*Texto escrito por Fausto Macedo e Rayssa Motta e publicado pelo Estadão.
A Justiça Federal condenou o comediante Leo Lins a oito anos e três meses de prisão, em regime inicialmente fechado, sob acusação de ter feito “discursos preconceituosos contra diversos grupos minoritários” em uma apresentação divulgada no YouTube.
Ele terá também que pagar multa equivalente a 1.170 salários mínimos, em valores da época da gravação, e indenização de R$ 303,6 mil por danos morais coletivos. Cabe recurso contra a sentença.
A defesa de Leo Lins criticou a sentença e informou que vai recorrer.
Trata-se de um triste capítulo para a liberdade de expressão no Brasil, diante de uma condenação equiparada à censura, disseram os advogados Carlos Eduardo Ramos e Lucas Giuberti.
As informações foram divulgadas pelo Ministério Público Federal em São Paulo.
A condenação de Léo Lins acolhe denúncia do MPF. O vídeo, produzido em 2022, mostra o show “Pertubador” no qual o humorista fez uma série de declarações contra negros, idosos, obesos, portadores de HIV, homossexuais, indígenas, nordestinos, evangélicos, judeus e pessoas com deficiência.
Em agosto de 2023, quando a veiculação no YouTube foi suspensa por decisão judicial, a publicação tinha mais de três milhões de visualizações na plataforma.
A disponibilização do vídeo pela internet e a “grande quantidade de grupos sociais atingidos” foram fatores que a Justiça Federal considerou para aumentar a pena aplicada ao comediante.
A decisão também aponta como agravante o fato de as declarações terem sido feitas em “um contexto de descontração, diversão ou recreação”.
Segundo a Procuradoria, “ao longo do show, o réu admitiu o caráter preconceituoso de suas anedotas, demonstrou descaso com a possível reação das vítimas e afirmou estar ciente de que poderia enfrentar problemas judiciais devido ao teor das falas”.
Propagação de violência verbal
A sentença da 3ª Vara Criminal Federal de São Paulo destaca que conteúdos como a apresentação do réu “estimulam a propagação de violência verbal na sociedade e fomentam a intolerância”.
Segundo a decisão, atividades artísticas de humor não constituem “passe-livre” para crimes, assim como “a liberdade de expressão não é pretexto para o proferimento de comentários odiosos, preconceituosos e discriminatórios”.
O exercício da liberdade de expressão não é absoluto nem ilimitado, devendo se dar em um campo de tolerância e expondo-se às restrições que emergem da própria lei, ressalta a sentença. No caso de confronto entre o preceito fundamental de liberdade de expressão e os princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade jurídica, devem prevalecer os últimos.
A tramitação do processo teve início na Justiça de São Paulo, mas, em abril de 2024, passou para a esfera federal por determinação do Tribunal de Justiça do Estado, a pedido da defesa. Na época, a Procuradoria ratificou a denúncia do Ministério Público paulista e a 3.ª Vara Criminal Federal determinou a instauração da ação penal.
O que diz a defesa de Leo Lins
A defesa do humorista Leo Lins recebeu, na presente data, com grande surpresa, a publicação da sentença que lhe impôs pena de 8 anos, 3 meses e 9 dias de reclusão, em regime fechado, além do pagamento de R$ 303.600,00 a título de danos morais coletivos.
Trata-se de um triste capítulo para a liberdade de expressão no Brasil, diante de uma condenação equiparada à censura.
Ver um humorista condenado a sanções equivalentes às aplicadas a crimes como tráfico de drogas, corrupção ou homicídio, por supostas piadas contadas em palco, causa-nos profunda preocupação.
Apesar desse episódio, mantemos plena confiança no Poder Judiciário nacional, que tantas vezes tem sido acionado para garantir direitos e liberdades individuais.
A defesa informa que interporá o competente recurso de apelação e confia em que essa injustiça será reparada em segunda instância.
*Carlos Eduardo Ramos – OAB/SP 297.102