Crédito subsidiado e o paradoxo da exclusão financeira

Artigo de Opinião escrito pela associada do Instituto, Milena Moscon.

Em meio à escalada dos juros no Brasil, com a inadimplência atingindo 77,8 milhões de pessoas físicas e 7,8 milhões de CNPJs negativados até junho de 2025, surge uma ironia cruel: justamente as políticas desenhadas para incluir financeiramente os mais vulneráveis têm contribuído para a sua exclusão. O aumento da seletividade bancária e o encolhimento da oferta de crédito escancaram um paradoxo gerado por uma estratégia recorrente do Estado: a intervenção triangular.

Conforme definido por Murray Rothbard em “Governo e Mercado”, a intervenção triangular ocorre quando o Estado impõe restrições e altera os termos dos contratos voluntários entre agentes privados. No mercado de crédito, isso se manifesta por meio de juros subsidiados, programas de crédito direcionado e exigências regulatórias. O resultado é um desequilíbrio entre oferta e demanda: ao baratear artificialmente o custo do dinheiro, cria-se uma ilusão de abundância que estimula o endividamento acima da capacidade real de pagamento.

Esse mecanismo distorce a preferência temporal dos agentes econômicos. Em “Man, Economy, and State”, Rothbard explica que a preferência temporal reflete a tendência humana de valorizar o consumo presente em relação ao futuro. Quando o governo reduz artificialmente os juros, ele está, na prática, incentivando escolhas de curto prazo em detrimento do planejamento de longo prazo. Famílias e pequenos negócios, atraídos pela aparente facilidade de acesso ao crédito, assumem compromissos incompatíveis com sua poupança real.

Mas a conta chega. Quando a inadimplência se torna massiva, como em 2025, o sistema financeiro reage restringindo o crédito. Os bancos, pressionados por perdas e riscos, tornam-se mais seletivos, elevando as exigências para concessão de novos empréstimos. O paradoxo é evidente: quanto mais o Estado tenta ajudar via subsídios e direcionamentos, mais estreito se torna o caminho para quem realmente precisa do crédito.

A Intervenção Estatal e o Crédito Direcionado

A resposta estatal à crise, porém, é previsível: mais intervenção. Em 2025, por exemplo, a participação do crédito direcionado no total emprestado subiu de 10,1% para 10,9%, segundo a Febraban. E o governo anunciou R$ 30 bilhões em novas linhas subsidiadas para empresas afetadas por tarifas norte-americanas. Essas medidas, além de não resolverem a raiz do problema, ampliam a dependência da iniciativa privada ao Estado e aumentam a pressão fiscal.

O custo social é difuso, mas brutal. Para bancar o ciclo de subsídios, o governo recorre a impostos, emissão monetária ou endividamento público. O resultado pode ser traduzido em inflação, perda de poder de compra e menor espaço para investimentos produtivos. Nas palavras de Rothbard, qualquer intervenção triangular carrega efeitos invariáveis: distorções, ineficiências e aumento de custos sociais.

Os Beneficiários da Engrenagem e a Falácia do Crédito Subsidiado

Quem realmente se beneficia dessa engrenagem? Certamente não são os mais pobres, tampouco os pequenos empreendedores. O grande vencedor é o próprio Estado, que fortalece sua posição como provedor de liquidez, amplia sua arrecadação futura e perpetua a dependência estrutural da população.

Portanto, é preciso expor a falácia do crédito subsidiado como solução para a exclusão financeira. As boas intenções, quando atravessadas por interesses políticos e distorções econômicas, tornam-se armas contra os próprios beneficiários. Se o objetivo é realmente fortalecer os mais vulneráveis, o caminho é permitir que o mercado ajuste livremente a taxa de juros, aloque eficientemente o crédito e construa um ambiente de previsibilidade, poupança e prosperidade. Sem intermediários coercitivos. Sem ilusões.

Milena Moscon Speroto Siqueira

Colunista

Supervisora de Projetos na Vix Logística, Associada do Instituto Líderes do Amanhã.

Supervisora de Projetos na Vix Logística, Associada do Instituto Líderes do Amanhã.