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'Pássaros de Verão' foca grupo indígena da Colômbia arrasado pelo capitalismo

Na fábula sangrenta, a história de amor de Rapayet e Zaida coincide com o início da exploração de maconha para abastecer o mercado norte-americano

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Foto: Reprodução

Numa entrevista por telefone, Cristina Gallegos admite. “Como produtora, continuo comandando a parte logística. Como codiretora, participo cada vez mais da dramaturgia e da conceituação, mas a parte visual é coisa de Ciro (Guerra).” E ele, falando sobre Pássaros de Verão, que estreia nesta quinta-feira (22): “O tema da droga tem alimentado o cinema de gênero, o que nos levou à riquíssima tradição dos gângsteres, de Hollywood. Se você analisar, verá que esse cinema floresceu em momentos críticos da história dos EUA.

Na Europa, os filmes de gângsteres nunca tiveram a mesma representatividade, porque lá a evolução foi diferente. Nos EUA, tudo foi muito mais rápido, como na Colômbia. Evoluímos de uma sociedade agrária, rural, para o mundo urbano, num período muito curto, em torno de 15 anos no filme. Nossa ideia foi usar a tradição de gângsteres para colocar na tela a natureza brutal e selvagem do capitalismo”.

A Colômbia e o narcotráfico na era pré-Pablo Escobar. Um filmaço. “Quando começamos a pesquisar as disputas de território e de drogas no mundo wayuu, o que imediatamente chamou a atenção foi a conexão dessa cultura com o mundo grego”, reflete Ciro Guerra. “A fatalidade do destino. Os wayuu são o grupo indígena dominante na Colômbia. Possuem uma consciência muito forte da tragédia, que é comunicada por meio de canções tradicionais. São a sua literatura. Como na Grécia antiga, os wayuu acreditam na figura do mensageiro e que os deuses se comunicam com os homens por meio de sonhos, onde os pássaros adquirem uma simbologia toda particular. Foi impressionante mostrar o filme para a comunidade. Eles viam nos pássaros significados que ultrapassavam o que havíamos tentado criar.”

Assista ao trailer

Na fábula sangrenta de Pássaros de Verão, a história de amor de Rapayet e Zaida coincide com o início da exploração de maconha para abastecer o mercado norte-americano. Isso catapulta uma família de indígenas a um mundo quase inimaginável de riqueza e poder, mas a ganância provoca uma espiral de violência que termina por tudo destruir. Algumas coisas chamam muito a atenção.

O empoderamento feminino está no centro da trama, mas Ciro Guerra diz que não tem nada a ver com o impacto de movimentos como o #MeToo. “Começamos nosso filme muito antes dos acontecimentos dos últimos dois ou três anos em Hollywood, e a verdade é que nossa matriarca é profundamente enraizada na cultura wayuu, na qual as mulheres são poderosas.”

O filme foi construído de forma a integrar atores nativos com profissionais. “Era muito importante trazer esse elemento de verdade a nossa ficção. Ao mesmo tempo, sabíamos que teríamos de ter profissionais nos papéis decisivos do casal e da matriarca. Chegamos a pensar em termos dois casais, um adolescente e outro mais maduro, mas, quando escolhemos Natalia Reyes para ser Zaida e vimos que ela poderia fazer tanto a garota de 15 como a mulher de 30, isso terminou mudando nosso conceito do elenco. Natalia foi a matriz e, em função dela, trouxemos José (Acosta, que faz Rapayet) e Carmina (Martinez, a matriarca). O nome dessa última, Ursula, é nossa homenagem a Gabriel García Márquez, porque a dimensão mítica de Cem Anos de Solidão foi fundamental para o tipo de universo que queríamos criar.”

* As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.