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Obras de Paulo Emilio saem pela Companhia das Letras

Redação Folha Vitória

São Paulo - Nesta quarta-feira, 16, às 19h, na Cinemateca Brasileira, tem lugar o lançamento dos livros O Cinema no Século e Três Mulheres de Três PPPês, de Paulo Emilio Sales Gomes. Haverá apresentação de filmes (curtas dos Irmãos Lumière e Georges Méliès e mais La Petite Marchande d'Allumettes, de Jean Renoir), seguida de mesa de debate com os professores José Pasta e Carlos Augusto Calil. Os artigos de Paulo Emilio saem agora por sua nova casa editorial, a Companhia das Letras.

Não se trata de mera reimpressão. A edição de textos e notas de O Cinema no Século devem-se a Calil e Adilson Mendes. A organização e o prefácio são de Calil. O posfácio é assinado pelo francês Bernard Eisenschitz. No caso de Três Mulheres de Três PPPês, incursão única de Paulo Emilio na ficção (se excetuarmos o romance inconcluso Cemitério), a nova edição vem enriquecida pelo luminoso estudo de José Pasta, Pensamento e Ficção em Paulo Emílio.

Trata-se, portanto, de renovar o interesse pela obra de Paulo Emilio Sales Gomes (1916-1977) e quiçá apresentá-lo às novas gerações como caso ímpar de trajetória intelectual no Brasil. A vida de Paulo Emilio daria um romance. Em poucas linhas: jovem militante de esquerda, foi detido e encerrado no Presídio do Paraíso, de onde escapou para o exílio na Europa. Na França, veio a se interessar pelo cinema e tornou-se amigo de Henri Langlois (fundador da Cinemateca Francesa) e de André Bazin (criador dos Cahiers du Cinéma).

De volta ao Brasil, fundou com amigos como Antonio Candido, Ruy Coelho e Décio de Almeida Prado a revista Clima, embrião do Suplemento Literário do Estado de S. Paulo, este um marco do jornalismo cultural do País. Nessas trincheiras - em especial no Suplemento Literário -, Paulo Emilio desenvolveu sua meditação profunda, constante e influente sobre o cinema.

A antologia apresentada por Calil dá conta dessa trajetória. Dos 83 textos selecionados, nada menos que 72 foram publicados no jornal O Estado de S.Paulo - e um no Jornal da Tarde. Mas há escritos provenientes de outros veículos, inclusive o que dá título ao volume, publicado no Jornal do Brasil em 1970. No Jornal da Tarde, vem o mais recente, O Tio Oscar, de 1973. E os mais antigos, de 1941, são da revista Clima - dois sobre John Ford (The Long Voyage Home e Tobacco Road), um sobre Walt Disney (Contra Fantasia) e outro sobre Orson Welles (Citizen Kane).

Na nova edição, os textos estão dispostos em blocos temáticos, opção facilitada pelo fato de Paulo Emilio ter escrito várias vezes sobre o mesmo autor, e às vezes sobre o mesmo filme. Há nele como um projeto pedagógico de "apresentar" ao público diretores como, por exemplo, Sergei Eisenstein ou Orson Welles, objetos de vários artigos - seis dedicados ao diretor soviético, 12 ao norte-americano. Mas Paulo Emilio escreve também sobre Fellini, Rossellini, De Sica, Stroheim, Renoir, René Clair, sobre o cinema francês, alemão e japonês. Dedica nada menos que seis artigos a um único filme, Hiroshima Meu Amor, de Alain Resnais.

Serve a antologia como testemunho de um tipo de jornalismo cultural então praticado, e que o tempo levou. São textos de circunstância, e que se referem a um lançamento, a alguma retrospectiva ou à presença de alguma personalidade do cinema na cidade. São didáticos, profundos e sem concessões, vazados em prosa límpida e pessoal. Ainda causa pasmo lembrar que esse tipo de material era publicado regularmente (e não como exceção) em veículo de grande circulação. E, mais ainda, consta que era muito apreciado pelo público leitor.

Esses textos, que unem leveza, profundidade e erudição em doses certas, são escritos em primeira pessoa, como devem ser os exercícios de estilo. "Paulo Emilio narrava-se nos seus artigos", escreve Calil no prefácio. E, por se narrar através do cinema, talvez tenha sido inevitável a tentação de se narrar pela ficção. Daí a escrita tardia de Três Mulheres de Três PPPês, publicado pouco antes de sua morte. Há certo anedotário a respeito, alimentado pelo próprio Paulo Emilio. Casado com a escritora Lygia Fagundes Telles, teria experimentado a ficção numa das férias do casal em Águas de São Pedro. "Por que você não me avisou antes que era tão gostoso escrever ficção?", teria, amorosamente, ralhado com a esposa.

Desse modo, criou-se a lenda de que a escrita de ficção teria sido mero divertissement, um descanso do guerreiro de suas lides de ensaísta, quase um entretenimento descompromissado. Mito que se encarrega de desmentir José Pasta em seu brilhante artigo.

Analisando as três novelas que compõem o volume, Pasta conclui que a escrita de ficção permitiu a Paulo Emilio trabalhar questões fundamentais, que vinha examinando em seu trabalho ensaístico. Entre as quais, os sintomas de degradação da vida cultural brasileira, cujo ápice, que hoje experimentamos, ele podia intuir e sondar através do texto de ficção. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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