
Muito se discute sobre a desvalorização da engenharia no Brasil. Salários considerados baixos, falta de reconhecimento e escassez de oportunidades são reclamações frequentes em rodas de profissionais e acadêmicos. Mas há um ponto pouco abordado nesse debate: a crise da engenharia não está apenas no mercado, mas também no perfil de muitos engenheiros que chegam a ele.
O problema não é apenas estrutural, mas cultural. Formou-se uma geração de engenheiros de papel, que acumulam diplomas e certificados sem assumir responsabilidade real pelos resultados que entregam. São profissionais que tratam a faculdade como uma franquia: esperam um manual pronto, um guia passo a passo de como se transformar em engenheiro, sem compreender que a essência da profissão exige muito mais do que reproduzir fórmulas.
Na engenharia, o resultado é inegociável. Ao contrário de áreas em que erros podem ser corrigidos com ajustes rápidos, na construção civil cada falha se eterniza. Um cálculo errado não desaparece em uma planilha; ele se estampa no concreto, no aço, na estrutura que deveria garantir segurança e funcionalidade por décadas. Essa é a gravidade da profissão e o que diferencia a engenharia de tantas outras carreiras.
Dados e o Cenário Atual da Engenharia no Brasil
O cenário é confirmado por números. Segundo dados do CREA e do IBGE, o Brasil forma mais de 50 mil engenheiros por ano. No entanto, o Instituto de Engenharia estima que menos da metade atua diretamente na área de formação. Isso revela não apenas uma possível saturação, mas também a dificuldade de muitos em se consolidar como profissionais de impacto, capazes de entregar obras, projetos e soluções consistentes.
Outro dado alarmante vem da produtividade. Relatórios do McKinsey Global Institute mostram que a produtividade da construção civil brasileira é até 50% inferior à média mundial. Parte disso se deve a problemas de gestão, mas também à falta de comprometimento técnico de profissionais que não assumem protagonismo. É o retrato da crise silenciosa: não faltam engenheiros no papel, faltam engenheiros que “engenheiram” de fato.
A Responsabilidade Individual e o Futuro da Engenharia
A responsabilidade individual, conceito essencial para o pensamento liberal, precisa ser resgatada dentro da profissão. Um engenheiro não é apenas alguém que concluiu uma graduação. É aquele que assume as consequências de cada decisão, que não transfere culpas e que entende que seu trabalho tem impacto direto na vida das pessoas. Sem essa consciência, não há salário ou reconhecimento que se sustentem.
Por isso, a crise da engenharia não será resolvida apenas com mais regulamentações, conselhos ou políticas públicas. Ela exige mudança de postura. Universidades precisam preparar menos repetidores de conteúdo e mais solucionadores de problemas. Empresas precisam valorizar quem entrega resultado, e não apenas quem apresenta diploma. E, acima de tudo, os próprios engenheiros precisam compreender que a sua marca no mundo é medida pelo concreto que permanece.
A engenharia é, por natureza, a ciência da responsabilidade. Cada cálculo, cada traço, cada execução é prova disso. O futuro da profissão não dependerá apenas do mercado reconhecer seu valor, mas da capacidade dos engenheiros de resgatar a essência de sua missão: transformar conhecimento em soluções sólidas, visíveis e duradouras.