Um momento para colocar em prática o aprendizado sobre oratória e sob a observação de alguns nomes de peso do mercado corporativo do Brasil. Este será o PonTED, uma espécie de Ted Talks (aquelas apresentações rápidas com temas variados e participação de grandes líderes mundiais que viralizam no YouTube) promovido pelo Instituto Ponte. Porém aqui os alunos participantes do instituto é que farão apresentações contando histórias de superação. São jovens da Geração Z falando para grandes nomes do mercado. O evento acontece nesta quinta, a partir de 18h30, na Faesa em Vitória.
Os alunos serão julgados por um time de empresários e parceiros do Instituto Ponte de todo país. Entre os nomes convidados para o PonTed está Miguel de Arteaga, gestor financeiro que ocupa uma posição estratégica não só no universo financeiro, mas também no recrutamento e desenvolvimento de talentos da nova geração. Em especial, os profissionais da Geração Z.
De Arteaga é considerado um gestor moderno que combina visão analítica e compromisso com a meritocracia para identificar, desenvolver bem como motivar jovens talentos da Geração Z. E com essa expertise, ele estará no PonTED.
Em entrevista exclusiva ao Folha Vitória ele fala sobre a imagem da Geração Z no mercado de trabalho e aponta os caminhos para conquistar e reter valores mais jovens nas empresas.
Comprometimento profissional
A Geração Z tem sido frequentemente descrita como menos comprometida com as responsabilidades do trabalho. Para você, o que diferencia a abordagem dessa geração em relação ao comprometimento profissional?
Eu não tenho uma visão necessariamente de que a Geração Z tem um comprometimento menor com o trabalho. Eu acho que ele é diferente. E eu acho que não é necessariamente só da Geração Z. É um movimento que acontece há bastante tempo e a cada geração é maior do que na geração anterior.
O que eu vejo na Geração Z, com as pessoas com quem eu tenho trabalhado, que saíram da faculdade nos últimos anos, é que são pessoas extremamente dedicadas, tecnicamente muito competentes e até muito mais do que as gerações anteriores. Essa turma vem muito preparada do ponto de vista técnico, com muita informação, muito conteúdo. Naturalmente, acho que as faculdades, com o passar do tempo, estão preparando melhor os alunos, por meio de ligas, de iniciativas extracurriculares.
Eu sinto que a relação deles com o trabalho é diferente por dois motivos. Um é porque essa geração nasceu conectada, com uma gama de informações e de exposição ao mundo muito maior. Quando a gente pensa lá numa pessoa de 60, 70 anos, se ela fosse para a faculdade, estava restrita a estudar três, quatro carreiras possíveis.
Quando a gente pensa em um jovem que está hoje na faculdade, com 20 anos, ele já nasceu praticamente num mundo conectado. Passou a adolescência inteira inserido em mídias sociais, exposto a tudo que tem no mundo. Ele enxerga o mundo com esse leque de opções que é muito maior do que nas gerações anteriores. Essa pessoa tem muitas mais opções e possibilidades de quais carreiras seguir.
Acho que essa turma, quando entra num trabalho, entra muito qualificada, muito competente. Ela é muito comprometida no trabalho enquanto está lá, mas sempre tem muitas alternativas e possibilidades. Essas pessoas não conseguem, ao entrar no trabalho, dar um compromisso de longuíssimo prazo àquela empresa. Eles não querem fazer carreira e ficar 50 anos no mesmo lugar.
Eu sinto que essa turma também tem uma relação diferente com a visão de acúmulo de patrimônio, a forma como eles enxergam e a forma como priorizam um pouco o lado financeiro. A Geração Z não precisa ter e construir uma família aos 20, 20 e poucos anos. Ela não precisa ter uma casa, não precisa ter um carro, não precisa acumular patrimônio.
A Geração Z vive muito mais as experiências do que do acúmulo de bens e de propriedade. Assim, o trabalho vai ser algo mais fluido. Potencialmente, vai ser algo mais de oportunidades específicas que podem fazer sentido aos 20, 20 e poucos anos, mas talvez não façam sentido aos 20 e muitos anos ou aos 30 anos.
Geração Z quer experiências
Como você avalia o papel das expectativas da Geração Z em relação à carreira?
Eu sinto que eles têm, de fato, uma relação bastante diferente em função de como se formaram, muito expostos às mídias sociais, muito conectados e enxergando o mundo com muitas possibilidades. São muitas carreiras diferentes e, ao mesmo tempo, com uma relação diferente no que diz respeito à propriedade e à vontade de acumular bens, à vontade de ter uma casa, um carro. As prioridades são, muito mais, as experiências.
Em função disso, eu acho que eles têm uma expectativa em relação à carreira diferente das gerações anteriores: mais flexível, talvez priorizando mais o lado do propósito, o lado do ambiente em que vão trabalhar, do aprendizado que terão.
Paciência e adaptação
Uma queixa crescente é que os jovens da Geração Z têm pouca paciência com os arranjos produtivos atuais. Como as empresas podem se adaptar a essa característica?
Fazer parte de uma grande empresa cuja principal proposta de valor é fazer uma carreira, entrar nessa competição pelo cargo para virar gerente, diretor, VP, eu acho que não é isso necessariamente mais o que atrai esses jovens. Ou seja, a gente vê essa turma com possibilidade hoje de trabalhar em startups, de ser autônomo, de trabalhar com mídias sociais, de entrar numa carreira no mercado financeiro. Porém, hoje em dia talvez eles prefiram priorizar trabalhar numa parceria pequena, numa sociedade menor em vez de entrar num grande banco para ter essa visão de carreira de longuíssimo prazo.
Acho que são prioridades diferentes. Nesse sentido, naturalmente, a gente tem que conviver com isso como empregadores. Ou seja, fazer do limão, uma limonada. Porque essa turma tem muito a oferecer para as instituições. Só que, de fato, acho que de uma forma um pouquinho diferente do que foi no passado.
O mercado financeiro, sua área de origem, é conhecido pela alta demanda e competitividade. Como a Geração Z se encaixa?
Eu sinto que é um pessoal que chega tecnicamente muito qualificado. Essa turma chega voando. Por outro lado, ao mesmo tempo, eu acho que é um pessoal aguerrido, competitivo. Eles se adaptam relativamente bem.
O ambiente de trabalho também hoje é diferente do que era 10, 20, 30 anos atrás, mesmo no mercado financeiro. Acho que é um ambiente muito mais colaborativo, que preza muito mais por tentar construir relações duradouras.
Eu acho que é uma geração que, do ponto de vista de preparação emocional, chega um pouco menos calejada do que gerações anteriores. Eu acho que o natural do mundo que a gente vive hoje é o que acaba superprotegendo bastante as pessoas. A nossa sociedade nos protege demais. Muitas vezes, quando a gente contrata uma pessoa, o melhor aluno da faculdade, é a pessoa que talvez teve poucos desafios emocionais ao longo da vida.
E aí, quando entra no desafiador ambiente de trabalho, talvez precise de um pouco mais de tempo para criar uma casca mais grossa e conseguir enfrentar os baques que são naturais do ambiente corporativo.
Como reter a Geração Z
Quais são os principais desafios que as empresas enfrentam hoje ao tentar atrair e reter talentos da Geração Z?
Na atração, eu sinto que hoje é mais fácil do que era no passado. Com o mundo conectado, a gente consegue chegar em muito mais jovens do que chegávamos no passado, apresentando a proposta e o nosso projeto corporativo. A gente consegue chegar em diferentes faculdades. Por meio de um podcast, por exemplo, a gente se apresenta e tem tempo para mostrar qual é a nossa visão, o que estamos construindo. Tem que saber usar os meios de comunicação que existem.
Do outro lado, a retenção eu acho que é mais difícil. Pelo fato de os jovens terem uma relação diferente com o trabalho do que se tinha no passado. A retenção passa não só por você conseguir apresentar um projeto financeiro que seja atraente, o que talvez fosse suficiente no passado.
Hoje, você precisa apresentar que há um propósito naquilo que estão fazendo. Eu acho que eles se movem muito mais a valores, a um projeto que seja estimulante não só do ponto de vista intelectual, mas do ponto de vista emocional. E eu acho que é importante que seja dinâmico também.
E o terceiro é que talvez tenha que haver uma mudança na nossa mentalidade de que é uma geração que vai pular mais de galho em galho do que gerações anteriores. Então, talvez a nossa relação com a Geração Z tenha que mudar um pouco também, para serem relações um pouco mais de médio prazo e não de longuíssimo prazo.
Habilidades e competências
Do ponto de vista de recrutamento, quais habilidades e competências, além das técnicas, são mais valorizadas ao buscar um jovem?
A gente vive em uma sociedade que superprotege bastante as pessoas. Talvez a característica que eu mais busco quando estou procurando um jovem para trabalhar junto é a resiliência.
É identificar na vida daquela pessoa, eventos ou momentos em que ela demonstrou que é resiliente e que terá a capacidade de superar obstáculos, bem como crescer ao longo do tempo.
Então, talvez essa seja a principal característica que valorizo hoje em um jovem, quando estou procurando alguém para trabalhar junto comigo.
Potencial dos mais jovens
O que as pessoas perdem quando não compreendem as nuances de potencial da Geração Z?
A possibilidade de trabalhar com pessoas que têm muita energia, comprometidas e que, tecnicamente, são muito qualificadas. E complementares. Eu sou millennial, mas o mundo mudou muito nos últimos 15, 18 anos desde que eu ingressei no mercado de trabalho.
As ferramentas e a visão de mundo dessa turma são complementares à minha. Essa complementaridade intrageracional é algo que se perde quando a gente não consegue se adaptar e ver o valor do que cada geração tem a oferecer.
Você consegue avaliar como o jovem capixaba está preparado para o mercado, já que o Estado tem bons índices de educação?
Através do Instituto Ponte, eu conheci jovens capixabas que hoje estão estudando em São Paulo e que são, entre alguns dos melhores, os mais qualificados que eu já conheci. Obviamente, tem o viés aqui de amostra. São jovens que passaram e estão sendo apoiados pelo instituto. Nesse sentido são, sem sombra de dúvida, alguns dos melhores alunos das suas escolas, pessoas extremamente capazes, resilientes, que vêm de condições mais duras do ponto de vista socioeconômico. Esses estudantes conseguiram superar grandes desafios para estar onde estão.
Dentro dessa amostra, os jovens que eu conheci do Espírito Santo são pessoas, sem sombra de dúvida, fora da curva.
ES como ambiente para a Geração Z
O Espírito Santo tem um ecossistema empreendedor com políticas de atração de empresas e incentivo ao desenvolvimento de startups. Como essa característica local pode ser atrativa para os mais jovens no mercado de trabalho?
Eu vejo, sim, um mercado pujante, uma economia local bastante dinâmica. Nesse sentido, quanto mais conseguirmos, no Brasil, regionalizar e garantir que existem pólos econômicos dinâmicos, será cada vez melhor para os jovens que estão ingressando no mercado de trabalho.
Quanto menos um jovem precisar sair do seu estado natal para achar uma boa oportunidade de emprego, melhor. Então, todas essas iniciativas eu acho que são muito bem-vindas.
Quais os conselhos para os jovens capixabas da Geração Z que estão entrando no mercado de trabalho?
É super importante entender que, em primeiro lugar, a competição para arranjar um bom emprego nunca esteve tão difícil quanto está hoje. Qualquer jovem tem que se preparar muito do ponto de vista técnico para atingir aquele trabalho dos sonhos. Porque essa é a lei da vida: as pessoas vão melhorando, evoluindo. As faculdades vão melhorando a forma como preparam os jovens.
O acesso à informação permite que qualquer jovem, independente do lugar, consiga se preparar muito bem para um trabalho específico. Em primeiro lugar, é estudar, aprofundar-se nas diferentes carreiras e garantir preparo técnico.
O segundo ponto é aproveitar o fato de o mundo estar conectado para entender que dá para ir além. Outros lugares, outros países e procurar oportunidades no mundo inteiro. Isso joga a favor da Geração Z. Esse é um ativo que eles têm e que gerações anteriores não tinham. Encarar o mundo como um mar de possibilidades
O último ponto talvez seja esse autoconhecimento para os jovens. Para o jovem reconhecer que, muitas vezes, ele foi superprotegido na escola, no ambiente familiar, na vida. Acho que todos nós, na sociedade, estamos com essa proteção adicional. São evoluções da nossa sociedade, porém ao mesmo tempo nos tornam mais frágeis.
Eu acho que a Geração Z tem que se preparar para um mundo mais difícil do que os ambientes que enfrentou na faculdade, na escola e no ambiente familiar. Obviamente, isso não é para todo mundo. Tem gente que enfrentou situações muito difíceis ao longo da vida, não dá para generalizar.
Mudança de mercado
Pensando no futuro, como você acredita que a Geração Z vai mudar o mercado de trabalho nos próximos cinco a dez anos? Que transformações podemos esperar?
Eu acho que é uma geração que chega com muita criatividade e com capacidade de usar a tecnologia acima das gerações anteriores. Acho que muito do trabalho vai ser reinventado nos próximos 10 ou 20 anos e essa geração vai liderar essa reinvenção.
Sinto que é uma turma que vai desafiar muito as gerações anteriores, a minha inclusive, por conta dessa criatividade, dessa espontaneidade, de ser uma geração que nasceu conectada.
É uma geração que vai liderar e vai conseguir trazer para o mercado de trabalho as ferramentas de inteligência artificial de uma forma muito melhor e com muito mais profundidade.
Fico empolgado para ver o que essa geração vai trazer e curioso para construir junto com eles.