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Cenas de 'O Clã' têm objetivo de subverter o conceito de 'normalidade'

São Paulo – Numa cena de O Clã, Arquimedes, patriarca da família Puccio, como pai responsável que é, atravessa a casa falando com os filhos e distribuindo tarefas. Leva um prato de comida – no fim da cena, revela-se o segredo da porta fechada. Alguém está sendo mantido em cativeiro dentro da casa sem que isso afete a rotina da família. Em outra cena, o filho esportista, Alejandro, faz sexo com a namorada e, em paralelo, o pai e o outro irmão matam, a sangue-frio, outro infeliz que foi mantido em cativeiro. “Queria mostrar esse absurdo, a mistura de duplicidade e indiferença que permite que certas pessoas pratiquem atividades criminosas sem que o mundo ao redor se dê conta disso”, explica o diretor. É uma crítica ao estado do mundo? “Sem dúvida. É a minha forma de manifestar indignação.”

Embora narre eventos ocorridos no período posterior à ditadura, a herança sinistra está presente na construção da figura de Arquimedes Puccio. Interpretado por Guillermo Francella – de Coração de Leão, o Amor não Tem Tamanho -, o patriarca da família Puccio viveu a impunidade do regime e ainda se considera inexpugnável. A alienação da mulher e da filha, que não percebem nada que se passa, é mantida por ele como o faria qualquer pai cioso de suas responsabilidades (se não fossem sequestro, extorsão e assassinato). Arquimedes implica os filhos em seus atos e, diante da súbita rebeldia de Alejandro, ameaça arrastá-lo na infâmia. Papai é certamente um homem da família (e do regime), mas não se sacrifica por um (nem por outro).

Trapero pesquisou muito para fazer seu filme. Arquimedes, Alejandro morreram. A filha trocou de nome. O filho que fugiu, para não compactuar, viveu escondido no exterior. “Eles não querem publicidade e, até agora, ninguém se manifestou, nem com todo o sucesso de O Clã.” Exatamente na quinta-feira, 10, toma posse na Argentina o presidente Mauricio Macri, que encerra uma longa fase de kirchnerismo no poder. “Acho que será interessante acompanhar o que vai ocorrer, até porque o novo presidente não tem maioria legislativa. Tínhamos um Congresso atrelado ao Executivo, agora teremos de ter um diálogo real entre as instituições.” Sobre seus próximos projetos, ele diz – “Martina (NR – sua mulher, a atriz e produtora Martina Guzmán) dá à luz no começo do ano. Tenho um projeto com os norte-americanos, mas vai ter de esperar. No primeiro semestre de 2016, minha prioridade é ser pai”. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.