No Brasil, como também amplamente aceito pelas mais variadas nações do planeta, a elevação da taxa de juros básicos – no caso brasileiro, a SELIC – é frequentemente defendida como mecanismo primordial para combater a inflação. No entanto, essa abordagem carece de uma análise mais aprofundada para países subdesenvolvidos, pois ignora peculiaridades estruturais dessas economias, como alto endividamento corporativo, baixa propensão à poupança e resiliência do crédito apesar dos juros altos. 

Nesse sentido, ao contrastar os principais dados sobre endividamento das empresas brasileiras, percebe-se que grande fatia das empresas ativas do país possui algum tipo de dívida em seu balanço. Grandes empresas operam com índices de alavancagem elevadíssimos, enquanto pequenas e médias empresas recorrem a dívidas bancárias ou subsidiadas para manutenção de suas operações. Agora, com a taxa SELIC em patamar mais alto desde 2006, 30% das empresas brasileiras estão inadimplentes com seus credores, e pedidos de recuperação judicial crescem de maneira desenfreada, atingindo o maior nível da série histórica. Para pequenas ou grandes empresas, a elevação da taxa de juros aumenta encargos financeiros, que, por sua vez são repassados ao consumidor final, se tornando um componente de custo direto para a cesta brasileira. Será que isso auxilia o combate à inflação?

A Ineficácia da Taxa de Juros

Analisando sobre um prisma distinto, o prisma da poupança, podemos enxergar a amplificação da ineficácia do aumento da taxa de juros para a contenção inflacionária. Atualmente, mais de dois terços da população brasileira não tem capacidade de poupança. Diferente de nações desenvolvidas, que possuem um alto nível de poupança, essa dinâmica é completamente distinta em economias como o Brasil. Assim, elevar a SELIC pode contrair a economia sem frear a demanda agregada de forma significativa, perpetuando um ciclo vicioso.

Por fim, deve-se analisar um terceiro e último aspecto para entender a eficácia deste instrumento, a ponta da tomada/concessão de crédito por parte de agentes econômicos. Nota-se que o volume de financiamentos e operações de crédito não diminuiu entre 2023 e 2025, apesar do movimento de sucessivas altas na SELIC. Dados do Banco Central mostram que o saldo de crédito cresceu 8,1% em 2023 (R$ 5,794 trilhões), 10,9% em 2024 (R$ 6,427 trilhões) e projeta-se 9,6% em 2025, mesmo com a SELIC subindo para 15% ao ano em 2025, o maior patamar desde 2006. Novas concessões aumentaram 15,3% em 2024. Isso ocorre porque, em países subdesenvolvidos, o crédito ou é necessário para sobrevivência imediata de pequenos e médios negócios, ou é impulsionado por necessidades estruturais, dessa forma, não responde linearmente aos juros, devido a spreads bancários elevados, demanda reprimida com necessidade de acesso imediato e movimentos subsidiados por bancos estatais e programas governamentais.

Como uma taxa de juros que não reduz consumo por aumento de poupança, não reduz consumo/investimentos por limitação de acesso a crédito e, por sua vez, compõe um indicador de custo para a maioria das empresas do país pode funcionar como mecanismo de controle inflacionário direto? Essa falácia é consequência da aplicação mecânica de modelos neoclássicos, que assumem mercados eficientes e respostas elásticas padronizadas. Em realidades como a brasileira, juros altos exacerbam desigualdades, inibem investimentos produtivos e alimentam inflação inercial via custos. Ferramentas acessórias à taxa de juros devem ser utilizadas em conjunto para uma contenção correta da inflação de preços, com ajuste fiscal equilibrado e uma política monetária integrada e inteligente, tendem a ser mais eficazes do que puramente um “juro punitivo” para a economia e para a sociedade brasileira.

Lucas Pessanha Richa

Colunista

Grupo Comprocard. Associado do Instituto Líderes do Amanhã.

Grupo Comprocard. Associado do Instituto Líderes do Amanhã.