“Tudo é possível”, diz Nelson Júnior sobre ser apoiado pelo Republicanos

O pastor e conferencista Nelson Júnior, 45, pré-candidato ao Senado pelo Avante, nem parece que é estreante na política. Ao ser entrevistado ontem (30) no programa “De Olho no Poder com Fabi Tostes” na rádio Jovem Pan News Vitória (veja a entrevista completa ao final), desviou de temas polêmicos, manteve o mistério sobre as articulações que tem feito em Brasília e evitou ao máximo se comprometer sobre seu futuro político.

Assessorado pelo estrategista político Aldeci Carvalho – o mesmo que atuou na campanha vitoriosa do senador Marcos do Val, em 2018, e já orientou o pré-candidato a tirar o “pastor” do nome e usar só “Vamos Nelson” para se aproximar de todos os públicos –, o conferencista assumiu sua pré-candidatura há uma semana. Desde então, “muita coisa no cenário político mudou”, segundo ele.

A saída de seu partido do grupo político capitaneado pelo governador Renato Casagrande (PSB) ampliou a possibilidade de conversas com outras siglas e Nelson Júnior admite que tem estado “mais próximo” do União Brasil – que tem como pré-candidato ao governo Felipe Rigoni – e do Republicanos, que aposta no deputado Erick Musso na corrida ao Palácio Anchieta.

Aliás, ver uma dobradinha entre os dois é o sonho de Nelson que nos últimos 25 anos tem desempenhado um ministério com jovens – ele é criador do “Eu escolhi esperar”, movimento que prega aos jovens esperar até o casamento para iniciar a vida sexual. “Acredito na força da juventude e me identifico muito com essas lideranças jovens (…) Uma possível junção de dois líderes jovens da política capixaba, Erick Musso e Felipe Rigoni, eu faço voz. Vejo com muito entusiasmo, acho que o Espírito Santo só tem a ganhar com a união da juventude. A sociedade quer renovação, a gente tem que construir”.

As consequências

A proximidade com os dois mais jovens concorrentes ao Palácio Anchieta traz algumas implicações. A primeira é que leva, de uma vez por todas, o Avante para a oposição ao governo Casagrande.

Até duas semanas atrás, o Avante formava a base aliada, com o presidente da legenda, Marcel Carone, atuando num cargo de confiança na Casa Civil. Carone pediu exoneração para ficar “livre” para se articular, após sentir que não teria espaço para o projeto de tornar Nelson Júnior candidato ao Senado com o apoio do governo.

Na saída, ele evitou falar sobre ressentimentos ou ida para a oposição. Mas se o Avante fechar com o Rigoni ou com Erick, é o que vai acontecer. Principalmente na dobradinha com o Republicanos.

Seja por meio do presidente da Assembleia, e também pré-candidato ao governo Erick Musso, seja através do prefeito de Vitória, Lorenzo Pazolini, o Republicanos já tem ocupado, há um bom tempo, um dos principais lugares na oposição. Os ruídos começaram ainda no início de 2021, logo após a eleição da Mesa Diretora na Assembleia e em meio ao período mais difícil da pandemia.

Mas, uma possível união com o Republicanos tem outra implicação. Hoje, o partido tem a pré-candidatura ao Senado do ex-prefeito Sergio Meneguelli. O Republicanos fechar com o Avante, que tem Nelson Junior disputando a mesma vaga, significaria retirar a candidatura própria de um personagem que hoje aparece em primeiro lugar nas pesquisas, mas que andou “falando demais” – na perspectiva do partido – e colocando sua participação na corrida ao Senado em risco.

Questionado se haveria a possibilidade do Republicanos apoiá-lo, Nelson desconversou, mas deixou alguns sinais no ar: “Não sei, não posso responder pelo Republicanos. Sei que nós temos muita coisa em comum, muita afinidade de bandeiras. O pré-candidato ao governo Erick Musso é uma pessoa que eu tenho muito carinho, muita admiração. Respeito muito a história do Republicanos construída no Espírito Santo. Sei que o Republicamos tem pré-candidato ao Senado, preciso respeitar isso. Mas tem muitos candidatos no Republicanos, hoje, que têm muita ligação com minha história. Tenho buscado o maior diálogo possível. Na política, tudo é possível. Precisamos acompanhar como as coisas vão se encaixar”.

“Não posso responder pelo Republicanos. Sei que nós temos muita coisa em comum, muita afinidade de bandeiras”

Nelson descarta rumores de que poderia, lá na frente, “descer” para ser candidato a deputado federal. “Minha candidatura é irreversível. Desde o início deixei muito claro que o projeto era o Senado. Sou pré-candidato ao Senado”. Mas sabe que a disputa será dura e que o Avante – pequeno diante de outras legendas que querem o Senado – terá de gastar muita sola de sapato e gogó para viabilizar o partido na disputa.

“Sobre estar numa legenda pequena, a majoritária é composição política. Aí cabe o poder de articulação de cada ator político. Hoje, o Avante tem um protagonismo no Espírito Santo, tem voz com todas as outras lideranças partidárias. Eu transito bem em todos os segmentos”, avaliou.

Sobre a quantidade de partidos de olho na única vaga disponível, Nelson diz: “Quanto mais, melhor. O capixaba merece ter uma diversidade nas urnas e que o povo escolha aquele candidato que melhor lhe representa. Me sinto à vontade para o capixaba me conhecer”.

Ideologicamente, Nelson Júnior diz que se identifica mais com o conservadorismo, mas evita se colocar num polo. “Hoje estão querendo impor uma dicotomia: ou você é isso ou você é aquilo. Até onde isso é saudável para uma sociedade como um todo? (…) Eu sou cristão, família, as pautas do conservadorismo se aproximam do que eu defendo”.

E, dos presidenciáveis já colocados, vai apoiar o presidente Bolsonaro à reeleição. “Eu sou conservador. Eu não discuto pessoas eu discuto pautas. Hoje, de todos os pré-candidatos, Jair Bolsonaro é o que está mais alinhado às pautas que eu acredito”.

“Uso do Estado para defender ideologias”, diz Nelson sobre aborto em menina

O pastor Nelson Junior também foi questionado sobre temas polêmicos. Um deles é sobre o movimento que criou e que foi inspiração para a criação da lei “Eu escolhi esperar” em Vitória. Nelson foi questionado qual seria o limite para não infringir o Estado laico e a liberdade religiosa dos estudantes ao se aplicar um programa cristão como política pública no município.

“Infelizmente essa discussão foi para o lado político-partidário e não é essa a intenção. O ‘Eu escolhi esperar’ é um movimento cristão, da igreja para a igreja. Mas, quando pega a lei, não tem uma linha sequer sobre abstinência sexual, a lei é focada para o público adolescente, para ampliar programas e métodos contraceptivos. Qual o problema dentre tantas políticas públicas acrescentar mais uma? Como política pública eu também não concordo que leve a mesma mensagem (religiosa) para o público teen, temos que respeitar a fé do público teen. Mas gravidez na adolescência é uma questão de saúde pública. Os índices baixaram ao longo de 30 anos, mas ainda não são suficientes”.

Nelson explicou que a lei é uma medida de prevenção para o adolescente que não iniciou a vida sexual, uma vez que outros métodos contraceptivos citados por ele seria apenas para adolescentes com vida sexual ativa. Ele foi questionado, então, sobre qual seria a abordagem.

Davi Esmael foi autor da lei “Eu escolhi esperar”

“A abordagem é dizer para o adolescente uma coisa simples: ‘se você não se sente pronto, não se sente preparado para iniciar a vida sexual (não inicie)’. Porque, de fato, não é a melhor idade para isso, tanto que toda gravidez na adolescência é de risco. Isso é ciência, não é religião. E o fato do estado ser laico não significa que seja um estado ateu. Qual o problema de se pegar valores bíblicos, milenares, para o benefício da sociedade? Aliás, constitucionalmente – não tem nada a ver com igreja – a iniciação sexual abaixo de 14 anos, mesmo com consentimento, é crime”, justificou o pastor.

Nesse contexto, logo na pergunta seguinte, Nelson Junior foi questionado, então, sobre o caso da menina de 11 anos que foi estuprada (ainda com 10 anos) e teve, num primeiro momento, o direito ao aborto negado por um hospital e por uma juíza. Nelson disse que o caso é muito triste, que o aborto deixa marcas e que o episódio teve uso político.

“É um caso muito triste, mais triste ainda por não ser o primeiro e dói o coração de saber que não será o último. Independente de tudo, ela vai levar as marcas. Eu atendo muitas mulheres, trabalho com aconselhamento, então eu sei a dor, as marcas, os traumas de uma gravidez não planejada, principalmente com um aborto”, disse.

“Mais uma vez houve o uso do poder do Estado para se defender ideologias. ‘Ah, ela foi estuprada!’. Isso é uma manipulação para fazer a opinião pública entender que ela foi abusada por um maníaco, não! O delegado já confirmou, isso qualquer pessoa pode ter acesso, vão ter os exames de DNA, mas por exemplo, tudo comprova que o pai era um adolescente. Não foi só ela que estava debaixo do estupro de vulnerável. A menina precisa de amparo e o menino que estava envolvido naquilo tudo, que teve sua vida exposta também? Ele também é um cidadão em estado de vulnerabilidade, ele não é um estuprador. A menina confirmou, os pais confirmaram que eles eram namorados”, disse o pastor.

“A menina precisa de amparo e o menino que estava envolvido naquilo tudo, que teve sua vida exposta também? Ele também é um cidadão em estado de vulnerabilidade, ele não é um estuprador. A menina confirmou, os pais confirmaram que eles eram namorados”

Continua sendo crime

Em entrevista ao jornal online Top News, o delegado de Tijucas (SC), Alisson Rocha, responsável pelo caso, disse que o fato da relação sexual ter sido consensual, não significa que não tenha ocorrido crime. “Houve estupro? Sim. Um ato infracional análogo ao crime de estupro. Mas pelos elementos extraídos até então, a responsabilidade se direciona aos dois. Óbvio que, com o Estatuto da Criança e do Adolescente, a criança responderia por medida de proteção. Já o menor (menino) responderia com medidas socioeducativas, podendo chegar até a internação”, explicou o delegado.

Na entrevista, o delegado foi questionado se ainda que tivesse uma relação de afeto e que a relação tenha sido consensual, a menina teria direito ao aborto. O delegado disse que sim. “Uma coisa não pretere outra. Nós temos o artigo 128 do Código Penal, ainda que seja uma conduta recíproca, ela não deixa de ser vítima. Porque (no artigo) o legislador diz que quando houvesse estupro poderia haver o abortamento”, afirmou o delegado, uma vez que o artigo 217-A criminaliza como estupro de vulnerável a relação sexual com menores de 14 anos, ainda que consentida.

O delegado afirmou que as investigações estão em andamento e que, apesar de ter indícios de que o pai do bebê da menina de 11 anos fosse um adolescente de 13 anos, ainda não saiu o resultado de exames genéticos para comprovar a autoria do ato. Ele também afirmou que não haveria indício de omissão por parte da mãe e nem ciência de que a menina tivesse namorado.

Questionado se concordaria com o que dita a lei hoje sobre casos em que o aborto é autorizado – quando coloca em risco a vida da mãe, quando o bebê é anencéfalo e em caso de estupro – Nelson respondeu: “Concordo. Isso já foi debatido incansavelmente há anos, no Parlamento, mesmo com a mudança de atores políticos, foi o que entenderam os representantes do povo que estavam ali”. Porém, no caso da menina de Santa Catarina, Nelson sinalizou de outra forma: “Ali tinha uma criança, ali não era um amontoado de células como muitos defendem não, todas as vidas importam”.

O pastor também foi questionado sobre os direitos civis da população LGBTQIA+, como casamento e adoção de crianças, uma vez que pretende ir para o Senado, Casa onde tais debates acontecem. “Ao ir para a vida pública, eu preciso defender as pautas de interesse público. Uma coisa é o Nelson, ministro religioso na igreja, sempre aberto ao diálogo. Para você ter uma ideia, muitas pessoas LGBTs vão aos meus eventos, ouvem as minhas falas e não se sentem ofendidas. Já existem políticas públicas, acho que todas as minorias devem ser atendidas em suas necessidades. Só não vou permitir que movimentos radicais queiram impor uma ditadura, isso não! Temos que ir para o diálogo, mas todas as vidas importam, inclusive dessa minoria”.

Na íntegra

A entrevista na íntegra com esses assuntos e outros, como as bandeiras que o pré-candidato vai adotar em sua campanha, os bastidores sobre conversas com atores políticos, incluindo o governador, e projetos para o “Eu escolhi esperar” caso Nelson seja eleito, pode ser conferida aqui: