A alta do IOF é sabotagem fiscal com roupa de responsabilidade

Enquanto o governo anuncia com naturalidade o aumento do IOF sobre operações de crédito, tentando enquadrar a medida como “necessária” ao equilíbrio das contas públicas, o que se vê, na prática, é uma escolha política travestida de responsabilidade fiscal

E uma escolha que penaliza, mais uma vez, quem tem menos margem de manobra: o trabalhador endividado, o pequeno empreendedor e a classe média que ainda tenta, com esforço, manter as contas em dia.

O argumento técnico, como de costume, soa racional: conter o endividamento das famílias, melhorar a arrecadação de curto prazo, garantir a sustentabilidade fiscal em tempos de déficit. Mas esse raciocínio é superficial. Porque a verdadeira questão não é apenas quanto o Estado arrecada, mas de quem ele escolhe arrecadar. 

E nesse ponto, o IOF – que incide sobre operações de crédito comuns, como empréstimos pessoais, financiamentos e até o uso rotineiro do cartão de crédito – tem um alvo claro: a base da pirâmide econômica.

Não se trata de uma medida neutra. O aumento do IOF recai sobre quem mais depende do crédito como ferramenta de sobrevivência ou de investimento produtivo de pequena escala. A classe média e os pequenos negócios, por exemplo, não possuem acesso a linhas sofisticadas de financiamento ou a estruturas tributárias planejadas. Seu crédito é mais caro, mais limitado e, agora, mais onerado.

A decisão é ainda mais difícil de justificar num momento em que a economia brasileira dá apenas sinais tímidos de recuperação. Os juros seguem em patamar elevado, a inflação demonstra resiliência e o consumo das famílias avança com dificuldade. Nesse contexto, tornar o crédito mais caro significa colocar um freio adicional num motor que já está longe de funcionar em plena capacidade.

Seletividade e Benefícios Fiscais

Mas talvez o ponto mais grave dessa escolha esteja em sua seletividade. Enquanto o cidadão comum vê seu crédito encarecer, os grandes benefícios fiscais – muitos deles com pouca transparência ou retorno social comprovado – seguem intocados. 

Não se fala em rever regimes especiais, subsídios ineficientes ou renúncias fiscais que beneficiam setores com forte poder de lobby. A conta, como sempre, recai sobre quem não tem voz, nem representante nas mesas de negociação.

Trata-se, portanto, não apenas de uma decisão econômica, mas de um sintoma mais profundo de como o Brasil lida com seus desafios fiscais: priorizando soluções fáceis, de curto prazo, que evitam o enfrentamento das distorções estruturais do Estado. 

Não é a primeira vez que se recorre à taxação indireta e regressiva como resposta à fragilidade das contas públicas. A diferença, desta vez, é o contraste entre o discurso e a prática. Um governo que se apresenta como popular, progressista e atento às desigualdades, mas que aplica medidas regressivas com a frieza de um tecnocrata.

O Aumento do IOF e suas Consequências

O aumento do IOF não corrige distorções, não reequilibra o sistema tributário e não promove justiça fiscal. Ao contrário: aprofunda as desigualdades, transfere o ônus do ajuste para eles de sempre e reforça o ciclo vicioso de um Estado que consome demais e entrega de menos.

Mais do que uma escolha equivocada, trata-se de uma oportunidade perdida. Em vez de promover uma reavaliação corajosa das prioridades fiscais – com foco em eficiência, transparência e justiça – o governo optou por mais um movimento oportunista. Um gesto de aparente responsabilidade fiscal que, no fundo, perpetua a lógica da penalização silenciosa dos mais vulneráveis.

No fim, a fatura chega. E, como quase sempre, quem menos pode pagar é quem mais sofre com ela.

Mateus Vitória Oliveira

Colunista

Associado do Instituto Líderes do Amanhã

Associado do Instituto Líderes do Amanhã