No coração do Norte capixaba, o cacau se tornou mais do que um cultivo: é memória, raiz e identidade de Linhares. Entre rios, floresta e sol intenso, a fruta amazônica encontrou solo fértil para prosperar e moldar a história de um município inteiro. Cada amêndoa carrega o sabor da tradição e o cuidado de famílias que, há mais de um século, vivem dessa cultura.
Primeira Indicação Geográfica (IG) de cacau em amêndoas do Brasil, conquistada em 31 de julho de 2012 junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), o cacau em amêndoas de Linhares se tornou um marco na valorização do território capixaba. O selo garante que apenas as amêndoas produzidas no município, dentro de padrões rigorosos de qualidade, possam ostentar o nome da região.
O cultivo do cacau em amêndoas em Linhares começou no início do século XX, mas os registros apontam ainda para o final do século XIX, quando Filogônio Peixoto trouxe as primeiras sementes para a região. Em 1921, a inauguração da Estação Experimental de Cacau, na Fazenda Goytacazes, consolidou a atividade e serviu de escola para os agricultores.
Desde então, a cultura não parou de crescer e se tornou a base econômica e cultural do município. “A história do cacau se confunde com a história de Linhares. Foi o cacau que deu origem ao município e até hoje sustenta milhares de famílias”, afirma o secretário executivo da Associação dos Cacauicultores do Espírito Santo (Acau), André Scampini.
O terroir de Linhares
O segredo da qualidade do cacau capixaba está no território. O Rio Doce corta o município e, ao lado do clima quente e úmido, garante condições ideais para o cultivo.
“O cacau é amazônico, gosta de sol e água. Em Linhares, temos esse terroir perfeito, que entrega um cacau com alto teor de manteiga, mais sabor e mais intensidade”, explica André.
O reconhecimento inédito do INPI em 2012 deu ainda mais visibilidade ao cacau em amêndoas de Linhares, destacando o município como referência nacional na produção de amêndoas de qualidade. “A IG garante rastreabilidade, identidade e valor agregado à amêndoa de Linhares. Foi um divisor de águas para os produtores”, completa.
O cuidado na lavoura
A produção do cacau exige atenção em cada etapa. Na colheita, só os frutos maduros são retirados, com a quantidade ideal de açúcares. Depois de quebradas, as amêndoas seguem para a fermentação, onde permanecem de cinco a sete dias, iniciando o processo de formação de aromas e sabores.
Em seguida, passam pela secagem e armazenamento, sempre sob o olhar atento do produtor. “Todo esse cuidado faz essa amêndoa ser tão apreciada pelos chocolateiros do mundo inteiro. Quem trabalha com cacau coloca muito amor no que faz, porque é um produto que exige carinho e dedicação”, conta a produtora Erika Rangel, cuja família cultiva cacau há mais de 100 anos.
Para ela, a tradição é também uma herança de família. “Começou com meus avós e chegou até mim. Hoje seguimos juntos nesse trabalho, sempre preservando a qualidade do cacau fino, que guarda todos os precursores de sabor para um chocolate de excelência”, destaca.
Diversidade que fortalece
Na lavoura, a variedade de frutos colore a paisagem e garante resistência. “O cacau de Linhares tem uma diversidade incrível de variedades, como CCN 51, PH 16 e tantas outras. Cada uma entrega resultados diferentes, seja na produtividade, seja no sabor. E isso fortalece a produção”, explica a produtora e presidente da Acau, Kellen Scampini.
Ela lembra que muitas plantações estão dentro da cabruca, sistema agroflorestal em que o cacau cresce sob a sombra de árvores centenárias. “Isso garante equilíbrio, preservação ambiental e qualidade. Além disso, metade da amêndoa do Cacau Linhares é manteiga de cacau, o que o torna ainda mais valioso para a indústria do chocolate”, completa.
Reconhecimento de Indicação Geográfica
O reconhecimento de Indicação Geográfica pelo INPI foi um divisor de águas para os produtores locais. Para André Scampini, o selo não apenas protege o nome Linhares, mas também colocou a região em destaque mundial.
“A indicação geográfica Cacau Linhares foi a primeira do Brasil voltada para amêndoas de cacau. Entramos com o pedido em 2009 e conquistamos o registro em 2012. Isso deu visibilidade ao nosso produto e colocou Linhares no mapa internacional do cacau de qualidade”, afirma André.
Se para a cidade a IG representa identidade e história, para os produtores ela significa também mais oportunidades. “A IG garante rastreabilidade e valor agregado. Para nós, produtores, significa vender uma amêndoa reconhecida, com identidade de origem e qualidade comprovada. Isso abre mercado e dá orgulho de levar o nome de Linhares para o mundo”, diz Kellen, destacando como o selo fortaleceu o trabalho de quem vive da lavoura.
Impacto econômico e ambiental
Com cerca de 20 mil hectares cultivados em 600 propriedades, a lavoura de cacau em Linhares gera cinco mil empregos diretos no campo. Mas o impacto vai além da economia: a atividade ajudou a preservar um dos maiores remanescentes de Mata Atlântica do Brasil, mantendo floresta em pé e biodiversidade viva.
A qualidade do cacau de Linhares é reconhecida internacionalmente. As amêndoas já foram premiadas no Salão Internacional de Chocolate, em Paris, reforçando a excelência de um produto que conquistou o mundo.
Para o Sebrae/ES, que atuou diretamente com os produtores para auxiliar na conquista da IG, o cacau é um verdadeiro patrimônio do município. “O cacau é o ouro da região. É uma ferramenta mercadológica que abre oportunidades e fortalece negócios. Nosso trabalho é apoiar o produtor, oferecer capacitação e transformar características empreendedoras em resultados concretos”, destaca a gerente regional do Sebrae/ES, Carla Bortolozzo.
Mais que um cultivo, o cacau de Linhares é símbolo de identidade e resistência. Uma herança centenária que se reinventa a cada safra, preservando a floresta, fortalecendo famílias e levando o nome do Espírito Santo para o mundo.
Sobre a websérie
IdentidadES é uma websérie de reportagens e vídeos produzidos pela Rede Vitória em parceria com o Sebrae/ES. A cada episódio, uma história inspiradora revela como produtos com Indicação Geográfica estão transformando vidas, territórios e economias no Espírito Santo.
Reporter
Jornalista há 9 anos, formado pelo Centro Universitário Faesa, com especializações em Marketing, Administração de Empresas e Gestão de Vendas.
