A Justiça determinou a reintegração de posse das comunidades Vila Esperança e Vale da Conquista, em Jabaeté, Vila Velha, e as famílias deixaram as casas na manhã desta terça-feira (9). Moradores relatam desespero diante da ordem que exige a saída de toda a comunidade da região.
A área pertence a uma empresa privada e está envolvida em disputa judicial desde 2019. Em agosto, a 6ª Vara Cível de Vila Velha autorizou a desocupação, decisão posteriormente referendada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Lideranças comunitárias e advogados que acompanham o caso afirmam que não houve planejamento suficiente para garantir assistência às quase mil famílias afetadas.
Adriana Paranhos, moradora da região há 32 anos, líder comunitária e representante dos ocupantes, disse que a comunidade não recebeu o acompanhamento necessário durante a ação.
Temos pessoas com deficiência e idosos, e não houve interesse humano nem político. Tivemos porta-vozes da Polícia Federal para negociar isso, mas continuamos abandonados. Somos um povo sofrido, de luta, trabalhador. Hoje temos famílias na porta do governador pedindo ajuda porque não sabem para onde ir.”
Adriana Paranhos, líder comunitária
Ainda de acordo com ela, a promessa de auxílio financeiro para ajudar nos custos da mudança da comunidade, não aconteceu.
O advogado Robson Lucas, que representa parte das famílias, explicou que a ocupação começou em 2016, em uma área que estava abandonada e sem uso. Ele afirma que o processo de reintegração passou por diferentes gestões municipais e que houve falta de continuidade no diálogo com os moradores.
É preocupante a situação. Essas famílias não têm para onde ir. Quando o proprietário entrou com a ação judicial em 2019, já existia um decreto de desapropriação feito pela gestão municipal anterior. Em 2020, chegou a ser iniciado o pagamento de indenizações, mas, com a troca de gestão, esse decreto foi revogado por falta de verba.”
Robson Lucas, advogado
Ainda de acordo com Robson, em 2022, a Justiça determinou que a prefeitura organizasse medidas de deslocamento e negociasse alternativas para os moradores. Em abril do mesmo ano, a Defensoria Pública foi legitimada para atuar em defesa dessa população vulnerável.
O Supremo Tribunal Federal (STF) chegou a suspender a decisão a nível estadual, exigindo que o poder público apresentasse soluções, mas a implementação das medidas demorou três anos.
Recentemente, foi oferecido um auxílio-aluguel de R$ 2.200, válido por três meses, posteriormente ampliado para R$ 3.600, valor que, segundo o advogado, ainda não atende às necessidades das quase mil famílias afetadas.
Robson acrescenta que a decisão final determina que os moradores saiam até esta terça-feira (9). Os bens, segundo ele, seriam levados para um armazém disponibilizado, mas o espaço não comporta a quantidade de famílias atingidas.
Estamos falando de cerca de 800 famílias apenas na região da Vila Esperança. Não há mais o que fazer juridicamente. O prazo é hoje e não existe estrutura para acolher toda essa população.”
Robson Lucas, advogado
O que diz a prefeitura
A Prefeitura de Vila Velha informou que o serviço de atendimento para os moradores está em funcionamento desde quinta-feira (4), no espaço do Projeto Tons de Amora, na Avenida Líbano, em Jabaeté.
Somente nesta terça-feira (09), foram atendidas 39 famílias. Além disso, 66 famílias que estão na lista das 135 identificadas como em vulnerabilidade; 175 famílias indicaram ter para onde ir, mesmo que provisoriamente e 153 famílias com perfil para benefício.
Durante os atendimentos, realizados das 8h às 17h, são reunidas secretarias como: Assistência Social, Educação, Saúde, Meio Ambiente, Desenvolvimento Urbano e Mobilidade, Defesa Social e Trânsito, Desenvolvimento Econômico, além da Agricultura e Pesca.
Entre os serviços oferecidos estão o atendimento psicossocial com orientações e encaminhamentos; apoio às famílias com crianças e adolescentes em idade escolar, inclusive para transferência de matrícula, se necessário.
Além disso, também é realizado o recolhimento e destinação adequada de animais doentes, abandonados ou em situação de maus-tratos, conforme a legislação vigente.
Famílias terão possibilidade de receber um recurso financeiro, diz secretária
A secretária de Assistência Social de Vila Velha, Letícia Goldner Valim, disse que todas as famílias terão a possibilidade de receber o apoio financeiro para fazer a “autogestão”.
Todas elas terão a possibilidade de receber um recurso financeiro para fazer a sua autogestão. Com uma primeira parcela de R$ 2.222 e, após até 90 dias, uma segunda parcela de R$ 1.400, perfazendo aí um total de R$ 3.622, onde ela conseguirá, com isso, se reorganizar em um novo local.“
Letícia Goldner Valim
Letícia também descreveu que o município tem a possibilidade de atender até 493 famílias caso cumpram alguns pré-requisitos.
“Vila Velha tem a possibilidade de atender até 493 famílias, desde que elas passem pelo nosso atendimento e elas cumpram os critérios de estar no Cade Único, ter até meio salário mínimo e não ter imóvel em seu nome”.
Decisão judicial
O Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) determinou, em 20 de agosto de 2025, a retomada da reintegração de posse das áreas da Vila Esperança e Vale da Conquista, reconhecendo que os terrenos são privados. A medida atende a ações judiciais movidas pelos proprietários em 2017 e 2019.
A Secretaria de Assistência Social também lembra que no ano de 2016 foi registrada uma desocupação de “algumas glebas da grande fazenda”. “A parte autora sempre entrou com o processo requerendo a posse novamente desse todo espaço que nunca desistiu”.
Diante disso, no ano de 2025 foi registrada a decisão após toda a parte de organização junto à Justiça.
*Com informações do repórter Gabriel Cavalini, da TV Vitória