Ar-condicionado nas salas de aula

Escolas estão preparadas para o verão? Calor atrapalha aprendizado, alertam especialistas

No Estado, alunos e professores ainda enfrentam salas sem ar-condicionado. Sedu quer 75% das unidades climatizadas até dezembro

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Sala de aula com ar-condicionado
Estudantes em sala de aula com ar-condicionado. Foto: Reprodução TV Vitória

Com a chegada do verão, um velho desafio volta à rotina de milhares de estudantes capixabas: o calor dentro da sala de aula. Em um estado de clima predominantemente quente, não é raro encontrar alunos e professores tentando se concentrar em meio a ventiladores barulhentos e janelas que pouco aliviam a sensação térmica.

Os efeitos desse cenário vão além do desconforto. Especialistas em educação e saúde destacam que a alta temperatura prejudica a concentração, aumenta a sonolência, causa irritabilidade e pode até provocar problemas de saúde.

Nesse contexto, a climatização das escolas ganha força como política pública para garantir um ambiente mais adequado ao aprendizado.

Hoje, mais de 120 mil alunos da rede estadual já estudam em salas climatizadas. Mas, apesar do avanço, a realidade ainda é desigual: enquanto algumas unidades se transformaram com a chegada do ar-condicionado, outras continuam enfrentando as dificuldades do calor excessivo.

Histórias de quem viveu o antes e o depois

Estudante Bianca Verício
Estudante Bianca Verício. Foto: Reprodução TV Vitória

A estudante Bianca Verício sabe bem a diferença que a climatização faz. Durante o ensino fundamental, ela frequentava salas sem ar-condicionado, onde estudar era um desafio.

O ambiente era muito desagradável, eram muitas crianças agitadas e isso impactava de forma negativa na aprendizagem”.

Estudante Bianca Verício

Hoje matriculada na Escola Estadual Marinete de Souza Lira, em Feu Rosa, Serra, Bianca descreve uma realidade oposta: “Agora é outra coisa. O colégio conta com climatização completa e isso melhorou muito a questão da aprendizagem. Não é questão de luxo, é questão de dignidade. Em um país como o Brasil, é necessidade”.

A mãe dela, Flávia Cristina, confirma que os dias mais quentes eram uma provação.

“No ensino fundamental, a Bianca chegava em casa empolada por causa do calorão. Era desconfortável, principalmente nas aulas de educação física. Hoje é diferente. Não tem coisa melhor do que o aluno ter prazer em estar dentro do ambiente escolar”, relata.

Flávia, mãe da estudante Bianca Verício
Flávia Cristina, mãe da estudante Bianca Verício: “Era desconfortável”. Foto: Reprodução TV Vitória

Flávia também acompanha a realidade de outros filhos que ainda estudam em escolas sem climatização. “A Lorrayne, de 13 anos, sempre reclama. Uma hora o ventilador funciona, outra hora não funciona. O Samuelzinho, que está no CMEI, também não tem a mesma infraestrutura. A diferença é enorme”, diz.

Krysthian Nascimento, aluno de uma escola estadual em Vila Garrido, Vila Velha, é mais um que convive diariamente com o calor durante o seu período escolar. “Por aqui, as salas têm apenas ventiladores. Não vou falar que não dá para estudar, mas dificulta um pouco”, resume.

Como o calor interfere no corpo e na mente

O impacto das altas temperaturas vai muito além do desconforto imediato. A pediatra Gabriela Brandão explica que o excesso de calor provoca suor, sonolência, dores de cabeça e desidratação, fatores que reduzem concentração e memória.

Pediatra Gabriela Brandão
Pediatra Gabriel Brandão pontua os problemas do excesso de calor. Foto: Divulgação/acervo pessoal

Mesmo uma desidratação leve já traz prejuízo para a memória, velocidade de processamento e humor. As crianças ficam mais impacientes e isso afeta o aprendizado de forma geral.”

Pediatra Gabriela Brandão

Ela lembra que o calor eleva a frequência cardíaca e respiratória, deixando os alunos mais cansados mesmo em repouso. “Não se trata de luxo, mas de uma necessidade fisiológica. Ambientes ventilados e com temperatura agradável favorecem diretamente o aprendizado”, reforça.

Para o especialista em educação Fábio Amorim, a questão também envolve a permanência do aluno na escola.

“Um ambiente quente aumenta a infrequência. O estudante falta mais e, quando está presente, se concentra menos. Estudos comprovam que escolas climatizadas apresentam rendimento muito melhor do que as que não têm climatização”, aponta.

Fábio Amorim, especialista em educação
Fábio Amorim é especialista em educação. Foto: Reprodução TV Vitória

Segundo ele, a qualidade de vida de professores também melhora.

Há casos de docentes e alunos passando mal em sala, por causa do calor. Em ambientes climatizados, a ocorrência é muito menor. O bem-estar é condição essencial para ensinar e aprender.”

Fábio Amorim, especialista em educação

Projeções climáticas e o desafio para a educação

O problema do calorão tende a se agravar nos próximos anos. Relatório da Organização Meteorológica Mundial prevê que a temperatura média anual global nos próximos cinco anos será entre 1,1°C e 1,8°C maior do que a média observada na era pré-industrial (1850 a 1900).

Sala de aula com ventilador
Sala de aula com ventilador. Foto: Reprodução TV Vitória

No Espírito Santo, os verões já dão sinais dessa escalada. O meteorologista Hugo Ramos, do Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper), explica que, mesmo com variações entre um ano e outro, o padrão é de verões cada vez mais quentes.

Janeiro e fevereiro são os meses mais críticos. Temos ondas de calor, veranicos e dias prolongados de sol forte. Isso pressiona ainda mais o ambiente escolar”.

Hugo Ramos, meteorologista

Ele lembra que, embora o verão de 2026 possa não repetir os extremos de 2024, a tendência é de aumento gradual das temperaturas. “Com mais horas de exposição solar, as salas de aula precisam estar preparadas para suportar esse cenário”, afirma.

Hugo Ramos, meteorologista
Hugo Ramos, meteorologista, afirma que escolas precisam estar preparadas. Foto: Reprodução TV Vitória

Avanços e promessas de climatização

Na rede estadual, 200 escolas já foram climatizadas, somando mais de 2.200 salas e beneficiando 120 mil alunos.

Segundo a Secretaria de Estado da Educação (Sedu), o investimento passa de R$ 79 milhões e a meta é chegar a 75% das unidades climatizadas até dezembro deste ano.

O secretário de Educação, Vitor de Angelo, destaca que a climatização tem impacto direto no aprendizado.

Uma sala climatizada ajuda a ensinar melhor e aprender mais, porque as condições são favoráveis. O comportamento dos estudantes muda, a concentração aumenta e o trabalho do professor é favorecido.”

Vitor de Angelo, secretário de Educação

Ele lembra que, até poucos anos atrás, sequer se falava em climatizar escolas públicas. “Quando assumi a secretaria, não havia projetos nesse sentido. Hoje, quase 60% da rede já está climatizada. É uma conquista recente, mas muito significativa”, diz.

Secretário de Estado da Educação, Vitor de Angelo
Vitor de Angelo é secretário de Estado da Educação. Foto: Reprodução TV Vitória

A prioridade, segundo a Sedu, é atender regiões historicamente mais quentes, como Noroeste, Sul e Litoral Norte. A escolha das escolas segue critérios técnicos, como a adequação elétrica e chamados registrados no sistema de manutenção.

A realidade nos municípios da Grande Vitória

Entre as prefeituras, o ritmo de climatização é desigual. Em Vitória, o número de unidades climatizadas saltou de 9, em 2021, para 43, em 2025, com outras 44 em processo de obras ou licitação. A meta é chegar a 100% até 2028.

Na Serra, quase toda a rede já conta com ar-condicionado. Das 148 unidades, 147 têm equipamentos instalados. A única restante aguarda a conclusão da reforma elétrica. Mais de 70 mil estudantes já estudam em ambientes climatizados.

Em Cariacica, todas as escolas possuem ventilação adequada, segundo a prefeitura, mas a climatização de 100% da rede está prevista para os próximos quatro anos. O município possui 170 prédios, que precisarão passar por adequações físicas e elétricas.

A Prefeitura de Vila Velha não deu um prazo para climatização total das escolas, mas informou que lançou pregões para climatizar todas as 118 unidades de ensino, o que beneficiará cerca de 57 mil alunos da educação infantil, ensino fundamental e EJA.

Ar-condicionado é essencial, não é luxo

Para especialistas, famílias e alunos, a climatização escolar deixou de ser um diferencial e passou a ser entendida como requisito básico. A fala da estudante Bianca sintetiza essa percepção: “Não é luxo, é dignidade”.

O secretário Vitor de Angelo concorda: “Hoje, ar-condicionado já é visto como parte da estrutura essencial, ao lado de cadeira e mesa. É um direito dos estudantes, porque representa condições mínimas para que possam aprender”.

Breno Ribeiro

Reporter

Jornalista há 9 anos, formado pelo Centro Universitário Faesa, com especializações em Marketing, Administração de Empresas e Gestão de Vendas.

Jornalista há 9 anos, formado pelo Centro Universitário Faesa, com especializações em Marketing, Administração de Empresas e Gestão de Vendas.