
Vivemos um tempo marcado por uma pressa quase delirante. Não se trata apenas de velocidade, mas de um modo de estar no mundo em que tudo parece urgente, inadiável e exaustivo. Basta circular pelas ruas neste final de ano para ouvir um discurso que se repete como um refrão coletivo: cansaço, falta de tempo, esgotamento. Não é uma queixa isolada, mas um sintoma disseminado.
Há uma sensação difusa de que o tempo já não é mais ou menos administrável ou previsível. E, de fato, ele não é. O tempo tornou-se fragmentado, acelerado e capturado por exigências contínuas de produção, desempenho e resposta. Nesse cenário, não surpreende que um adoecimento psíquico mais intenso se inaugure. Multiplicam-se as tentativas de controlar o mal-estar por meio da medicalização excessiva, numa busca por anestesiar aquilo que insiste em incomodar.
A pressa, porém, não elimina o mal-estar. Apenas o silencia temporariamente. Ao mesmo tempo em que tudo acelera, algo do sujeito vai sendo engolido por uma cultura que não tolera pausas, falhas ou demora. É justamente nesse ponto que a arte pode operar de modo radicalmente distinto.
A arte contemporânea, tão frequentemente acusada de ser “qualquer coisa” ou de provocar a pergunta recorrente “isso é arte?”, talvez incomode exatamente porque interrompe essa lógica. A provocação contida nessa indagação não diz respeito apenas à obra, mas ao lugar do espectador diante dela. O que se espera da arte? Respostas rápidas? Sentido imediato? Reconhecimento confortável?
Não é por acaso que, apesar das críticas, a arte contemporânea ocupa hoje os espaços mais visitados de museus e exposições internacionais, movimenta públicos diversos e provoca debates intensos. Ela não oferece soluções prontas, mas convoca uma experiência que exige tempo, elaboração e, sobretudo, a capacidade de sustentar um certo desconforto.
Diferente da cultura capitalista selvagem que tudo engole e transforma em consumo rápido, a arte propõe uma pausa. Um intervalo onde o sujeito é convidado a permanecer diante do que não se resolve de imediato. Esse tempo de elaboração, cada vez mais raro, não anestesia, mas permite que algo seja simbolizado.
Talvez seja aí que resida sua potência mais profunda. A arte não cura no sentido de eliminar o mal-estar, mas pode abrir um processo de cuidado muito mais amplo do que se imagina. Um cuidado que não passa pela aceleração nem pelo controle absoluto, mas pela possibilidade de sustentar a experiência, o vazio e a pergunta. Em um mundo que adoece de pressa, a arte insiste em lembrar que nem tudo precisa, ou pode, ser resolvido rapidamente.