O Espírito Santo voltado para o mar. Pelo menos na geografia, porque na economia, falta muito para aproveitar as oportunidades que as atividades náuticas podem oferecer. O Estado tem pouco mais de 22 mil embarcações registradas segundo dados da Marinha. Não há dados consolidados do Brasil, mas a estimativa é de que temos mais ou menos 1 milhão e 100 mil embarcações no país. Em Minas, são 35 mil. Ou seja, temos um estado voltado para o mar, com 400 Km de litoral, e o nosso vizinho, sem acesso ao oceano, tem mais barcos.
Ter mais embarcações significa girar mais a economia. Como, por exemplo, com o fortalecimento do turismo, esportes e toda a atividade econômica que gira em torno desse movimento. É prestação de serviço, manutenção, compra, venda. Nesse sentido, o Iate Clube do Espírito Santo é uma das instituições com maior peso no setor.
A entidade completa 79 anos de idade e é referência no Estado quando se fala de embarcações de esporte e lazer. O Iate Clube abriga hoje pouco mais de 450 barcos. E o comodoro Fabiano Alves Pereira trabalha para ampliar a atuação do clube.
Ele é advogado e está no segundo mandato. Para Fabiano, o Iate Clube é a rodoviária do mar. Toda embarcação que sai do Sul do Brasil e segue para o Nordeste obrigatoriamente para no Espírito Santo para abastecimento.
Veja abaixo a entrevista completa com Fabiano Alves Pereira, comodoro do Iate Clube do Espírito Santo:
Como o Iate Clube atua no suporte a outras embarcações que passam por aqui?
Nós temos uma parceria com todas as entidades náuticas do Brasil inteiro. Qual é a nossa preocupação? Então, todas as embarcações que transitam do Sul para o Nordeste ou no sentido contrário, param para abastecimento de água e de combustível aqui. Opercurso é muito longo. E isso traz insegurança náutica.
A gente recebe veleiros, embarcações de pesca e outros tipos. Inclusive, o turismo internacional passa por aqui. A gente tem alguns barcos de fora parando por aqui. O Espírito Santo tem uma posição central e nesse sentido, facilita bastante.
Por que o ES recebe muitos barcos pesqueiros?
Tem um fator geográfico importante. O “banco” é onde a gente costuma ter o melhor ponto de pesca. O nosso percurso, a partir daqui de Vitória, é o menor que tem. São 40 milhas a menos.
É o Banco de Vitória, onde você vem tem uma linha d’água e aí começa uma descida brusca. É onde eu tenho o melhor ponto de pesca, seja para marlin branco, marlin azul, ou swordfish, que são os peixes mais nobres da pesca. Quem sai do Rio de Janeiro, por exemplo, precisa percorrer a partir de 80 milhas náuticas. É muito longe. O custo operacional eleva muito.
Vitória é abençoada pelo clima, água gostosa, temperatura agradável, localização geográfica muito importante para pesca e para o turismo.
E o Iate Clube tem espaço para receber essas embarcações que vêm de fora?
Sim, nós estamos fazendo pequenas adequações. A ideia é que a gente consiga aumentar em torno de 150 vagas até novembro, fazendo realocações internas dentro do próprio clube. Até para atracar ou estacionar uma embarcação ao lado da outra, a gente faz a medição e a comparação.
O Iate tem planos para aumentar as vagas?
Não, na verdade, a gente não tem essa preocupação. Trabalhamos como valuation, fazendo o equilíbrio financeiro e equacionando as necessidades do clube. Hoje, o clube não visa lucro. A gente pisa no freio, solta e equaciona. Do mesmo modo a gente não tem essa intenção de elitizar. Pelo contrário, a gente quer pluralizar o clube.
Como você vê o potencial econômico da atividade náutica do Estado?
Vitória tem um grande potencial de turismo, que é pouco explorado. Os municípios vizinhos, Vitória, Vila Velha, Guarapari, também não exploram isso. Vemos que na alta temporada, de setembro a março, o número de embarcações em Vitória aumenta muito, inclusive de outros países.
Faltam pontos de atracação para movimentar o turismo. Seja na região da Ilha das Caieiras, na região da nova orla de Cariacica, que foi urbanizada e não pensaram no turismo náutico.
Há grandes perdas porque hoje, o turismo náutico é pouco frequentado pelos capixabas. Por exemplo, nós estamos na época das visitas às baleias e poucas embarcações oferecem serviço de visita. É um passeio incrível, muito bonito e pertinho aqui a menos de 20 milhas.
Qual é o papel do Iate Clube para o desenvolvimento desse turismo?
Nós tentamos hoje interagir com o município e com os órgãos de fiscalização para conscientizar sobre a importância do turismo. O Iate Clube, por exemplo, fez um evento em janeiro e trouxe 300 atletas. Vieram eles com as famílias. Foram 900 pessoas cadastradas dentro do Iate Clube, do Brasil inteiro e de fora, dos Estados Unidos e Argentina.
Do mesmo modo nós movimentamos a parte de hotelaria, visita ao Convento da Penha, Santa Tereza, Domingos Martins, aos polos gastronômicos. A gente sempre trabalha movimentando a cultura, o esporte, o lazer. Nós estamos influenciando diretamente no Estado.
O Iate Clube agora está com um projeto, que já está em fase de andamento, junto com a Prefeitura de Vitória, para trazer o primeiro Campeonato Brasileiro Jet-Ski. Ou seja, nós vamos fazer um enduro de jet-ski em Vitória, volta à ilha, visitando outros municípios.
A gente tem a ideia de voltar com a regata de Vitória à Ilha de Trindade, que é um percurso muito longo e precisamos do apoio da Capitania dos Portos e da Marinha. Tentamos movimentar, cultivar o esporte de diversas formas, em diversas áreas.
Por que você acha que esse é o momento para pensar o turismo do ES?
A gente precisa incentivar o acesso ao turismo náutico, porque empresas já existem. Porém elas têm dificuldade. Muitas pessoas fazem o charter, que é receber pessoas de outro estado, grupo de cinco pessoas, para fazer a pesca competitiva do marlim ou mesmo a pesca comum.
Algumas empresas fornecem saídas de lancha para passeio com a família. Isso já acontece, mas precisamos de um olhar mais atencioso do setor público. Precisamos de pontos de atracação.
Qual é o tipo de embarcação preferida do capixaba?
Depende. Eu dividiria em quatro partes. Tem as pessoas que preferem a moto aquática, que são aquelas que gostam de moto, mas têm receio de se machucar na estrada. E na água tem menos risco. Tem as pessoas que optam mais pelas embarcações para a família, que só saem para curtir o momento, fazer o seu churrasquinho, seu almoço e retornar.
Você tem as embarcações de pesca, para quem gosta do esporte náutico de pesca. E você tem os veleiros, que são os admiradores do vento, do tempo e do mar, que é o mais gostoso. Você entra numa embarcação à vela, curte o momento, mais devagarinho, para curtir mesmo. O capixaba está inserido em todos esses contextos.
Como é a relação do Iate Clube com o poder público?
Hoje a gente tem uma boa comunicação com a prefeitura de Vitória. A gente participou do início do projeto deles para a reformulação da Orla de São Pedro. Estamos para fazer um encontro náutico lá agora para valorizar. Fizemos um campeonato de vela porque lá é o melhor lugar para velejadores.
Estamos no projeto do Canal de Camburi, que precisa ser revitalizado para facilitar o polo gastronômico da Praia do Canto com uma outra visão. E a gente pleiteia a reformulação do cais dos pescadores ao lado da Capitania, na Enseada do Suá. Seria um outro polo de atracação muito importante.
Assim, temos uma boa relação e acho que o poder público tem olhado com carinho para a gente. E precisamos de mais pontos de atracação espalhados pela Grande Vitória.
E como isso impacta o turismo náutico?
Hoje a embarcação sai do Iate Clube, vai para o final de Camburi ou para a Curva da Jurema. Com mais pontos, começamos a ter mais alternativas. Ilha das Caeiras, Avenida Beira-Mar, Canal de Camburi. Então você começa a fazer a economia desses locais girar, porque junto com isso vem o turismo, a gastronomia, o incentivo ao comércio.
Tem espaço para marinas públicas ou privadas no ES?
Tem muito para marinas e elas são importantes. Eu visito o litoral, costumo participar de eventos. Serra tem potencial. Vila Velha tem potencial, Guarapari tem potencial. A gente só precisa mesmo é que o poder público abrace a causa e comece com uma estrutura mínima.
Por exemplo, Guarapari tem a Praia do Morro, Jacaraípe tem perto da ponte de Jacaraípe. Em Vila Velha, a gente pensa naquela área perto da “Ilha da Xuxa”, que é uma área mais abrigada, que tem um polo gastronômico pequenininho, mas já é gostoso ter um atracador ali.
Quais são as maiores dificuldades?
Hoje, a barreira quase que intransponível é a Secretaria do Patrimônio da União (SPU). É a maior dificuldade que a gente tem hoje.
Ela faz a cobrança do uso de espelho d’água e da área de terra até 200 metros da preamar. Ou seja, isso onera muito e tira o incentivo do esporte náutico.
A segunda barreira que fica muito difícil às vezes é a questão ambiental, porque temos a negativa porém a SPU não diz o motivo ou qual seria a medida educativa que poderia ser feita dentro daquelas regras. E então temos contradições.
Balneário Camboriú alterou toda a orla marítima, fez preamar de segurança e não teve tanto problema com a parte ambiental. Se lá pode, quais são as adequações que foram feitas que a gente poderia implementar aqui? A gente se questiona desse ponto de vista.
Como é a preocupação ambiental do Clube no dia a dia?
Hoje a gente trabalha em vários setores. No setor energético, fazemos compra de energia limpa para evitar a energia poluente. Fazemos reuso de água, já estamos dessalinizando a água dentro do Iate Clube, com esse projeto em andamento e funcionando.
Também temos um trabalho de conscientização das embarcações sobre uso de filtros não poluentes e incentivamos a educação social dos nossos associados para limpeza das praias, para recolher os lixos, trazer os lixos de volta. Fazemos também a coleta seletiva. Queremos fazer o Iate Clube olhar mais para fora, ao mesmo tempo que sabemos da importância de abrir as portas para a comunidade.