A longevidade das organizações e os dias de hoje

Apresentamos mais uma belíssima contribuição do consultor e escritor Eduardo Guaragna para o Blog Gestão & Resultados. É uma grande honra tê-lo conosco partilhando lições e boas práticas da gestão moderna trazendo nesta oportunidade um artigo que dá o “caminho das pedras” da longevidade de empresas e organizações de forma geral.

Vamos ao artigo:

Nós, enquanto seres humanos, temos o desejo de viver bem, com saúde, qualidade de vida e longevidade e buscamos novidades, estudos, conhecimento e recomendações para que isso se torne possível. Os progressos nos últimos 50 anos têm sido relevantes e olhamos nossos filhos e netos nascidos na 2ª década e dizemos, com prazer: eles verão a virada do sec.XXI.

De modo similar esta preocupação com a longevidade no decorrer da década de 80, foi objetivo de um grupo de estudos da Shell, liderado pelo diretor de estratégia Arie de Geus que tinha a missão de saber o que faz as empresas durarem, serem longevas. Naquela ocasião as empresas duravam em media pouco mais de 40 anos. Depois de estudarem empresas centenárias concluíram que havia quatro fatores comuns a elas que as tornavam Empresas Vivas:

Fator 1 – As empresas longevas tinham elevada sensibilidade ao seu ambiente.

Eram dotadas de elevada capacidade de se adaptar, mudando a sua estrutura interna para permitir nova forma de ver e de agir de modo a permanecerem em harmonia com o ambiente externo que se modificava constantemente. Tinham adaptabilidade em alto grau.

Fator 2 – As empresas longevas eram coesas e dotadas de um forte senso de Identidade.

Capacidade inata de construir uma comunidade interna coesa e uma persona – identidade – para si mesma que servia como núcleo duro e de resistência quando a organização passava por momentos de crise. Uma forte identificação das pessoas com a empresa.

Fator 3 – As empresas longevas eram tolerantes para tratar novas situações.

A tolerância a situações novas e a descentralização para criar novos relacionamentos estimulam a resiliência às mudanças, a descoberta de novos caminhos e as adaptações, possibilitando desenvolver negócios futuros que nada ou pouco têm a ver com o  momento presente da empresa. Organizações longevas mudavam várias  vezes o seu negócio ao longo do tempo.

Fator 4 – As empresas longevas eram conservadoras nas finanças

O conservadorismo financeiro permitia que as empresas governassem o seu próprio crescimento e evolução, aproveitando a tempo certo as oportunidades, sem depender de recursos de terceiros.

Mais recentemente De Geus atribuiu um 5º fator que chamou de formação de lideranças e sucessão nas competências referidas nos quatro fatores anteriores. A falta de um desses fatores poderia exterminar com a organização. Pense numa organização que deixou de existir? Em que falhou?

Assim podemos dizer que a prática destes fatores leva a longevidade e a forma evolutiva como isso acontece é o que chamamos de aprendizado organizacional na concepção de De Geus que sentencia: ”a capacidade de aprender mais rapidamente que os concorrentes talvez seja a única vantagem competitiva sustentável”.

Posteriormente no inicio da década de 90 Peter Senge, com o seu livro A Quinta Disciplina, mostrou também 5 aspectos fundamentais – denominados de disciplinas – a uma organização que vise aprender: domínio pessoal, modelos mentais, visão compartilhada, aprendizagem em equipe e pensamento sistêmico, a mais importante delas. As disciplinas são um conjunto de teoria e técnica que deve ser estudado e dominado para que leve ao aprendizado organizacional.

  • Domínio Pessoal: criar tensão criativa no nível pessoal, fazendo as pessoas permanecer em aprendizagem contínua, expandindo suas capacidades pessoais, com maestria, para obter os resultados desejados.
  • Modelos Mentais: Os modelos mentais decorrem de concepções e não necessariamente da realidade, devendo ser questionados, revisitados ou revistos, a exemplo dos paradigmas que se estabelecem.
  • Visão Compartilhada: estimular o engajamento da equipe em relação ao futuro que se procura criar e elaborar os princípios que permitirão o alcance deste futuro, promovendo a tensão criativa – ação que decorre da percepção do futuro desejado e do quão distante está a organização.
  • Aprendizagem em Equipe: Promoção do diálogo e da capacidade dos membros da equipe para deixar de lado ideias preconcebidas, aceitando pontos de vistas diferentes. Busca que as equipes possam desenvolver inteligência e capacidades maiores que a soma dos talentos individuais, alcançando sinergia.
  • Pensamento Sistêmico: Integra as demais num conjunto coerente de teoria e prática, evitando uma visão separada. Cria uma forma de analisar e uma linguagem para descrever e compreender as forças e inter-relações que modelam o comportamento dos sistemas. É essa disciplina que permite a mudança nos sistemas existentes com maior eficácia.

Assim De Geus e Senge contribuíram de modo decisivo para que o tema aprendizado organizacional passasse a ser objeto de atenção nas organizações. Uma das consequências disso é que os Modelos de Excelência e Gestão passaram a ter como um de seus Fundamentos o Aprendizado Organizacional.

Fascinado pelo tema aprendizado, passei a estudá-lo, sendo este tema o objeto de minha dissertação de mestrado em administração – PPGA 2002-2004 e posteriormente da edição de um livro a respeito.

Descobri que o aprendizado organizacional pode apresentar várias faces e caminhos e opera em várias instâncias organizacionais, desde atividades operacionais até a formulação de diretrizes estratégicas de negócio, de crenças e valores.

Assim constatei que são possíveis várias abordagens de desenvolvimento do aprendizado pelas organizações, sendo algumas mais adequadas segundo o ambiente de aceitação dos líderes ao erro e a cultura organizacional que possibilite a experimentação e a troca de experiências e conhecimentos entre as pessoas. Todas elas levam a melhoria ou mudança no nível de desempenho e competitividade organizacional.

Compartilho com vocês um artigo sobre o tema aprendizado, mostrando as diversas abordagens e seu uso.

https://www.abqualidade.org.br/livro_abq/ABQ_Livro_Capitulo_Guaragna_1_1.pdf

No mundo de hoje em que a velocidade crescente das mudanças é o padrão existente, o aprendizado organizacional é o caminho para a competitividade e longevidade sustentável, se bem entendido e aplicado pela organização e seus lideres.

E no momento atual com o COVID 19 (Coronavírus) rondando nossas casas e o ambiente, o que nossas organizações podem fazer?

Vamos repassar os ensinamentos de De Geus, hoje:

Sensibilidade ao ambiente: importantíssimo estarmos atendo aos sinais. Talvez a criação de uma equipe com visão estratégica seja aconselhável para manter esta prontidão e agir com adaptabilidade;

Pessoas coesas: cuidar das pessoas, de suas ansiedades é papel dos lideres. São as pessoas que ajudarão a organização a vencer estes problemas e preservar o futuro da organização;

Tolerância a novas situações: tem a ver com a inovação. Hoje este estímulo se dá com a ação de startups que têm maior liberdade e agilidade que uma empresa de porte e tradicional. Assim, preservar este espírito neste momento;

Conservadorismo nas finanças: manter as atividades essenciais e negociar o alongamento das dividas e compromissos.

Com relação às disciplinas de Senge: acreditamos que o pensamento sistêmico deve ser guia para as decisões de curto prazo, sem se deixar influenciar por modelos mentais preestabelecidos (a situação do Coronavirus é nova, sem precedentes). Manter as equipes, compartilhar os anseios e as ações de mudança para enfrentar a crise são fundamentais para estabelecer confiança nas pessoas e o seu comprometimento que farão a organização sair da crise.

Desejo a todos pleno sucesso em suas ações. Vamos superar esta crise sem precedentes.

Eduardo Vieira da Costa Guaragna – Diretor Presidente da ABQ – Academia Brasileira da Qualidade – www.abqualidade.org.br

Ilustrações: Getulio A. Ferreira

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