Política

Juízes se tornam réus em processo que apura venda de sentença no ES

Desembargadores do TJES também decidiram abrir um procedimento administrativo disciplinar contra Alexandre Farina e Carlos Alexandre Gutmann

Rodrigo Araújo

Redação Folha Vitória
Foto: Reprodução redes sociais

O Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) aceitou a denúncia apresentada pelo Ministério Público Estadual (MPES) contra os juízes Alexandre Farina Lopes e Carlos Alexandre Gutmann. 

Os dois magistrados são acusados de participar de um esquema de venda de sentença, que teria favorecido uma empresa da Serra. Com o recebimento da denúncia, eles se tornaram réus no processo.

Por unanimidade, os desembargadores acompanharam o voto da relatora do caso, Elisabeth Lordes, quanto à denúncia aos juízes. Outras cinco pessoas também viraram réus no caso. A votação do mérito aconteceu na sessão do pleno do TJES desta quinta-feira (18).

Além disso, os dois magistrados responderão administrativamente pela denúncia. Também durante a sessão desta quinta, os membros do Tribunal de Justiça decidiram abrir um procedimento administrativo disciplinar (PAD) contra os acusados.

Nesse caso, as penas variam entre advertência e aposentadoria compulsória, com remuneração proporcional ao tempo de serviço. Caso sejam obrigados a se aposentar, perdem o foro privilegiado que possuem por serem juízes e passam a ser julgados pela justiça comum.

Antes do fim da sessão do pleno do TJES, o advogado de Farina, Rafael Lima, pediu a reconsideração quanto à necessidade de manter a prisão preventiva do juiz. Em resposta, a desembargadora Elisabeth Lordes afirmou que todos os pedidos de relaxamento das prisões estão sendo examinados.

"Eu estava aguardando esse recebimento da denúncia, pelo tribunal pleno, para reexaminar todas as questões que estão sendo trazidas por todos os advogados, com os respectivos documentos. Oportunamente, no decorrer da semana, nós poderemos examinar todos esses pedidos."

A defesa de Gutmann se manifestou por meio de nota, dizendo estar confiante de que conseguirá provar a inocência do agora réu.

"Sabe-se que entendimento dos Tribunais é de que, para o recebimento da denúncia, bastam indícios mínimos de autoria e materialidade. A instauração da ação penal não significa, de forma alguma, reconhecimento de que houve crime. Acabamos de entrar na fase judicial. Provas serão produzidas e a defesa de Carlos Alexandre Gutmann segue plenamente confiante na absolvição do magistrado", destacou.

Juízes estão afastados das funções há cinco meses

O processo referente à Operação Alma Viva, deflagrada pelo MPES, resultou no afastamento cautelar, em junho, dos dois magistrados do Fórum da Serra, onde atuavam. Além disso, os dois foram presos preventivamente.

Farina está no Quartel do Comando Geral (QCG) da Polícia Militar, em Maruípe, em Vitória, enquanto Gutmann cumpre prisão domiciliar. Eles foram presos no dia 28 de setembro, após o Superior Tribunal de Justiça (STJ) cassar a liminar que garantia a soltura de ambos.

O pedido de abertura de inquérito contra os juízes e outras sete pessoas foi protocolado no dia 31 de maio deste ano pela procuradora-geral de Justiça, Luciana de Andrade.

O objetivo é apurar a suposta prática de corrupção passiva, corrupção ativa e exploração de prestígio. Por meio de fontes, o Folha Vitória teve acesso a todo conteúdo investigado pelo MPES, com cerca de 150 páginas, que traz os indícios de corrupção envolvendo magistrados, empresário e advogados.

Segundo as apurações do MPES, Alexandre Farina teria recebido propina para intermediar a venda de sentença em favor de uma imobiliária. A sentença foi proferida, em março de 2017, pelo juiz Carlos Alexandre Gutmann, que também teria recebido pagamento indevido para favorecer a empresa.

Além dos magistrados, o MPES apontou a participação de outros envolvidos, como o dono da imobiliária, que teria pagado propina para ser beneficiado no registro de um terreno.

Advogados da empresa também são investigados por envolvimento no caso, além do ex-policial civil Hilário Frasson, que em agosto foi condenado a 30 anos de prisão por encomendar o assassinato da ex-esposa, a médica Milena Gottardi — o crime, entretanto, não tem qualquer envolvimento com o esquema.

Segundo o MPES, os diálogos revelaram que Farina interferiu em um julgamento envolvendo a empresa Cecato Negócios Imobiliários Ltda, que teve o registro de um terreno na Serra negado pelo Cartório de Registro Geral de Imóveis (2ª Zona da Serra).

Como em casos como este é necessária manifestação do Judiciário, o processo foi instaurado pela titular responsável pelo cartório. Em petição protocolada em setembro de 2016, o caso foi para o Juízo da Vara da Fazenda Pública Estadual, de Registro Público e Meio Ambiente da Serra.

Segundo as investigações do MPES, Farina negociou o recebimento de dinheiro com a intermediação de Hilário e de Davi Ferreira da Gama, ex-funcionário da Associação dos Magistrados do Espírito Santo (Amages).

Os dois últimos mantinham contato direto com o empresário Eudes Cecato e com os advogados que representavam a empresa favorecida (Cecato Negócios Imobiliários) Luiz Alberto Lima Martins e Alecio Jocimar Favaro — este último, no entanto, não virou réu no caso, pois a relatora votou pelo arquivamento da denúncia contra ele.

Os diálogos entre Hilário Frasson e Alexandre Farina para a suposta venda da decisão judicial teriam começado em fevereiro de 2017, conforme apontou o Ministério Público do Estado.

Já a sentença foi prolatada no dia 3 de março daquele ano, pelo magistrado Carlos Alexandre Gutmann, em favor da Cecato.

"O juiz julgou improcedentes as exceções levantadas pela oficiala cartorária e determinando registro das escrituras públicas da empresa Cecato Negocios Imobiliários Ltda", apontou o órgão.

De acordo com os diálogos verificados pelo MPES, o pagamento de uma parte da propina teria ocorrido no dia 30 de março de 2017. Na ocasião, coube a Valmir Pandolfi pegar o dinheiro com Eudes Cecato e entregar para Hilário Frasson. No mesmo dia, Hilário teria repassado a quantia para o juiz Alexandre Farina.

Ainda segundo o MPES, mensagens posteriores indicaram que o empresário pagou integralmente o valor acordado.

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