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'Traviata' monumental feita de pequenos gestos

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Quando a censura resolveu criar problemas para Giuseppe Verdi às vésperas da estreia de Rigoletto, questionou a escolha de um bobo da corte corcunda como protagonista. A resposta do autor tornou-se símbolo do que definiria sua obra dali em diante: “Um corcunda que canta! Por que não? Vai causar efeito? Não sei. Mas, se eu não sei, eles tampouco o sabem. Achei que seria belo retratar esse personagem deformado e ridículo, mas que é, interiormente, apaixonado e cheio de amor”.

Rigoletto se aproxima de La Traviata e Il Trovatore (formando a chamada trilogia romântica) na tentativa de trazer para o centro da ação personagens tidos como marginais. É isso que vai permitir a Verdi tratar de um de seus temas preferidos, a oposição entre o desejo individual e a imposição do coletivo, por meio de um mergulho profundo na caracterização dos personagens e seus conflitos internos.

Conflitos não faltam na Traviata, baseada no texto de Alexandre Dumas Filho sobre a cortesã que se apaixona pelo jovem Alfredo, mas vê seu amor impossibilitado pelas convenções da época. E é nesse caráter intimista que está o melhor da produção da ópera que abriu na última semana a temporada do Teatro Municipal de São Paulo. Isso porque, ao optar pelo monumental de corte histórico nos cenários e figurinos (assinados por Nicolas Boni e Cássio Brasil), o diretor Jorge Takla acaba por colocar justamente na direção de atores o foco e o sentido da narrativa e do drama.

A soprano bielo-russa Nadine Koutcher constrói uma Violeta tomada desde o início, mesmo em seus devaneios a respeito da possibilidade do amor ao lado de Alfredo, por um comovente senso de tragédia. Por sua vez, o barítono Paulo Szot amplia as possibilidades de leitura de Germont, o pai do rapaz, a partir de um lirismo poucas vezes associado ao papel. O dueto dos dois, em que ele exige/pede a Violeta que se afaste do filho, é marcado por uma tensão dilacerante, feita acima de tudo de olhares e gestos mínimos. Força, afinal, não é o mesmo que intensidade, uma percepção que faltou ao Alfredo do tenor Fernando Portari, exagerado, de cores veristas.

Se o desempenho do Coral Lírico e da Orquestra Sinfônica Municipal pareceu irretocável, a regência de Roberto Minczuk, ao optar por alterações bruscas, do forte ao pianissimo, do rápido para o lento, soou pouco orgânica, em momentos que vão desde o delicado prelúdio até a grande cena coral com que se encerra o segundo ato. O resultado é que o ritmo da narrativa nem sempre se mantém, o que pode ser mortal em uma ópera como esta, que extrai da coesão do drama sua genialidade.

LA TRAVIATA

Teatro Municipal. Pça. Ramos de Azevedo, s/nº, tel. 3053-2090. 4ª (23) e 6ª, 20h. Ingressos:

R$ 40/R$ 150. Até 23/5.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.