Foto: Freepik
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*Artigo escrito por Sandro Rizzato, advogado empresarial e membro do Comitê Qualificado de Conteúdo de Inovação e Tecnologia do Ibef-ES.

A privacidade tornou-se um mito moderno — algo entre unicórnio, disco voador e antivírus que realmente funciona. Ainda é mencionada em discursos e figura nas configurações de qualquer celular, mas, na prática, só existe num lugar: no modo avião, e talvez devesse ser no modo desligado.

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Hoje, a vida digital acontece imersa em um universo onde todo movimento é registrado, processado e monetizado. E, pior, com a colaboração entusiasmada de quem participa. A cada deslizar de dedo, a cada clique, a cada story publicado, revela-se uma história não para amigos, mas para algoritmos famintos.

Reclamamos da invasão de privacidade, mas ativamos a localização com prazer. Nos espantamos com a “vigilância digital”, mas contamos espontaneamente onde almoçamos, com quem estamos e o que pensamos sobre tudo — inclusive sobre política, religião e o ex da amiga.

O mais grave, porém, não é o que publicamos — é o que entregamos sem perceber. O tempo que passamos olhando uma foto, a hesitação ao abrir uma mensagem, o padrão do nosso sono rastreado por um relógio “inteligente”.

A inteligência artificial não precisa invadir sua vida: você mesmo já deixou a porta aberta, limpinha e com tapete de boas-vindas. Hoje temos até ‘som branco’ para dormir quando talvez tudo o que precisássemos fosse só o escuro.

E não adianta reclamar dos anúncios “do nada”. Falou “pneu do carro” perto do fone? Pronto. Em minutos ele está nos seus anúncios — com desconto, frete grátis e cashback. É a mágica do rastreamento. E a tragédia da ingenuidade.

A inexistência da vida privada

A vida privada virou uma peça de decoração digital: bonita, mas sem utilidade. A exposição virou regra, e o silêncio, suspeito. Quem não posta, não existe. Não compartilhar, é egoísmo. Quem não está online, deve estar escondendo algo.

Talvez o mais honesto seria admitir: não temos mais privacidade — temos perfil público com senha fraca. E mesmo quando nos dizem que é possível “ajustar as configurações de privacidade”, já é tarde demais. Estamos nus na rede, sorrindo, posando e implorando engajamento.

Desligar o Wi-Fi virou rebeldia. Ativar o modo avião é quase um ato de resistência civil. Mas só dura até o próximo ping de notificação.

A pergunta final incomoda porque é simples demais: você ainda tem privacidade ou só acha que tem?

Se quiser, responda. Mas, por favor, não publique nos stories pois o algoritmo está online.

Este texto expressa a opinião do autor e não traduz, necessariamente, a opinião do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças do Espírito Santo.

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