Como se mata uma rua histórica do Centro de Vitória? Como se mata uma rua histórica do Centro de Vitória? Como se mata uma rua histórica do Centro de Vitória? Como se mata uma rua histórica do Centro de Vitória?
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Uma parte da Rua Duque de Caxias, no Centro de Vitória, está morrendo. Assisto a esta morte da janela do ateliê, me perguntando: como se mata uma rua? Nunca tinha visto isso de perto.

Já vi ruas mortas, cidades mortas afundadas pelo tempo, cujas ruínas e peças abandonadas falam do tempo em que foram vivas e interessantes até serem destruídas, mas nunca a morte em movimento, o apagamento passo a passo daquilo que antes respirava energia, vitalidade que a caracterizavam como rua.

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Rua histórica era movimentada com a 25 de Março

Outro dia fiquei sabendo que essa rua, há uns 15 anos, era quase tão movimentada como a Rua 25 de março em São Paulo – cheia de gente, de vozes, de encontros e de energia.

Parece impossível, face ao quadro que ela apresenta agora, mas olhando outros trechos do Centro, começo entender este movimento.

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Uma rua começa a morrer quando se deixa de morar e de trabalhar nela, quando se deixa de frequentá-la e de investir nela. Aí passamos a temê-la. Ela se torna um pária, uma rua perigosa, uma rua bandida, por fim uma rua fantasma.

Mas alguma coisa do que ela foi ainda esta viva nas pessoas quando dizem: “Ah, era uma rua incrível, final de semana, a gente mal podia passar, tinha isso, tinha aquilo. Eu vinha muito aqui quando criança… era muito legal e tal…”

Assim, margeada com alguns prédios históricos, a rua tem seu charme, ela não morreu ainda.

Portas e janelas cimentadas são alguns sinais

Estou nessa rua há três anos e os primeiros sinais de que ela estava sendo morta foram as portas e janelas cimentadas.

O desenho cego do que foi uma porta ou uma janela quer dizer: aqui não tem mais entrada, ou, fui embora, ou vá embora você também.

Mas ir embora para onde? Aqui é o centro histórico da cidade?

É possível ir embora do Centro? Talvez seja se aceitarmos matar as ruas do centro, se aceitarmos ter medo delas, se não cuidarmos delas, se fugirmos delas.

Uma rua é um organismo vivo que só existe e vive com as pessoas, senão ela é ruína, mera passagem, desvio, tumba.

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Este é o quadro: janelas e portas cimentadas, paredes pichadas, calçamento esburacado, postes quebrados, lixo.

Foi preciso pedir insistentemente à prefeitura para reinstalar a luz elétrica. Ela o fez, depois foi a vez da lixeira, ela também o fez.

Mas para o comprido e estreito terreno baldio da esquina que dá para a Rua Nestor Gomes, os moradores se juntaram para capinar, plantar, molhar e já está dando frutos e flores.

Rua precisa ser reavivada com projetos diversos

É assim, a rua está iluminada, com lixeira, jardim público, mas precisa ser reativada, reavivada com projetos diversos, com a presença de mais gente, com o olhar do poder público e de todos nós, quem sabe assim ela recobra a vida?

No Último Carnaval  o bloco Oitentação passou por aqui e fez a rua sorrir. Naquela tarde, parodiando o poeta Leonardo Sebastião eu escrevi:

A Rua Duque de Caxias

é uma rua morta e crua

mas veio um grupo de carnaval

Fez renascer a alegria da rua.

Fernando Augusto

Colunista

Artista plástico, pintor, desenhista e fotógrafo. Professor do Departamento de Artes da UFES. Doutor em Comunicação e Semiótica pela PUC/SP - Sorbonne).

Artista plástico, pintor, desenhista e fotógrafo. Professor do Departamento de Artes da UFES. Doutor em Comunicação e Semiótica pela PUC/SP - Sorbonne).