Economia

Renda fixa poderá ter retorno real negativo

O Brasil tem hoje cerca de R$ 6 trilhões em aplicações no mercado financeiro

Renda fixa poderá ter retorno real negativo Renda fixa poderá ter retorno real negativo Renda fixa poderá ter retorno real negativo Renda fixa poderá ter retorno real negativo
Foto: Divulgação

A queda de quarta-feira, 11, na taxa Selic, que passou a registrar novo piso histórico, amplia a penúria das aplicações de renda fixa – opção predileta do investidor brasileiro – e, segundo especialistas, deve estimular o investidor a buscar novas opções de aplicação. 

Com a nova revisão por parte do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom), que reduziu os juros básicos da economia para 4,5% ao ano, pelo menos 32% do total das aplicações brasileiras deverão, de agora em diante, perder para a inflação projetada para os próximos 12 meses.

Na prática, isso significa que aplicações tradicionais como a caderneta de poupança, os fundos de renda fixa atrelados à taxa DI, que acompanha de perto a taxa Selic (Fundos DI), e os títulos de Tesouro Direto indexados pela Selic (Tesouro Selic) não serão capazes de proteger o investimento do brasileiro da perdas inflacionárias projetadas para o IPCA – a inflação oficial, estimada em 3,60% desta quinta-feira, 12, até meados de dezembro do ano que vem, segundo o relatório Focus, do Banco Central.

No caso da poupança, quem depositar R$ 1 mil a partir desta quinta-feira, vai sacar daqui a um ano R$ 1.031,50. Corrigido pela inflação, esse montante passa a ser de R$ 994,37, o que tecnicamente é conhecido como retorno real negativo. Esses R$ 5,63 que ficaram pelo caminho foram, na realidade, corroídos pela inflação. 

O mesmo deverá acontecer com os fundos DI, mesmo para os fundos isentos de taxa de administração (há de três a quatro opções do tipo no mercado). Nesse caso, a perda é de R$ 1,99. Mas como boa parte desses fundos ainda cobra taxas consideradas salgadas até pelos próprios gestores de investimento, a perda nominal dessas aplicações pode chegar a R$ 18,09 em um ano, para os fundos com taxas de custódia de 2%.

Já no Tesouro Selic, que hoje concentra 33,8% dos saldo total dos recurso alocados no Tesouro Direto (R$ 59,2 bilhões), a perda acumulada do investimento com inflação após a nova alteração da Selic é de R$ R$ 3,32, sempre considerando como prazo de aplicação 12 meses. Os cálculos são do professor de economia da FGV e colunista do jornal O Estado de S. Paulo Fábio Gallo.

O Brasil tem hoje cerca de R$ 6 trilhões em aplicações no mercado financeiro (R$ 5,9 trilhões, para ser exato).

Estimativas do mercado, chanceladas pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), apontam que cerca de R$ 1 trilhão está alocado em fundos DI. A caderneta de poupança, segundo o Banco Central, tinha até esta quarta-feira um saldo total de R$ 836 bilhões e os títulos de Tesouro atrelados a Selic, segundo o Tesouro Nacional, mantinham R$ 19,98 bilhões.

Proteção x risco

Na opinião dos especialistas do mercado, o mergulho da renda fixa nessa nova fase de rentabilidade real negativa mais cedo ou mais tarde vai impulsionar a adesão do investidor por aplicações consideradas de maior risco, acrescentando ativos como títulos de dívida corporativas (letras de câmbio, debêntures e certificados de recebíveis) a um portfólio que historicamente é composto por produtos como poupança, CDB e fundos DI. “Não tem alternativa. O investidor precisa diversificar seu patrimônio”, conta o diretor de private banking do Bradesco, Augusto Miranda, responsável pela gestão das grandes fortunas do banco. Mas ele próprio reconhece que esse é um movimento ainda lento no Brasil. “A cultura de rentista ainda é muito enraizada. O investidor, mesmo o mais rico, está muito acostumado a fazer patrimônio, a ter lucro de 10% ao mês, em aplicações sem nenhum risco.” Ele conta que, entre os seus clientes, as recomendação são de, paulatinamente, reduzir o estoque de renda fixa e ampliar o de investimentos alternativos e de renda variável. “Fundos de multimercados, ações e fundos imobiliários precisam ser usados pelo investidor.”

Para Fábio Gallo, mesmo com retornos negativos, a renda fixa ainda cumpre seu papel, que é o de proteger a maior parte do poder de compra do brasileiro. “A renda fixa deve fazer parte da carteira para redução do risco”, diz ele. Já o planejador José Raymundo de Faria Júnior, da Planejar, reconhece que o brasileiro ainda não se atentou para o novo momento da economia. “As pessoas ainda não perceberam que estão perdendo dinheiro com recursos na caderneta de poupança ou em fundos DI. Na média, quem tem até R$ 1 mil em um fundo DI, paga uma taxa de administração de 1,93% ao ano. Quem tem de R$ 1 mil a R$ 25 mil, hoje, paga 1,1% de taxa por ano nesses produtos.”