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'O Homem que Elas Amavam Demais' tem trama cheia de nuances

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São Paulo – O que parece apenas um drama familiar entre ricaços torna-se uma cativante história que mescla amor louco e mistério policial. Com O Homem que Elas Amavam Demais, André Téchiné mostra-se em plena forma e totalmente à vontade nessa trama complexa, de muitas nuances e zonas de sombra. A história é a de uma jovem herdeira, Agnès (Adèle Haenel) que, com o fim do seu casamento na África, volta para a casa da mãe, Renée le Roux (Catherine Deneuve), proprietária de um cassino na Riviera Francesa. Renée tem em Maurice Agnelet (Guillaume Canet) seu advogado, confidente e braço direito. Eles enfrentam o assédio sem tréguas de um mafioso calabrês, dono de um cassino concorrente, que deseja se apoderar da propriedade de Renée.

O filme começa com esse tom – um drama de milionários pela posse de um mercado particular, o do jogo. Catherine passeia seu charme à vontade no papel de milionária segura de si e da tradição de seu dinheiro antigo contra o arrivista italiano que a ameaça. Agnès quer apenas viver sua vida, vai morar sozinha e monta uma pequena livraria na cidade. Entre as duas, paira a figura melíflua de Agnelet, cujo ar de bom moço não chega a esconder a extrema cobiça do personagem.

Mas o interessante é que a história toma, aos poucos, outros caminhos e vai se tornando complexa à medida que avança. O cinema de Téchiné é límpido, mas a narrativa vai se enchendo de incertezas e sombras, apesar da paisagem solar da Riviera. Os personagens são dúbios. Renée parece enfurnada em seu mundo, com pouco contato afetivo com a filha.

Esta é muito carente. Apesar do ar saudável (gosta de nadar, não fuma, não bebe) parece prestes a cair na primeira armadilha que lhe preparem. Agnelet posa de servidor fiel, mas se obstina em sua escalada social. Há os mafiosos com sua exuberância meridional e mesmo personagens menores, porém que contribuem para o drama de forma significativa. Como o chofer italiano, a quem Madame Le Roux, em momento de fraqueza, faz inesperadas confissões.

O caso acontece nos 1970 e seu desfecho judicial dá-se nos anos 2000. O intervalo de tempo é coberto de maneira eficaz pelos truques de maquiagem. Não se vê aquele envelhecimento caricato de alguns filmes. Tudo é bem-feito e nítido. Mas, apesar dessa clareza, Téchiné procura deixar que as névoas do mistério se sobreponham a supostas e enganosas certezas. Afinal, baseada num caso verídico e não resolvido, a trama não poderia suportar uma solução fácil nem definitiva. Podemos especular sobre os fatos e a personalidade dos personagens, mas sem garantias de estarmos certos. Afinal, quem sabe o que vai na alma de um homem?, como dizia o Sombra. Fincar-se nessa zona cinzenta, nessa área de incerteza da experiência humana, sem qualquer facilitário, é, por certo, o maior trunfo deste filme adulto para espectadores adultos. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.