Sustentabilidade previdenciária sob pressão: o impacto dos programas sociais e da informalidade

A expansão de programas sociais por parte do governo representa uma conquista importante no âmbito da programas sociais e na redução das desigualdades. No entanto, esse fenômeno exige uma reflexão crítica sobre os efeitos colaterais para o financiamento da previdência pública. O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), por exemplo, depende de um equilíbrio entre trabalhadores ativos que contribuem e beneficiários que recebem aposentadorias, pensões ou auxílios e qualquer alteração nessa base pode comprometer sua sustentabilidade.

Um primeiro ponto relevante é que, com o aumento de benefícios sociais assistenciais ou de transferência de renda, parte da população pode optar por não participar da formalidade, reduzir sua contribuição regular ou migrar para empregos informais. Esse fenômeno reduz a base contributiva do sistema previdenciário, ocasionando desequilíbrios financeiros que comprometem a capacidade de o INSS arcar com suas obrigações no longo prazo. À medida que menos pessoas contribuem formalmente, o volume de arrecadação diminui, enquanto o número de beneficiários tende a crescer, impulsionado pelo envelhecimento da população e pela ampliação da cobertura social. Quando menos contribuintes atuam formalmente, com vínculos regulares que geram recolhimentos ao INSS, o financiamento do sistema fica mais vulnerável.

O resultado é um sistema pressionado por dois lados: menos entradas de recursos e mais saídas, o que torna o modelo de repartição simples, em que os trabalhadores ativos financiam os aposentados, cada vez mais desafiador de sustentar. Segundo dados do Anuário Estatístico da Previdência Social 2023, a despesa total com benefícios previdenciários cresceu cerca de 10,3% em relação ao ano anterior, alcançando mais de R$ 890 bilhões. Se a base de contribuintes não acompanhar esse ritmo, o déficit tende a se ampliar, exigindo aportes do Tesouro Nacional e impactando as contas públicas.

O impacto da informalidade no sistema previdenciário

Paralelamente, a informalidade tem se mantido em patamares elevados no Brasil: dados da Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que a taxa de informalidade no mercado de trabalho foi de cerca de 38,9% no trimestre até outubro de 2024, o que correspondeu a aproximadamente 40,28 milhões de trabalhadores atuando na informalidade. Em outra medição mais recente, o índice estava em 38,1% no trimestre até fevereiro de 2025, com cerca de 39,079 milhões de informais. A informalidade compromete não apenas as contribuições previdenciárias, já que empregos informais muitas vezes não recolhem ou recolhem menos, mas também a qualidade dos vínculos de trabalho, o que repercute no valor e no direito à aposentadoria.

Quando se conjuga aumento de programas sociais (que podem reduzir a motivação ou necessidade de contribuir formalmente) com taxas persistentes de informalidade, o resultado é uma combinação preocupante para o sistema previdenciário: diminui a entrada de recursos no curto prazo enquanto os compromissos futuros permanecem ou aumentam, seja por conta de envelhecimento populacional, seja pela ampliação de cobertura de benefícios. Isso pode conduzir a efeitos como: cortes de benefícios, atrasos em pagamentos ou aumento da alíquota de contribuição ou mesmo da idade mínima para aposentadoria — todos impactos que afetam diretamente o cidadão.

Oportunidades na Consultoria previdenciária

Outro aspecto crítico é o impacto sobre a demanda por consultoria previdenciária especializada. Em um cenário de maior complexidade, com possíveis mudanças de regra, renegociações de tempo de contribuição, aumento da informalidade, cresce a necessidade de orientação para que trabalhadores organizem sua trajetória contributiva e possam assegurar uma aposentadoria mais segura. Portanto, para escritórios, consultores e especialistas em direito previdenciário, esse cenário representa também um aumento de demanda e responsabilidade.

Por fim, mudanças econômicas e sociais que elevem o desemprego ou a subocupação representam um risco adicional ao sistema. Afinal, se a população ocupada diminui ou migra para segmentos menos protegidos, a base contributiva se reduz ainda mais e o desequilíbrio previdenciário se aprofunda. Nesse contexto, o planejamento previdenciário, tanto individual quanto coletivo, assume papel ainda mais importante.

Conclusão: o equilíbrio é necessário

Em suma: é preciso enxergar os programas sociais não apenas como instrumento de justiça social, mas também como parte de um sistema mais amplo, que inclui mercado de trabalho formal, contribuições previdenciárias e sustentabilidade à frente. A transição para uma previdência sustentável depende de políticas integradas, que estimulem a formalização, garantam contributividade adequada e contemplem, ao mesmo tempo, justiça social e viabilidade financeira. Sem esse equilíbrio, corre-se o risco de que a expansão do assistencialismo, por mais bem-intencionada que seja, acabe por fragilizar o próprio mecanismo de proteção social que se deseja preservar.

Caroline Bonacossa

Colunista

Advogada especialista em Direito Previdenciário, mestranda em Administração e Direção de Empresas e pós-graduada em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho. Fundadora e gestora de uma rede com sete escritórios localizados no Espírito Santo e no Rio de Janeiro, palestrante, professora universitária e autora do livro "Ensaios sobre Direito Constitucional: Limbo jurídico do idoso maior de 60 anos de idade" e do ebook "Coletânea Acadêmica Jurídica: A importância do parecer farmacêutico para o reconhecimento de incapacidade laboral".

Advogada especialista em Direito Previdenciário, mestranda em Administração e Direção de Empresas e pós-graduada em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho. Fundadora e gestora de uma rede com sete escritórios localizados no Espírito Santo e no Rio de Janeiro, palestrante, professora universitária e autora do livro "Ensaios sobre Direito Constitucional: Limbo jurídico do idoso maior de 60 anos de idade" e do ebook "Coletânea Acadêmica Jurídica: A importância do parecer farmacêutico para o reconhecimento de incapacidade laboral".