Socol. Foto: Breno Ribeiro
Socol. Foto: Breno Ribeiro

IdentidadES

Socol de Venda Nova: a tradição italiana que virou identidade capixaba

Reconhecido com Indicação Geográfica, o embutido artesanal mantém viva uma herança centenária e movimenta o agroturismo no Espírito Santo

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No alto das montanhas capixabas, um sabor atravessa gerações e conta a história da imigração italiana no Espírito Santo. Feito à base de carne suína, temperos simples e um processo artesanal transmitido de família em família, o socol é mais que um embutido: é memória, cultura e símbolo de identidade de Venda Nova do Imigrante, cidade reconhecida nacionalmente pela tradição.

A receita chegou ao Brasil por volta de 1880, trazida pelos primeiros imigrantes italianos que se instalaram em Venda Nova em busca de terras férteis, clima agradável e água potável. Na época, sem refrigeração e diante do alto custo de produção, o socol era preparado apenas para ocasiões especiais e para receber visitantes ilustres.

Com o tempo, a prática se fortaleceu como um dos maiores símbolos da cultura italiana no Espírito Santo. O processo artesanal pouco mudou desde então: as peças de carne suína são salgadas por dois dias, lavadas, secas, temperadas e depois curadas por meses, em um ritual que exige cuidado e paciência.

O sabor de família que virou negócio

Thais Falqueto. Foto: Breno Ribeiro

Entre as famílias que mantêm viva a tradição, está a de Thais Falqueto, que hoje administra o Tio Vé Socol, criado pelo pai.

“A tradição começou com a minha avó, que ensinou meu pai, e depois ele passou para os filhos. São 35 anos de história, e no início era só para consumo da família. Nos encontros com amigos, o socol era servido e acabou despertando a vontade de comercializar”, conta.

Com a decisão de montar uma agroindústria, o investimento veio do trabalho da família na roça. “Todo o dinheiro que a gente usou veio da roça. Foi um sonho do meu pai, que construiu até a nossa loja com madeira de casa antiga. Lá, cada detalhe mostra a tradição da nossa família”, lembra Thais.

Hoje, ela vende para todo o Brasil, com um e-commerce em implantação, e destaca o impacto da Indicação Geográfica (IG):

“Aumentamos mais de 50% da produção depois que conseguimos esse selo tão especial. A IG valorizou o produto e deu muito orgulho. Eu faço questão de contar essa história para cada cliente que passa pela loja”.

Segredo de geração em geração

Gracci e sua mãe, Dete Lorenzoni. Foto: Breno Ribeiro

A tradição também é preservada com carinho pela família Lorenção, do sítio Lorenção, referência em Venda Nova do Imigrante pela produção centenária de socol e pelo pioneirismo no agroturismo da região.

Mais do que um produto, o socol se tornou parte da identidade da família, que mantém vivo um saber transmitido de geração em geração.

Gracci Lorenção, ao lado dos pais, Dete Lorenzoni e Edines José Lorenção, revela o cuidado em cada etapa da produção.

“As peças ficam 48 horas no sal. Depois, lavamos e secamos uma por uma antes do tempero, que é o grande segredo da família. Alho e pimenta-do-reino são obrigatórios pelo regulamento técnico da IG, mas cada produtor tem seu toque especial. Aqui, tudo é no olho e feito à mão”, explica Gracci.

Ela lembra que o processo continua 100% artesanal: “Não pode ter nada artificial. Antigamente, usávamos a pele do peritônio para envolver a carne, mas dava muito trabalho e risco de contaminação. Hoje, usamos um colágeno natural, que mantém a tradição e garante qualidade”, conta.

Turismo de experiência

Fazenda Carnielli. Foto: Reprodução/IdentidadES

A família Carnielli, de origem italiana, foi uma das pioneiras na introdução do socol em Venda Nova do Imigrante. Há mais de um século, trouxe da Itália a técnica de cura da carne suína que, preservada de geração em geração, tornou-se símbolo da imigração italiana no Espírito Santo.

Hoje, o nome Carnielli está diretamente associado à tradição do socol e à memória da colonização italiana na região.

“Além de ser um produto artesanal, o socol preserva a tradição da família Carnielli, que trouxe da Itália, há mais de um século, a técnica de conservar a carne suína. Cada vez mais as pessoas querem conhecer não só o produto, mas também a história por trás dele. O turismo de experiência é isto: voltar às raízes, vivenciar aquilo que nossos antepassados faziam e conhecer a cultura local”, afirma o produtor Leandro Carnielli.

Leandro Carnielli. Foto: Breno Ribeiro

Essa conexão com o território fortaleceu o agroturismo em Venda Nova, que hoje atrai visitantes de todo o país em busca de sabores autênticos e da vivência das tradições italianas.

Além de degustar o socol, turistas têm a oportunidade de conhecer de perto o processo artesanal, visitar propriedades históricas e mergulhar em uma cultura que une gastronomia, memória e hospitalidade.

Identidade reconhecida

Em 2018, o socol de Venda Nova recebeu o selo de Indicação de Procedência pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). O reconhecimento garante que apenas os produzidos na região, seguindo a técnica tradicional, podem ostentar o título.

Para o presidente da Associação dos Produtores de Socol, Lorenzo Carnielli, a IG foi um divisor de águas. “A gente fabrica o socol há 140 anos. A IG veio para dar valor e notoriedade. Hoje, quem chega em Venda Nova quer levar um socol para casa, como um pedaço da nossa história. Isso fortalece a cultura e a economia local”, fala.

Segundo a gerente regional serrana do Sebrae/ES, Patrícia Cangussu, o trabalho com os produtores foi essencial para consolidar o reconhecimento.

“Apoiamos desde a formação da associação até consultorias para melhorar processos, embalagens e acesso ao mercado. Levamos o socol para feiras e eventos em todo o Brasil. Hoje, ele é uma referência nacional de produto com Indicação Geográfica”, ressalta.

Tradição que segue viva

O socol, que começou como um alimento preparado apenas para momentos especiais, se tornou um dos maiores símbolos de Venda Nova do Imigrante. Mais do que um embutido, é um elo entre gerações, uma herança que ganhou força com a união das famílias e com a valorização da cultura italiana no Espírito Santo.

Sobre a websérie

IdentidadES é uma websérie de reportagens e vídeos produzidos pela Rede Vitória em parceria com o Sebrae/ES. A cada episódio, uma história inspiradora revela como produtos com Indicação Geográfica estão transformando vidas, territórios e economias no Espírito Santo.