Morte irmãos carbonizados

Polícia

18 dias depois... Morte de irmãos carbonizados ainda é cercada de mistério no Espírito Santo

Quase 20 dias após a morte dos irmãos, as investigações seguem sob segredo de Justiça. Nenhum detalhe é divulgado. O que restam, são apenas dúvidas

Duas crianças mortas, um incêndio, uma casa interditada, uma pessoa presa, diversos depoimentos e muitos questionamentos rondam o caso da morte dos irmãos Joaquim Alves Sales, de 3 anos, e Kauan Sales Burkovsky, de 6, ocorrido em Linhares, Norte do Espírito Santo, na madrugada do dia 21 de abril.

Nas redes sociais surgem diversas teorias e as opiniões dos internautas se dividem. Nos noticiários, o assunto é pauta fixa desde a data do ocorrido. Em meio à especulações, notícias falsas e muitas dúvidas, a resposta das autoridades responsáveis pelas investigações é apenas uma: o silêncio.

O fato aconteceu em um sábado, feriado. A mãe das crianças estava em viagem para um congresso religioso em outra cidade. Na casa, os meninos estavam sob o cuidado de Georgeval Alves Gonçalves, 36 anos, conhecido como pastor George Alves, pai do menino Joaquim e padrasto de Kauã.

Naquela madrugada, um incêndio atingiu o quarto onde os irmãos dormiam. O Corpo de Bombeiros foi acionado e as chamas foram controladas, mas os irmãos já estavam sem vida. Na hora das chamas, as crianças eram monitoradas por uma babá eletrônica.

Após o incêndio, os corpos carbonizados dos irmãos foram encaminhados para o Departamento Médico Legal (DML), em Vitória, onde foi necessária a realização de exames de DNA para identificação.

Depois que o fogo foi controlado, a casa, localizada na Avenida Augusto Calmon, no Centro de Linhares, foi isolada pelos bombeiros e pela Polícia Militar. A perícia técnica da Polícia Civil foi acionada e uma equipe do Corpo de Bombeiros fez uma inspeção para saber a causa do incêndio.

Na segunda-feira seguinte ao incêndio, o pastor George e a esposa, Juliana Salles, mãe das crianças, estiveram no DML para o recolhimento de material para realizar os exames de DNA. Na ocasião, George relatou para a imprensa o que teria acontecido na noite do incêndio. Veja a entrevista completa:

George afirmou que sofreu queimaduras nos pés e nas mãos durante uma tentativa de salvar as crianças. Apesar disso, o médico perito que examinou o pastor teria encontrado pequenas bolhas nas mãos e nos pés do pastor.

No mesmo dia, Rainy Butkovsky, pai do menino mais velho, também esteve no DML e teve materiais genéticos colhidos. Muito abalado, ele disse que apesar de morar em Vitória e o filho em Linhares, eles eram próximos e o pastor cuidava dele como filho também.

Na primeira semana após a morte, a Polícia Civil ouviu o pastor e outras quatro testemunhas sobre o caso, sendo duas mulheres que moram na casa, mas não estariam no momento do incêndio. Também foram ouvidas duas pessoas que teriam ajudado o pastor George Alves no momento do incêndio.

Enquanto depoimentos eram prestados na delegacia, a casa onde aconteceu o incêndio e a morte dos irmãos passava por várias perícias. Na terceira delas, os peritos utilizaram um produto chamado “luminol”, que permite encontrar manchas invisíveis a olho nu. O recurso é capaz de detectar marcas de sangue e outros vestígios, mesmo depois de um incêndio e de o local ter sido limpo.

Uma semana após a morte das crianças, o pastor George teve a prisão decretada. De acordo com informações passadas por um investigador da Superintendência da Polícia Regional Norte (SPRN), o juiz expediu uma liminar com base no resultado dos exames de perícia e o pastor foi encaminhado para a 16ª Delegacia Regional de Linhares. Na ocasião, a Polícia Civil informou, por meio de nota, que a prisão de Georgeval Alves Gonçalves foi requerida para preservar o bom andamento das investigações. Ele foi colocado em uma cela isolada do Centro de Detenção Provisória de Viana.

No mesmo dia da prisão, a perícia realizada na casa encontrou vestígios de material biológico. A confirmação partiu do presidente do Sindicato dos Policiais Civis do Espírito Santo (Sindipol), Jorge Emilio Leal, que informou que o material ainda demanda exame laboratorial.

Leal ainda afirmou que 30 peritos oficiais de diferentes setores trabalham no caso. Veja a explicação:

Foi então que diversos detalhes da vida de George Alves começaram a aparecer. Antes de ser líder de uma igreja Batista de Linhares, o pastor era responsável por administrar um salão de beleza em São Paulo. Em publicações mais antigas nas redes sociais, o pastor mostra alguns dos trabalhos feitos. Alguns, inclusive, com a atual esposa, Juliana Salles, mãe dos meninos Joaquim e Kauã.

Dando continuidade às investigações, os médicos legistas do DML de Vitória retiraram amostras de urina, sangue e de órgãos vitais dos irmãos Joaquim e Kauan. O material foi enviado para análise e os exames podem apontar se eles foram dopados ou agredidos antes de serem carbonizados.

Após 11 dias do caso, foi realizada a perícia na casa, quando foi coletado material genético dentro do quarto onde os dois irmãos morreram. A coleta desse material é necessária para esclarecer etapa por etapa o que aconteceu antes e durante o incêndio na casa.

Foi neste mesmo dia que um grupo formado por cinco advogados de Minas Gerais e do Espírito Santo se voluntariou para defender o pastor George Alves. Na ocasião, Rodrigo Duarte, um dos advogados, que também é pastor e vice-presidente da Igreja Batista Ministério Vida e Paz, onde George ministra cultos, disse à reportagem da Rede Vitória que ainda não tinha tido acesso ao inquérito policial sobre o caso.

No dia 3 de maio, 12 dias após a morte, a pastora Juliana Salles, mãe dos irmãos prestou depoimento na 16ª Delegacia Regional de Linhares, por cerca de quatro horas. Por volta de 11h40, ela deixou a delegacia em uma viatura descaracterizada, sem falar com a imprensa. 

O mesmo material utilizado em uma das perícias realizadas na casa onde ocorreu o incêndio também foi aplicado no carro que era utilizado pelo pastor George. O veículo foi submetido à uma nova etapa da perícia da Polícia Civil. O uso do luminol pode permitir a identificação de vestígios, como marcas de sangue.

Na última sexta-feira (4), peritos e militares do Corpo de Bombeiros se reuniram com o delegado responsável pelo caso dos irmãos.Também participaram da reunião o chefe do DML de Vitória, Vanderson Lugão, e o comandante do Corpo de Bombeiros de Linhares, Tenente Coronel Ferrari. O assunto da reunião não foi divulgado.

No início desta semana, uma nova pista que pode ajudar na investigação começou a aparecer. Um prontuário médico do pastor George Alves, realizado por um hospital de Linhares (HGL) horas depois do incêndio que teria provocado a morte dos irmãos não relata nenhuma tipo de queimadura. O documento foi divulgado pelo jornal online Norte Notícias e confirmado pela Prefeitura de Linhares ao jornal online Folha Vitória.

Depois do incêndio, o pai de Joaquim e padrasto de Kauã teria procurado atendimento no hospital por volta das 6 horas. As informações contidas na ficha de atendimento constam abalo emocional, mas não queimaduras.

Na ficha está escrito que, no hospital, o pastor relatou o que tinha acontecido, que estava em choque e que tinha inalado fumaça. A ficha revela que não foram feitos exames e o pastor foi liberado. Já os exames feitos na investigação policial apontaram uma pequena bolha em um dos pés.

O laudo dos exames de DNA nos corpos dos irmãos foi concluído nessa segunda-feira (07). De acordo com a Polícia Civil, os corpos foram identificados e já estão à disposição da família. No entanto, o caso segue sob segredo de Justiça, com acompanhamento do Ministério Público do Espírito Santo (MPES). 

De acordo com um especialista, o pastor George, que permanece preso, tem o direito de deixar a prisão para acompanhar o enterro e sepultamento das crianças porque como a fase é de inquérito policial, ou seja, de investigação e recolhimento de informações, o que impera é a Lei da Presunção da Inocência. Apesar disso, a Secretaria de Justiça (Sejus) afirmou que, até a manhã de terça-feira (08), nenhum pedido havia sido realizado.

A expectativa é de que os corpos dos irmãos Joaquim e Kauã sejam levados para sepultamento em Linhares, cidade onde moravam. Segundo o superintendente de Polícia Técnico-Científica, delegado Danilo Bahiense, como os corpos permaneceram por mais de 15 dias no DML, os familiares precisam obter o chamado registro tardio de óbito para liberá-los. No entanto, para que o documento seja emitido, é necessária uma autorização judicial. 

As investigações sobre o caso continuam e seguem em segredo de Justiça. Nenhum detalhe é revelado pelas autoridades e só devem ser divulgados após a conclusão do inquérito. Por enquanto, o que restam são apenas dúvidas.

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