de vacinas eficazes contra a doença, era necessário que o governo organizasse uma estratégia para adquirir os imunizantes em larga quantidade para imunizar a população em massa e em abrangência necessária", afirmou.

48 DIAS DE INTERNAÇÃO

Entre os capixabas infectados na forma grave da doença e que precisaram de internação para vencer a covid-19 está a assistente Simone Dias Neiva. Atualmente, ela está saudável, disposta e com um novo emprego. Mas, há quase um ano, ela estava em coma em uma UTI. Foram 48 dias internada no Hospital Jayme Santos Neves, na Serra.

Foto: Reprodução
Simone ficou internada por 48 dias em hospital da Serra lutando contra a doença

“Tive que passar por todos os procedimentos de intubação, traqueostomia e hemodiálise. Foram momentos muito difíceis e perdi, várias vezes, a esperança de sair do estado em que eu me encontrava. Minha família nunca perdeu a esperança e sempre se pôs em oração, sempre tendo a esperança de que dias melhores viriam”, contou.

De acordo com dados da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa), foram mais de 25 mil internações desde o início da pandemia. O primeiro caso confirmado aconteceu em março de 2020. Nos meses seguintes, entre abril e maio, houve uma aceleração de casos, óbitos e internações. Apenas em julho foi possível registrar uma fase de recuperação, mas a pandemia não foi encerrada. Entre novembro e dezembro, uma nova alta nos casos voltou a ocorrer.

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Enquanto isso, no Laboratório Central do Estado (Lacen), responsável pela grande maioria dos exames para a covid-19, a rotina foi completamente alterada e acelerada. Os especialistas passam sete dias por semana e 24 horas por dia processando amostras de PCR. Quase 70 novos profissionais foram contratados, muitos deles com mestrado e doutorado, e a capacidade, que era de processar 100 amostras por mês, passou a 4.200 por dia.

Foto: TV Vitória
Rodrigo, coordenador do Lacen, conta que o laboratório processou mais de 4.200 amostras

“Se fizermos um recorte do ano que antecedeu a pandemia, nós testamos 1.115 amostras de vírus respiratório. Naquela época ainda não existia covid. No ano seguinte, de 1º de março de 2020 a 1º de março de 2021, nós completamos 295.938 reações de PCR apenas para covid, sem contar as que foram feitas para outros vírus respiratórios”, explicou o coordenador do Lacen, Rodrigo Ribeiro Rodrigues.

O tempo para ter acesso ao resultado também mudou. Em 2019, o laboratório entregava o diagnóstico em 5 dias. Atualmente, em menos de um dia e meio. 

“É um impacto importante, pois sabemos que a transmissão desse vírus segue um padrão de dispersão que a gente tem que estar acompanhando esse crescimento. Paralelamente a esse aumento da capacidade de análise, passamos a desenvolver outras metodologias. É um grande avanço que, independente da pandemia acabar amanhã, é um legado que fica. O Lacen também se aprimorou em outras áreas”, afirmou o coordenador.

LINHA DE FRENTE

Em um ano de pandemia, os trabalhadores da linha de frente não conseguiram parar para respirar aliviados ou para descansar. Pelo contrário, se sentem andando em círculos, sempre em sinal de alerta. Para o médico intensivista Adenilton Rampinelli, foram dois os piores momentos enfrentados pelas equipes de saúde. 

“Primeiro o momento de medo, do novo, falta de preparo, de conhecimento no início da pandemia. Foi um momento muito crucial e importante. Para a nossa realidade do Espírito Santo, no final do ano passado, entre novembro e dezembro, foram dias muito ruins, pois o número de casos foi muito grande e o tipo de casos que chegavam na UTI eram doentes mais graves. O final do ano foi muito desafiador. Além disso, a equipe estava em exaustão, muito cansada.”

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Foto: TV Vitória
O médico Adenilton conta que o pior momento o medo e a falta de preparo para enfrentar um vírus novo

Quando tudo parecia ter melhorado, uma nova explosão do número de casos e de internações em outros estados voltou a deixar as equipes do Espírito Santo em alerta. 

“Hoje estamos em um período de apreensão. Todos estamos com a luz de alerta. Apesar de estarmos com uma taxa de ocupação menor, de os hospitais estarem mais tranquilos aqui, temos certeza que é uma questão de tempo. Vemos o que está acontecendo em outros estados e discutindo com epidemiologistas e organizações, a própria orientação é ficar em alerta, pois dias piores podem vir”, lamenta o médico.

Para o infectologista Crispim Cerutti, mesmo em um momento delicado da pandemia, ainda dá tempo de consertar as coisas. "De agora para frente, ainda há como assumir uma ação coordenada a nível federal, proteger melhor as pessoas e passar a mensagem correta, que temos que nos proteger do contágio e proteger uns aos outros. É o único caminho: imunizar em quantidade e nos proteger", afirmou.

Pandemia em números

Foto: Matheus Brum / TV Vitória
Fachada da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa)

O Espírito Santo foi um dos primeiros estados a registrar caso confirmado no Brasil. Pela atualização mais recente do Painel Covid-19, da Sesa, atualizado nesta quinta-feira (04) o estado já soma 331.328 infectados pelo novo coronavírus. Deste total, 312.825 já venceram a doença. No entanto, 6.499 pessoas morreram por complicações da covid-19.

De acordo com o levantamento da Fiocruz, o Espírito Santo está em alerta intermediário porque é considerado o percentual de crescimento da ocupação de leitos, que passou de 60% para 79%. Atualmente a rede pública do Estado conta com 694 leitos de UTI, além de 649 de enfermaria para casos de Covid-19. Ainda segundo a Secretaria de Estado da Saúde (Sesa), as internações estão aumentando.

Em março de 2020, a Sesa contava com 60 leitos de UTI para pacientes com covid-19. Um mês depois eram 161. No pico da pandemia em julho do ano passado a expansão de leitos exclusivos para a doença chegou a 705. Com a queda do número de casos graves, atualmente o Espírito Santo tem 694 leitos. 

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