JULGAMENTO DO CASO MILENA GOTTARDI

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'Milena falava que havia um regime militar na casa', diz testemunha de julgamento

Médica que trabalhava junto com Milena contou que sempre ouviu reclamações sobre o relacionamento e a forma com que Hilário tratava as crianças

Iures Wagmaker

Redação Folha Vitória
Foto: Reprodução TV Vitória

A médica Aline Coelho Moreira Fraga foi a primeira testemunha a ser ouvida no julgamento do caso Milena Gottardi, iniciado nesta segunda-feira (23). Além de compor o grupo das testemunhas de acusação, Aline está em adiantado estado de gravidez e, por isso, teve prioridade.

A testemunha começou o depoimento sendo interrogada pelo juiz Marcos Pereira Sanches. Ao responder as perguntas, ela destacou que conheceu Milena em 2014, quando começaram a trabalhar juntas. No entanto, foi a partir de 2016 que fizeram amizade.

Segundo ela, era comum ouvir Milena comentar que gostaria de se separar, por estar insatisfeita com o relacionamento com o ex-policial civil Hilário Frasson, um dos réus do julgamento.

A médica ainda relatou que Milena descrevia Hilário como um pai eficiente no contexto de cuidar das crianças, mas não demonstrava tanta afetividade, em especial, pela filha mais velha. Ela chegava a repetir que o então marido impunha um regime militar e que se sentia uma autoridade desnecessária dentro de casa.

Aline também contou, em depoimento, que recebeu uma visita de Milena poucos dias antes do crime, que teria permanecido por cerca de 40 minutos em sua residência. Neste período, Hilário teria ligado várias vezes para a então esposa.   

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Milena também relatava, segundo a testemunha, que sentia uma certa perseguição por parte de Hilário. Na ocasião em que a vítima escreveu a carta, divulgada pouco após o crime, Aline teria alertado Milena que aquilo poderia ser uma ameaça de morte.

O julgamento de Aline começou às 11h40 e encerrou pouco após às 13 horas. Ela também foi interrogada pela defesa de Esperidião e de Hilário. Os advogados dos outros réus não fizeram perguntas.

Quatro mulheres e três homens são escolhidos como jurados

Quatro mulheres e três homens foram escolhidos como jurados para definir o destino dos seis réus apontados pelo Ministério Público como responsáveis pelo assassinato da médica Milena Giottardi.

A definição do júri não foi nada tranquila no momento do sorteio. Dez mulheres foram recusadas pelos advogados de defesa. Houve ainda três recusas de homens. Os promotores do Ministério Público Estadual aceitaram a justificativa de um homem que não quis participar.

Houve ainda duas dispensas, pois uma mulher tinha um familiar envolvido no processo e outra foi dispensada por problemas médicos.

O julgamento, presidido pelo juiz Marcos Pereira Sanches, começou precisamente às 10h15, com uma hora e quinze minutos de atraso. Isso ocorreu porque uma das testemunhas não havia chegado.

O magistrado informou que um dos advogados de defesa pediu desmembramento para que os réus fossem julgados em separado. Mas o pedido foi negado. Assim, todos eles serão julgados juntos.

Mãe de Milena se retirou antes da entrada dos réus

A mãe de Milena, Zilca Gottardi, se retirou do salão do júri antes que os seis réus entrassem.

Os réus Bruno Broetto e Dionathas Alves, que são cunhados, estão de um lado do tribunal, separados dos quatro restantes.

Dionathas, apontado como o executor da médica, está de cabeça baixa. Tanto ele quanto Broetto, apontado como o que forneceu a motocicleta roubada para que Dionathas cometesse o crime, choraram em alguns momentos.

No final da manhã, a partir das 11h15, foi feita a leitura do processo.

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Julgamento pode durar uma semana

O julgamento dos réus, de acordo com o Tribunal de Justiça do Espírito Santo, pode, inicialmente, ter a duração de uma semana.

As etapas dos trabalhos podem durar mais tempo devido ao número de réus e de testemunhas. Serão 29 ao todo, sendo 19 convocadas pelas defesas dos acusados e 10, pela acusação.

Estarão no banco dos réus Hilário Frasson, Esperidião Frasson, Dionathas Alves, Hermenegildo Palauro Filho, Valcir da Silva Dias e Bruno Broetto.

As investigações concluíram que Hilário e Esperidião encomendaram o assassinato de Milena Gottardi por não aceitarem o fim do casamento entre ela e o então policial civil. Para isso, eles teriam contratado Valcir e Hermenegildo para dar suporte ao crime e encontrar um executor.

Ainda segundo a polícia, Dionathas Alves foi o escolhido para executar o "serviço" — como os envolvidos se referiam ao assassinato da médica. Para isso, ele receberia uma recompensa de R$ 2 mil.

Dionathas teria usado uma moto, roubada pelo cunhado Bruno, para seguir de Fundão até Vitória e matar Milena.

Foto: Arte/ Júlio Lopes

Quem são as testemunhas do processo:

Ministério Público

1 - Aline Coelho Moreira Fraga

2 - Maria Isabel Lima dos Santos

3 - Lícia Maria Araújo Maia

4 - Investigador PCES Igor de Oliveira Carneiro

5 - Delegado PCES Janderson Birschner Lube

6 - Marcelle Gomes da Cruz

7 - Fernanda Coutinho Lopes Raposo

8 - Ana Paula Protzzner Morbeck

9 - Douglas Gottardi Tonini

Assistente de acusação

1 - Shintia Gottardi de Almeida

Réus do processo

- Hilário Frasson - ex-marido da médica e ex-policial civil

- Esperidião Frasson - ex-sogro da vítima

- Valcir da Silva Dias e Hermenegildo Palauro Filho - acusados de serem intermediadores do assassinato

- Dionathas Alves Vieira - acusado de ser o executor do crime

- Bruno Rodrigues Broetto - apontado como o responsável por conseguir a moto utilizada no dia do assassinato

Defesa réu Hilário

1 - João Guilherme Souza Pelição

2 - Rodrigo Alves Alver

3 - Tarcísio Fávaro

4 - Moisés da Silva Soares

5 - Arnaldo Santos Souza

Defesa réu Esperidião

1 - Valdemir Nascimento Lima

2 - Paulo Renato Magvesky

3 - Luciano Nunes Bermudes

4 - Maria Arlinda Bermudes Palauro

5 - José Ferreira Campanholi

Defesa réu Dionathas

1 - Juliana Pábula Brozeguini Batista

2 - Paola Laghasse

3 - Diana Aparecida Pereira

4 - Myller Maradona Pereira Amorim

5 - Julianny Pereira Soares

Defesa réu Bruno

1 - Douglas Miranda Santana

2 - Pedro Carlos Nieiro

3 - Maria das Graças Coelho Nieiro

4 - Claezi Demonei dos Santos

*Os réus Hermenegildo e Valcir não arrolam testemunhas

Milena Gottardi foi assassinada em setembro de 2017

Foto: Reprodução TV Vitória

O assassinato de Milena Gottardi aconteceu na tarde do dia 14 de setembro de 2017 e ganhou grande repercussão no Espírito Santo. A vítima atuava como pediatra oncológica no Hospital das Clínicas, em Maruípe, Vitória.

Quando saía de um plantão, acompanhada de uma amiga, a médica foi abordada, no estacionamento do hospital, por um homem armado, que chegou a anunciar um assalto.

Milena e a amiga chegaram a entregar os pertences ao suposto assaltante. Quando elas se dirigiam ao carro, o criminoso atirou três vezes em direção à pediatra, atingindo a mesma na cabeça e na perna, e fugiu posteriormente. A médica foi socorrida e internada em um hospital, mas morreu no dia seguinte.

A Polícia Civil agiu rápido e, dois dias após a médica ser baleada, dois suspeitos de envolvimento no crime foram detidos: Dionathas Alves Vieira, acusado de ser o executor do crime, e Bruno Rodrigues Broetto, apontado pela polícia como o responsável por conseguir a moto utilizada por Dionathas no dia do assassinato.

A prisão dos suspeitos aconteceu praticamente ao mesmo tempo em que o corpo de Milena era sepultado em Fundão, município onde a médica nasceu e foi criada e onde grande parte de sua família ainda mora.

Com a prisão da dupla, a polícia começou a desvendar o crime e provar que Milena não havia sido vítima de um latrocínio — como fez parecer o autor dos disparos — mas sim de um crime de mando. Faltava, no entanto, chegar aos mentores do assassinato.

Para conseguir as provas necessárias, a Polícia Civil conseguiu, junto à Justiça, que as investigações corressem sob sigilo. Isso porque o principal suspeito de encomendar a morte de Milena era o ex-marido dela, o então policial civil Hilário Antônio Fiorot Frasson, que atuava como assessor técnico do gabinete do Chefe da PC, Guilherme Daré.

A ideia da Secretaria de Estado da Justiça (Sesp) era justamente impedir que Hilário tivesse acesso às provas obtidas pela Delegacia Especializada em Homicídios Contra a Mulher (DHPM), que conduzia o inquérito.

A prisão de Hilário aconteceu no dia 21 de setembro, exatamente uma semana depois do assassinato de Milena. Ele foi preso na Chefatura da Polícia Civil e encaminhado para um anexo da Delegacia de Novo México, em Vila Velha, onde ficam os policiais civis que são presos.

Mais cedo, no mesmo dia, a polícia havia prendido o pai dele, Esperidião Carlos Frasson, apontado como o outro mandante do crime, e Valcir da Silva Dias, acusado de ser um dos intermediadores do assassinato.

Segundo a polícia, o outro intermediador foi Hermenegildo Palauro Filho, o Judinho, que foi preso no dia 25 de setembro.

Todos os seis suspeitos de envolvimento no assassinato de Milena Gottardi foram autuados pela Polícia Civil, que concluiu o inquérito referente ao crime no dia 18 de outubro. O inquérito foi encaminhado ao Ministério Público Estadual (MPES), que, no dia 27 de outubro de 2017, denunciou os seis indiciados à Justiça.

Hilário, Esperidião, Valcir, Hermenegildo e Dionathas foram denunciados pelos crimes de homicídio qualificado, feminicídio e fraude processual. Já Bruno responde pelo crime de feminicídio.

O que dizem as defesas dos réus

Sobre o julgamento, o advogado Leonardo Gagno, responsável pela defesa de Hilário Frasson, destacou que está confiante de que a justiça será feita.

"Durante o júri, a defesa terá a oportunidade de apresentar provas importantes, aclarar os fatos e demonstrar que a imagem do Hilário foi distorcida pela acusação", afirmou.

Já o advogado Alexandre Lyra Trancoso, responsável pela defesa de Valcir da Silva Dias, prefere não dar declarações sobre o júri.

As defesas de Esperidião Carlos Frasson, Hermenegildo Palauro Filho, Dionathas Alves Vieira e Bruno Rodrigues Broetto foram procuradas pela reportagem, mas até o momento, não responderam aos questionamentos.

Para o advogado Leonardo da Rocha de Souza, responsável pela defesa dos réus Dionathas e Bruno, a expectativa é que o julgamento ocorra de forma justa e livre. Ele ressalta que Bruno encontra-se bastante angustiado e com um forte sentimento de indignação em virtude do tempo que permaneceu preso. O acusado, segundo Souza, tem consciência de que é inocente.

Leonardo também afirmou que a tese da defesa de Bruno é baseada na absolvição dele, tendo em vista que, segundo o advogado, não há provas suficientes que comprovem a autoria e a participação de Bruno no crime em questão.

Sobre a situação de Dionathas, o advogado disse ainda que, dependendo do teor do depoimento do réu, a defesa vai buscar um julgamento e uma condenação que não seja maior ou menor do que os valores previstos na legislação brasileira.

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