Economia

Disputas bilionárias com governo federal podem travar privatização da Cesp

Disputas bilionárias com governo federal podem travar privatização da Cesp Disputas bilionárias com governo federal podem travar privatização da Cesp Disputas bilionárias com governo federal podem travar privatização da Cesp Disputas bilionárias com governo federal podem travar privatização da Cesp

– O governo do estado de São Paulo pode encontrar no governo federal um entrave caso decida privatizar a Cesp. A geradora de energia paulista, que deve decidir em 2015 quais caminhos seguir após o término da concessão de algumas de suas usinas, mantém disputas bilionárias com a administração federal. Tais impasses, atualmente em curso ou previstos para o próximo ano, podem render quase R$ 10 bilhões à Cesp, montante que tornaria a companhia muito mais atrativa em uma eventual venda futura.

O problema teve origem no programa de renovação das concessões das usinas, o qual não contou com a adesão da Cesp. A estatal paulista decidiu entregar os ativos no prazo de vencimento dos contratos de concessão, e com isso perderá dois terços de sua capacidade instalada. Em contrapartida, a estatal receberá indenização por tais ativos, porém não há consenso em relação ao valor a ser ressarcido.

O primeiro impasse entre os governos federal e estadual envolveu a usina Três Irmãos, cuja concessão venceu em 2011, mas que era operada pela Cesp até este ano. A companhia estima que a indenização devida pelo ativo, incluindo as eclusas da usina e o canal Pereira Barreto, seja de R$ 6,7 bilhões. O governo federal propõe o pagamento de R$ 1,7 bilhão. Enquanto a discussão sobre o valor ocorre judicialmente, a Cesp pede o pagamento do montante considerado incontroverso, proposto pelo próprio governo federal.

Esse valor seria recebido ao longo de sete anos, em parcelas mensais, e corrigido pela taxa básica de juros. A Cesp estima que receberia aproximadamente R$ 300 milhões ao ano, porém não inclui esse pagamento no orçamento do próximo ano. O diretor financeiro e de Relações com Investidores da Cesp, Almir Martins, atualmente no cargo de presidente interino, acredita que a decisão judicial definitiva não seja anunciada antes de 2016.

No próximo ano, outra disputa bilionária colocará a Cesp e o governo federal em lados opostos. A estatal paulista alega que teria a receber cerca de R$ 2 bilhões pelas usinas de Jupiá e Ilha Solteira, cujas concessões se encerram em julho de 2015. O governo ofereceu 10% do valor, pouco mais de R$ 20 milhões. O montante seria referente ao projeto Ilha Solteira. “No caso de Jupiá, eles (governo federal) sequer fizeram avaliação, alegando que a usina já está depreciada”, disse Martins. “Provavelmente vai haver um conflito entre o que o governo federal vai querer nos pagar e aquilo que a gente imagina que tenhamos direito, e esse conflito não se resolve amigavelmente”, complementou.

A Cesp deve apresentar ao governo federal, ao longo do primeiro semestre de 2015, um levantamento com custos adicionais incorridos após o projeto original, informou Martins. O prazo para entregar esse levantamento seria o final deste ano, mas como internamente o assunto já é tratado com contornos de disputa judicial, a estatal planeja entregar a documentação até a data de vencimento da concessão.

Privatização

A demora do processo na Justiça, contudo, pode travar os planos da estatal paulista em um momento no qual a companhia precisa definir quais rumos tomar diante da expectativa de perder dois terços de sua capacidade de geração.

Martins explica que, do ponto de vista estratégico, o governo de São Paulo, controlador da Cesp, não teria razão para manter um ativo de geração de energia. Negociar a companhia em um momento como este, porém, pode ser prejudicial aos cofres estaduais dado que a avaliação econômica da Cesp ocorreria em um “ambiente desfavorável”, segundo o executivo.

Para o presidente interino da Cesp, o caminho a ser trilhado pela companhia seria a retomada de investimentos. O foco seria em projetos nos quais a estatal poderia assumir participação minoritária. Ao manter o caráter privado do projeto, a Cesp fugiria da burocracia que afeta as empresas estatais. “O governo sair do controle é uma operação normal, como pode acontecer com qualquer empresa”, disse Martins. “Eu defendo que a Cesp volte a investir. O investimento se refletiria em melhora da avaliação econômica da companhia e o governo do estado pode sair (do controle da empresa) a qualquer momento. Não precisaria ser em meados de 2015”, disse.

Perdas

Enquanto o impasse acerca do valor das indenizações se estabelece no âmbito jurídico, a Cesp é obrigada a fazer ajustes contábeis de forma a considerar o fim da concessão das usinas, e levando em consideração o valor de indenização proposto pelo governo federal. No final do ano passado, essa adequação foi feita com Três Irmãos. Agora, a companhia discute com auditores independentes se o ajuste em relação às concessões de Jupiá e Ilha Solteira deve ocorrer já no balanço referente ao quarto trimestre de 2014.

Na prática, a Cesp precisará fazer uma provisão para reversão dos ativos reavaliados quando da implantação do padrão contábil IFRS. Na oportunidade, houve um aumento do valor das usinas de cerca de R$ 2 bilhões. A adequação no passivo veio por intermédio de uma reserva de reavaliação do ativo, dentro do patrimônio líquido, e de outros R$ 700 milhões aproximadamente em impostos a pagar. O valor não considera outros R$ 600 milhões das usinas em valores existentes em livros antigos.

Agora, a Cesp precisará reverter essa operação de forma adequada à indenização proposta, ou seja, pouco mais de R$ 20 milhões. “Com o final da concessão, eu tenho que dar baixa no valor da usina. Dentro de impostos a pagar, não pago mais e estorno o valor. Isso vem para a conta de resultado. E também estorna dentro do patrimônio líquido. Soma o estorno da reserva e também há uma conta de reserva da variação cambial, no valor de R$ 33 milhões. Devolvo também a depreciação ao acionista”, explicou.

De acordo com Martins, o efeito para fins de dividendo seria nulo em função dos ajustes feitos no patrimônio líquido. Mas, se contabilmente a reversão dos ativos não altera o cenário de distribuição de dividendos, do ponto de vista da demonstração de resultado a Cesp pode incorporar um resultado negativo de aproximadamente R$ 1,3 bilhão. No final do ano passado, quando fez operação semelhante em relação à usina Três Irmãos, ajustou o valor regulamentar de R$ 3,5 bilhões para o R$ 1,7 bilhão proposto na indenização.

Caso, no futuro, a Cesp obtenha na Justiça uma decisão favorável, e a indenização for superior ao proposto inicialmente pelo governo federal, o valor entrará no resultado via ganho financeiro. A inclusão dessa possibilidade de ganho em uma eventual venda da Cesp, contudo, seria dificultada.