Política

Desembargador decidiu soltar Temer 'no recesso do lar'

Athié havia determinado, na semana passada, a inclusão do pedido liminar de liberdade do ex-presidente e dos outros presos da Lava Jato na pauta da quarta-feira (27), para análise da Turma

Redação Folha Vitória
Foto: Marcelo Camargo/ Agência Brasil

Em decisão que mandou soltar o ex-presidente Michel Temer (MDB) e seus aliados, o desembargador Ivan Athié, do Tribunal Regional Federal da 2.ª Região (TRF-2), afirmou que "no recesso do lar" examinou "com o cuidado devido" os habeas corpus dos presos da Operação Descontaminação, desdobramento da Lava Jato. Athié havia determinado, na semana passada, a inclusão do pedido liminar de liberdade do ex-presidente e dos outros presos da Lava Jato na pauta da quarta-feira (27), para análise da Turma.

Além de Temer e do ex-ministro Moreira Franco, o desembargador mandou soltar o coronel reformado da PM de São Paulo João Baptista Lima Filho, o Coronel Lima, homem forte do ex-presidente, sua mulher, Maria Rita Fratezi, seu sócio Carlos Alberto Costa, Carlos Alberto Costa Filho, e o empresário Vanderlei de Natale, dono da Construbase. Alvos de prisões temporárias, Rodrigo Castro Alves Neves e Carlos Jorge Zimmermann foram soltos pela desembargadora Simone Schreiber, plantonista do TRF-2.

O magistrado anotou que a decisão do juiz Marcelo Bretas, da 7.ª Vara Criminal Federal do Rio, que mandou prender os alvos da Descontaminação, tem 46 páginas. Athié destacou ainda que o pedido de prisão do Ministério Público Federal tem 384 páginas.

"Afora o número de páginas dos referidos habeas-corpus, há também, em alguns deles, documentos a instruí-los", anotou.

"Teria então de proferir, na tarde da última sexta-feira, dia 22 de março de 2019, decisão em todos os habeas-corpus, eis que não seria justo, nem recomendável, fazê-lo tão somente em relação a um ou alguns dos pacientes. Mas, na verdade, tampouco em relação a qualquer deles teria a necessária segurança para decidir, sem examinar as alegações e os documentos que suportaram a decisão combatida. Por uma simples razão - a clara impossibilidade de examiná-los, ainda que perfunctoriamente, mais os 7 habeas-corpus já ajuizados, e proferir decisão naquela tarde."

Segundo Athié, "não tinha, assim, a menor condição de, naquela tarde, decidir com segurança". O desembargador afirmou que "a única providência possível e adequada, a meu ver, foi a de instar o Juízo indigitado coator a dizer se mantinha sua decisão, em face das alegações feitas em nome dos pacientes em seus habeas-corpus, das quais deu-se-lhe conhecimento, e também fixar data-limite para resolver os pedidos, mediante a inclusão em pauta dos processos, na sessão de quarta-feira próxima".

"Neste último fim de semana, no recesso do lar, pude examinar com o cuidado devido as alegações, a decisão combatida, os documentos que fazem parte dos processos. E elaborar decisão ora escrita, e que no início do expediente da próxima segunda-feira, dia 25 de março de 2019, será assinada, a fim produza efeitos, e anexada eletronicamente aos referidos habeas-corpus. Ao examinar o caso, verifiquei que não se justifica aguardar mais dois dias para decisão, ora proferida e ainda que provisória, eis que em questão a liberdade. Assim, os habeas-corpus que foram incluídos na pauta da próxima sessão, ficam dela retirados", alegou.

Entenda a investigação contra Temer

A ação que prendeu Temer e seus aliados é decorrente da Operação Radioatividade, que mirou um esquema de cartel, corrupção ativa e passiva, lavagem de capitais e fraudes à licitação que atuou na construção da usina nuclear de Angra 3.

A nova investigação apura pagamentos ilícitos feitos por determinação do empreiteiro José Antunes Sobrinho, ligado à Engevix, para "o grupo criminoso liderado por Michel Temer, bem como de possíveis desvios de recursos da Eletronuclear para empresas indicadas pelo referido grupo".

A Lava Jato identificou um "sofisticado esquema criminoso para pagamento de propina na contratação das empresas Argeplan, AF Consult Ltd e Engevix para a execução do contrato de projeto de engenharia eletromecânico 01, da usina nuclear de Angra 3".

O Ministério Público Federal afirmou que a Argeplan, de coronel Lima, "participou do consórcio da AF Consult LTD, vencedor da licitação para a obra da Usina Nuclear de Angra 3, apenas para repassar valores a Michel Temer".

Segundo a Procuradoria, a AF Consult do Brasil e a Argeplan não tinham pessoal e expertise suficientes para a realização dos serviços, e, por isso, houve a subcontratação da Engevix. No curso do contrato, conforme a investigação, coronel Lima solicitou ao sócio da empresa Engevix o pagamento de propina, em benefício de Michel Temer.

A Lava Jato destaca que a propina foi paga no final de 2014 com transferências totalizando R$ 1,91 milhão da empresa da Alumi Publicidades para a empresa PDA Projeto e Direção Arquitetônica, controlada pelo coronel Lima.

Para justificar as transferências de valores foram simulados contratos de prestação de serviços da empresa PDA para a empresa Alumi.

O empresário que pagou a propina afirma ter prestado contas de tal pagamento para o coronel Lima e para Moreira Franco.

As investigações apontaram que os pagamentos feitos à empresa AF Consult do Brasil ensejaram o desvio de R$ 10,859 milhões, "tendo em vista que a referida empresa não possuía capacidade técnica, nem pessoal para a prestação dos serviços para os quais foi contratada".

De acordo com a Lava Jato, o esquema "praticou diversos crimes envolvendo variados órgãos públicos e empresas estatais, tendo sido prometido, pago ou desviado para o grupo mais de R$ 1,8 bilhão".

A investigação aponta que diversas pessoas físicas e jurídicas usadas de maneira interposta na rede de lavagem de ativos de Michel Temer continuam recebendo e movimentando valores ilícitos, além de permanecerem ocultando valores, inclusive no exterior.

Os procuradores afirmam que "quase todos os atos comprados por meio de propina continuam em vigência e muitos dos valores prometidos como propina seguem pendentes de pagamento ao longo dos próximos anos".

Segundo a força-tarefa, as apurações também indicaram uma espécie de braço da organização, especializado em atos de contrainteligência, a fim de dificultar as investigações, tais como o monitoramento das investigações e dos investigadores, a combinação de versões entre os investigados e, inclusive, seus subordinados, e a produção de documentos forjados para despistar o estado atual das investigações.

O Ministério Público Federal requereu a prisão preventiva de alguns dos investigados, pois, todos esses fatos somados apontam para a existência de uma organização criminosa em plena operação, envolvida em atos concretos de clara gravidade.

Defesas

Em nota, os criminalistas Maurício Silva Leite e Cristiano Benzota, que defendem o Coronel Lima, afirmam: "A decisão proferida é de extrema importância pois valoriza os princípios fundamentais dispostos na Constituição Federal, além de demonstrar a serenidade e imparcialidade do Tribunal ao apreciar a questão."

O criminalista Antônio Sérgio Moraes Pitombo afirmou que "a defesa de Wellington Moreira Franco aguardava, de modo sereno, a liminar do Tribunal. É importante ao desenvolvimento da sociedade que se preservem os direitos individuais e se respeite a lei."

Os advogados Alexandre Sinigallia e Paola Forzenigo, advogados de Carlos Alberto Costa, manifestaram: "A forma processual é o que dá segurança em nosso Estado Democrático de Direito. E a investida da acusação com base em fatos antigos - indevidamente chancelada pelo Juiz de 1º Grau - foi ação claramente ilegal, como brilhantemente reconhecido pelo e. TRF2."

O advogado Fernando José da Costa, que defende Vanderlei de Natale, afirmou: "Justiça foi feita. A prisão acaba com a dignidade de um homem, os bloqueios acabam com seu patrimônio, mormente quando tais decisões são ilegais. Sua rápida revogação pelas instâncias superiores é um recado para que magistrados de primeira instância tenham mais cautela antes de decidir favoravelmente a pedidos formulados pelo Ministério Público, principalmente naqueles que não é dada oportunidade do investigado se manifestar".

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