O que é possível fazer em 70 anos? Bom, bastante coisa, na verdade. Para a maioria de nós, é possível viver uma vida simples, ordinária, com boas histórias para contar. Mas esse não é o caso de Helio Dórea.
“Eu fiz tudo, minha filha. A gente tem história para contar”, brincou o colunista que, há 70 anos, se aventura no mundo do jornalismo.
Aos 94 anos, Helio nos recebeu em seu apartamento, na Praia da Costa. Era um dia frio e, de suéter, me abraçou, deu dois beijos na bochecha e nos convidou a sentar de frente para a sacada. Antes de começarmos a gravação, ele disse: “Preciso te mostrar uma coisa”, e me levou ao seu escritório, onde a mágica da Coluna Helio Dórea acontece diariamente.
Com seu cafezinho, ele escreve as notas do dia à mão e as manda para a filha, Helia Dórea, com quem divide a coluna. Ela é a responsável por publicar os textos no Folha Vitória.
A Coluna HD nasceu junto com o Folha Vitória, há 18 anos, no dia 10 de maio. Helio conta que Fernando Machado, na época diretor-geral da Rede Vitória, a pedido de Americo Buaiz Filho, o convidou para comandar a coluna social do novo jornal online.
Falei com a minha família que não queria mais jornal. Era muito cansativo, tinha que andar muito, viajar muito… mas Fernando disse: ‘Pensa, depois você me responde.’ Comecei a conversar com meus filhos, minha mulher e tal… e eu fui. Começamos juntos.
Mas, calma, acho que pulamos etapas. De volta à sala, começamos a entrevista com uma pergunta simples: “Quem é Helio Dórea?”
“É um jornalista que, por sinal, bateu o recorde mundial como jornalista: 70 anos de jornalismo. Nasci no interior da Bahia, em Feira de Santana. Meu pai era um fazendeiro famoso. Eu vivi muito tempo em fazenda. Fiz o curso de Farmácia em Salvador. Vim aqui a Vitória para fazer meu vestibular de Odontologia, mas eu gostei tanto que fiquei até hoje. Nunca pensei em ser jornalista”.
Quem diria: o jornalista com recorde de atuação no jornalismo começou na profissão por acaso. Como muitos momentos na vida, ser colunista social simplesmente aconteceu. Helio Dórea era o homem certo, no lugar certo.
Assista à entrevista completa em vídeo:
Depois de chegar em Vitória e por frequentar os clubes sociais da época, ele se tornou fonte do colunista social do jornal O Diário. Em uma ocasião, o amigo precisou viajar e Helio o substituiu. O que era para ser temporário, virou carreira.
Saiu do Diário para escrever na Gazeta, onde permaneceu por 44 anos. “Comecei como colunista, passei a ser gerente comercial, depois a dirigir toda a parte comercial, criei o setor de suprimentos, criei as páginas de homenagem e botei o jornal para frente. Aí eu fui andando, andando, andando, minha filha… e estou até hoje”.
As mil vidas de Helio Dórea
“Ir andando” é um resumo que não faz jus a todas as experiências vividas pelo jornalista, que foi o primeiro chefe do cerimonial do Palácio Anchieta, jantou ao lado a atriz Catherine Deneuve, na inauguração da boate Le 78, em Paris, conheceu Juscelino Kubitschek, ajudou a estruturar o curso de Jornalismo na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e, não menos importante, se casou com sua “paixão permanente”, Regina Dórea.
Mesmo tendo vivido tanto, escrever um livro não estava nos seus planos. “Helio Dórea: 70 anos de jornalismo” é uma homenagem à trajetória e ao legado do jornalista e será lançado nesta quarta-feira (28), em um evento para convidados no Iate Clube do Espírito Santo, em Vitória.
“Recebi a visita de Lino Rezende há um mês. Batemos um papo e ele disse: ‘Helio, você é recordista mundial. No Brasil e no mundo, nunca teve um colunista que permaneceu 70 anos em um jornal. É um fato que não pode passar batido'”, revelou.
Assim, o livro nasceu. Com fotos antigas, atuais e muitas histórias a serem contadas.
Glamour da vida social
São 70 anos fazendo a mesma coisa, mas de maneiras diferentes. Helio precisou aprender a “bater a máquina de escrever” e se adaptou ao mundo online. Viu o mundo mudar e se reinventou com ele – mas se engana quem acredita que isso o incomoda.
O importante é que houve renovação. A minha coluna de 70 anos não é a mesma de hoje. Antigamente era coluna social. Hoje não é mais só o social. A gente fala em turismo, em economia, em política…, pontuou.
E pode parecer glamouroso, porém, ainda é trabalho. “É cansativo, sabe? Antigamente era pior. Hoje é melhor, porque minha filha, Helia, vai aos lugares, me representa. Se dá muito bem com quase todo mundo. A coluna hoje é Helio e Helia Dórea”.
Apesar disso, Helio não tem planos de parar tão cedo. Ele confidenciou que, enquanto tiver fôlego, vai se sentar no escritório cheio de livros, quadros com fotos de momentos e pessoas especiais e até um pedaço do Muro de Berlim para contar histórias e dividir com o mundo sua genialidade, bondade e conhecimento.
“Eu sou muito feliz. Eu sou muito feliz em fazer a coluna. A coluna Helio Dórea”, afirmou.
Veja o bate-bola com Helio Dórea: