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Bergman, 100 anos

Redação Folha Vitória

Em Cannes Classics, em maio, Jane Magnusson apresentou seu documentário sobre Ingmar Bergman - Um Ano em Uma Vida. O ano era 1957, quando o jovem Bergman, aos 33 anos, já tinha seis filhos. Uma imagem de época, no set de Morangos Silvestres, o mostra em sua plenitude. O sr. Testosterona. Talvez isso hoje fosse motivo de escândalo, quem sabe de denúncia. Mas era a libertária Suécia dos anos 1950 e Bergman já fizera o filme que 'despertou' a cabeça de Jean-Luc Godard, Monika e o Desejo. Uma mulher grávida, outra amamentando e uma terceira com seu bebê engatinhando. Três filmes, e dois dos maiores, O Sétimo Selo e Morangos Silvestres. Três ou quatro montagens consideradas definitivas, incluindo a de O Misantropo, de Molière.

Existem nomes de família que identificam figuras icônicas de diferentes épocas. Molière, Racine, Shakespeare. O cinema também tem dessas figuras, e Bergman é uma delas. (Federico) Fellini é outra. Ambos viraram adjetivos. Bergmaniano, felliniano. Um grave, soturno, o outro, feérico. Completam-se neste sábado, 14, os 100 anos de Bergman. Upsala, 1914.

Bergman morreu em 30 de julho de 2007, daqui a alguns dias serão 11 anos.

Deixou um grande legado artístico. O homem que amava as mulheres - mas não as entendia. Bergman, fez, nos 50, grandes filmes que investigavam o universo masculino. O ano de 1957 foi emblemático. Em O Sétimo Selo e Morangos espelhou suas dúvidas religiosas, e não apenas. No começo dos 60, criou sua trilogia sobre o silêncio de Deus - Através de Um Espelho, Luz de Inverno e O Silêncio. Em 1963, fez um filme de título revelador - Para Não Falar de Todas Essas Mulheres. E passou o restante da década, e boa parte dos 70, dos 80, falando delas - as mulheres.

Que mistério poderiam representar as mulheres para um homem que se casou tantas vezes e nunca teve litígios com suas ex? Em busca de respostas, e também para homenagear o grande artista - um dos maiores do cinema -, o jornal O Estado de S. Paulo entrevistou duas diretoras que lançam filmes sobre Bergman, no dia 14. Rebatizado como Bergman - 100 Anos, Um Ano em Uma Vida estreia nos cinemas. O outro, Ingmar Bergman - Por Trás da Máscara, de Manuelle Blanc, na TV, no canal Curta!

Numa entrevista por telefone, Jane Magnusson contou como tentou se aproximar de Bergman. "Eu treinava a equipe sueca de nado sincronizado. O ano era 1985, Bergman era um dos suecos mais conhecidos no mundo. Criei uma coreografia em sua homenagem e, ao descobrir que sua casa em Faro tinha piscina, liguei para perguntar se poderíamos levar nossa homenagem para ele. Demorou, mas um dia ligou uma assessora. 'O sr. Bergman agradece, mas na piscina dele, só Bergman nada.'"

Apesar da recusa, criou-se um canal e Jane conversou algumas vezes com Bergman, chegou a entrevistá-lo. "Quando ele morreu, todo o seu material foi revisado e catalogado, menos os vídeos. Quando me propuseram o documentário, fui aos vídeos e encontrei coisas interessantíssimas, que estão no filme." Tão interessantes que Jane reuniu cerca de 400 horas.

"Era muito material, mas quanto mais eu revisava me parecia que o ano de 1957 fora decisivo. Só que precisava contextualizar, chegar até ele. E, depois, mostrar o que havia acontecido depois." É o choque do filme - Bergman revelou o que podia haver de monstruoso nas pessoas, Jane revela o monstro em que ele se transformou, no fim da vida. "Não foi para desmistificar, mas para mostrar que era humano."

Manuelle Blanc foi por outro caminho. "Havia feito alguns documentários mapeando a contribuição das mulheres nas artes, pintoras, fotógrafas." O pedido para fazer um documentário foi uma surpresa para ela. "Havia visto Persona/Quando Duas Mulheres Pecam, mas, ao pesquisar, descobri que havia um gap e que ele passou três anos sem filmar, entre 1963 e 66, quando fez Persona. Bergman esteve doente nesse período. Teve tempo de pensar sua vida, e o cinema. A psicanálise contribuiu muito. Sven Nykvist se tornara seu diretor de fotografia, substituindo Gunnar Fischer, que era um gênio, mas com Sven tudo mudou. O fotógrafo chamou-o para ousar. Bergman fez seu filme mais experimental, e o mais popular. O mais psicológico e o mais cinematográfico. Um filme de contrastes - duas mulheres, a paciente que se isola e a enfermeira. Classes sociais distintas, erotismo. As duas mulheres, Liv Ullman e Bibi Andersson, são metades do próprio Bergman, e quando ele funde as duas numa só imagem, um só rosto, é como se tivesse decifrado a si mesmo, como o professor Borg no final de Morangos." Bergman vacilava quanto ao título, "Pensou em chamá-lo Cinematographia, porque ninguém poderia negar que é cinema. Optou por Persona, a palavra que designa as máscaras no teatro. Aproveitei para revelar o próprio Bergman, por trás de sua máscara."

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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