Política

Eleições: diretor da PF defende mudar lei para combater 'fake news'

Para o delegado Eugênio Ricas, é fundamental que o País tenha uma legislação mais moderna, que dê mais segurança para todos.

Eugênio Ricas é diretor de Investigação e Combate ao Crime Organizado da Polícia Federal.

A Polícia Federal já está mobilizada para começar a atuar no recém-criado grupo de trabalho com o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e PGR (Procuradoria Geral da República) para o combate às fake news durante o processo eleitoral deste ano.

Duas coordenações subordinadas à Diretoria de Investigação e Combate ao Crime Organizado da Polícia Federal estão mobilizadas.

Foram deslocados para o força-tarefa três delegados e um perito, que pela parte da PF, serão chefiados pelo delegado Rômulo Berredo, chefe do Serviço de Repressão a Crimes Cibernéticos.

A expectativa da PF é que em até 30 dias, a contar da primeira reunião que deve acontecer nesta semana, o grupo já tenha um relatório com o protocolo de ação do que será feito durante as eleições e, possivelmente, uma proposta de alteração da legislação para que fique mais claro quais são os crimes, e respectivas penas, para quem criar ou disseminar notícias falsas nas Eleições 2018.

Para o delegado Eugênio Ricas, diretor de Investigação e Combate ao Crime Organizado da Polícia Federal, é fundamental que o País tenha uma legislação mais moderna, que dê mais segurança para todos. Em entrevista à coluna, ele explicou que o foco do grupo de trabalho não é a alteração da legislação, mas que esse seria o momento ideal para a discussão, já que a legislação brasileira não tipifica o crime. Leia abaixo a íntegra da entrevista.

Qual é o foco do grupo de trabalho que foi criado?

— Temos oportunidade de avançar em dois aspectos. O foco do grupo de trabalho criado pelo ministro Luiz Fux não é a criação de uma nova lei, de uma proposta de alteração legislativa. O foco é estabelecer um protocolo de ação durante as eleições para combater as 'fake news'. Como a polícia vai atuar, como o MP vai atuar e como o próprio Judiciário vai atuar. Mas acredito sim que seja uma oportunidade para que esse grupo de trabalho saia com uma proposta de alteração legislativa. Talvez aproveitando esses projetos que estão tramitando, talvez criando outro. Para duas coisas: estabelecer primeiro até onde as pessoas podem ir. Tanto na criação de notícias, por ventura falsas, como na disseminação. E aí sim a gente fala de tipificação. O que é crime e o que não é crime. Porque hoje há uma insegurança jurídica com relação a isso. E num segundo momento já criados esses tipos penais estabelecendo o que é crime o que não é crime dar condições para a atuação da polícia. Porque não são crimes fáceis de serem apurados. A gente sabe da possibilidade do uso de provedores em outros países, da disseminação das notícias é muito rápida. Isso viraliza com rapidez muito grande. Então é uma apuração complicada. Um dos objetivos dessa lei seria dar ferramentas para a polícia poder atuar.

Quantas pessoas estarão no grupo de trabalho?

— Por parte da PF, três delegados e um perito e foram mobilizadas duas coordenações, a Coordenação Geral de Polícia Fazendária, onde funciona o serviço de repressão a crimes cibernéticos, grupo que já tem expertise de crimes dessa natureza mas que normalmente no caso de pedofilia e pornografia infantil que são disseminados pela internet e a Coordenação Geral de Defesa Institucional que é a coordenação que cuida do processo eleitoral: crimes praticados durante eleições e planejamento para se evitar crimes durantes as eleições. O TSE e O MPF vão indicar os seus membros. Por parte da PF o coordenador será Rômulo Berredo, que é o chefe do serviço de repressão a crimes cibernéticos. Mas a liderança do grupo é do ministro Fux ou alguém indicado por ele.

Mas dentro da da Polícia Federal o grupo de trabalho fica subordinado à diretoria de investigação e combate ao crime organizado da PF, sob seu comando?

— Sim.

Já tem prazo para o grupo de trabalho começar as atividades e apresentar um relatório?

— Deve começar essa semana, com a volta do recesso do Judiciário, agora nessa semana, e nessa primeira reunião estabelecer um prazo e acredito como razoável 30 dias, não passando de 40, para se ter um protocolo definido, para se ter se for o caso, uma proposta de mudança legislativa. Isso não pode se prolongar muito em função da agenda. Se for o caso de uma proposta legislativa tem que se respeitar o prazo do Congresso. Por isso é importante esse prazo [de 30 ou 40 dias].

As maiores dificuldades para combater fake news são perfis falsos e distribuidores de conteúdo que não se dizem responsáveis pelo conteúdo e estão sediadas em outros Países. Essas são as maiores dificuldades?

— São dificuldades reais que a gente vive em outros tipos de apurações então é importante que a legislação determine de forma muito clara o que é esse protocolo e obviamente a cooperação dessas empresas, ou ao menos a compreensão de que havendo uma determinação judicial de que eles têm que cumprir a determinação judicial, sem qualquer tipo de questionamento.

A grande preocupação de candidatos que temos escutado é que dano de fake news pode não ser revertido a tempo porque eleições são curtas, como você vê isso?

— É um fato. É uma situação muito pior se a gente for imaginar a legislação que a gente tem disponível hoje. Reforça a necessidade da gente ter uma modernização da legislação. De fato o período eleitoral é curto. Existem notícias de que casos que aconteceram em outros países, com danos a imagem gravíssimos, e não tem como voltar no tempo, as notícias se disseminam. Há um interesse maior [da população] nas notícias mais dramáticas e normalmente são as mais mentirosas. Por isso acho que passou da hora da sociedade brasileira estabelecer o que pode e o que não pode ser feito e como a polícia deve agir nesses casos.

O perfil falso é o grande responsável pela disseminação de notícias falsas?

— Não só isso, acho também que a falta de uma legislação moderna que gere nas pessoas aquele senso de responsabilidade. Hoje cada um recebe uma mensagem e divulga sem checar porque não se sente responsável porque nós não temos uma legislação que faça com que as pessoas se sintam responsáveis. É uma mudança de cultura. As culturas não são mudadas pela legislação, mas em alguns casos uma legislação mais moderna pode ajudar numa mudança de cultura de comportamento.

Com a legislação atual, quais crimes são praticados por quem cria ou divulga 'fake news'?

— O código eleitoral prevê alguns crimes, como crimes contra a honra. Prevê também crime de divulgação de informação falsa para prejudicar candidato ou partido. Para você ter uma ideia de como a legislação é ultrapassada, uma das agravantes desse crime é que divulgação seja feita por jornais, rádio ou televisão. Sequer existia internet. Essa é uma possibilidade, de crime eleitoral. Cuja pena é de meses, que é uma pena muito baixa. Tem possibilidade de crimes contra honra, do código penal. E se não tiver impacto nas eleições, uma pessoa que divulgue, por exemplo, boatos que possam gerar pânico, a gente tem previsão somente na Lei de Segurança Nacional, que é uma lei de 1983. São legislações muito arcaicas feitas em outro momento histórico que o País vivia. A gente sequer imaginava como as coisas funcionariam após o advento da internet. O Brasil precisa sim modernizar a sua legislação. Se isso não acontecer é a nossa obrigação trabalhar com o arcabouço legal que nós temos. E é o que vamos fazer. Esse grupo vai fazer o protocolo independente de alteração legislativa. Mas acredito que é uma grande oportunidade que o País tem para modernizar a legislação que trata disso.

Em outras ações da Polícia Federal há essa mesma dificuldade em relação a legislação de internet?

— Sim, há. O próprio marco civil da internet perdeu a oportunidade de criar mecanismos quando tivemos os grandes eventos e terrorismo era uma grande preocupação eu acho que perdemos algumas oportunidades e agora é uma oportunidade diante da preocupação das fake News no processo eleitoral. A legislação ainda está muito aquém do que deveria. A gente não tem inventar moda. Tem que ver o que está sendo nos outros países e o que está dando certo. Nos Estados Unidos as eleições sofreram impacto grande com fake news, na França isso também tem sido uma preocupação e o próprio presidente disse que é importante modernizar a legislação francesa. País que tem tradição libertária maior que outros. O Brasil tem que fazer esse debate.

O problema atual maior é a morosidade ou as penas muito brandas para quem comete um crime desses?

— Tudo, morosidade, falta de previsões claras, já se pensando em o que é praticado hoje com internet e temos que fazer adaptações e com isso a polícia acaba não tendo ferramentas adequadas para trabalhar. Isso tudo contribui em uma eficácia reduzida.

O senhor está confiante em uma mudança na legislação pelo Congresso Nacional ainda esse ano?

— É um momento oportuno porque quase todos os que estão ali são candidatos à reeleição e estão sujeitos a ser vítimas. TSE, Ministério Público Federal e Polícia Federal têm essa intenção. Acho que há convergência de fatores que contribuem e não podemos pensar só para essas eleições. Daqui a dois anos tem outra. É uma oportunidade para o Brasil avançar.

Com informações do Portal R7.com

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