Entrevista de Domingo

Paulo Baraona: "Existe um modelo logístico viável para o ES e o Brasil"

Paulo Baraona: “Existe um modelo logístico viável para o ES e o Brasil” Paulo Baraona: “Existe um modelo logístico viável para o ES e o Brasil” Paulo Baraona: “Existe um modelo logístico viável para o ES e o Brasil” Paulo Baraona: “Existe um modelo logístico viável para o ES e o Brasil”
Paulo Baraona acredita que a discussão sobre logística que acontece no ES pode ser decisiva para o futuro do setor no país. Crédito: Reprodução de TV
Paulo Baraona acredita que a discussão sobre logística que acontece no ES pode ser decisiva para o futuro do setor no país. Crédito: Reprodução de TV

A produção industrial física do ES teve um crescimento de 2,6% em março, impulsionada principalmente pela indústria extrativa e de transformação, com destaque também para a metalurgia. Isso tudo conforme dados do Observatório da Indústria da Findes

E com números tão importantes, é preciso aproveitar ao máximo as oportunidades. E só com uma logística funcional e competitiva isso é possível. A gente vê veículos importados chegando, portos se movimentando e empresas projetando ótimos cenários. E esse é um mercado que deve gerar, só neste ano no Espírito Santo, R$ 50 bilhões.

Será que podemos mais? Será que aproveitamos ao máximo o momento? E para onde caminha a logística capixaba? São perguntas que o presidente da Findes, Paulo Baraona, tenta desvendar. Para isso, ele aposta em conexões e cita o Fórum InfraLeste que acontece nesta semana, no dia 11, em Vitória. Agentes públicos e privados vão discutir soluções práticas para destravar modais e planejar investimentos.

Veja abaixo a entrevista com Paulo Baraona:

O que falta para as empresas do ES aproveitarem o momento logístico?

Eu acho que nós temos bons desafios. Digo “bons” porque estamos falando de grandes investimentos e da indústria, setor onde mais de 70% da inovação e tecnologia acontecem. É também o setor com os empregos mais bem remunerados e que geram novos desafios para a mão de obra. Novos empregos estão surgindo exatamente por causa da inovação e das novas tecnologias.

O Senai, nossa instituição de capacitação, tem enfrentado o desafio de visitar empresas do ES para entender as necessidades específicas de cada uma, em vez de oferecer cursos de prateleira. Assim, conseguimos ser pontuais e ajudar a suprir a falta de mão de obra. 

E há uma pesquisa recente que mostra que 9 em cada 10 estudantes do Senai estão empregados. Isso é impressionante e nos enche de orgulho. Esses números mostram que nossos cursos são, de fato bons, qualificados e reconhecidos pelas empresas.

Que balanço você faz do primeiro semestre e o que esperar para o restante do ano?

Permita-me puxar um pouco mais para trás. Infraestrutura sempre foi pauta da Federação no ES e, na minha gestão, tenho dinamizado ainda mais esse tema. Temos hoje um complexo portuário invejável no Brasil, além de grandes investimentos como aeroportos regionais. Porém ainda faltam ferrovias e boas rodovias. Nossas BRs, 101 e 262, por exemplo, são problemas críticos.

A BR-101 deve estar resolvida, com a continuidade do contrato da Eco101. Foi uma decisão acertada do TCU e do Governo Federal em conjunto com o Estado. Já a BR-262 deve receber R$ 2,3 bilhões dos recursos de Mariana. O projeto já está pronto, e isso é um avanço importante.

Quanto a ferrovias, o Brasil fez uma escolha equivocada há mais de 60 anos em priorizar rodovias. Agora estamos lançando, no dia 11 de junho, um fórum com participação de cinco federações (Rio, Minas, Bahia, Goiás e Espírito Santo) e representantes dos Ministérios de Transportes, Portos e Aeroportos, ANTT, ANTAQ e Infra S.A. O objetivo é discutir a integração logística regional e encontrar soluções viáveis para destravar esse gargalo.

Como tirar essa discussão do papel? Como transformar o discurso em prática?

A chave é estruturar um projeto objetivamente viável, com base em dados concretos. Estamos falando de investimentos públicos e privados, com foco no médio e longo prazo. Uma ferrovia, por exemplo, não se constroi em cinco anos. Ou seja, estamos falando de 20 anos.

O Observatório da Findes tem produzido dados e já estamos conversando também com Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Comprovada a viabilidade econômica, levaremos essa proposta a Brasília. O Porto de Santos, por exemplo, está esgotado na época da safra, com quilômetros de caminhões parados. 

Precisamos de soluções para o Brasil e não apenas para o Espírito Santo.

Existe chance real de o ES se tornar um corredor logístico continental? A ferrovia oceano a oceano, que ligaria o Brasil ao Chile, é viável?

Pode, sim. Quando se fala de exportação, é mão dupla, ou seja, exportar e importar. Porém  essa discussão precisa ser puxada pelo setor empresarial, porque é ele quem analisa a viabilidade econômica. O projeto tem que ser sustentável a longo prazo.

A ideia de unir estados com portos e outros modais, com produção e carga, é mostrar ao governo federal que existe um modelo logístico viável para o ES e o Brasil. Não estamos discutindo apenas o Espírito Santo, estamos discutindo uma solução nacional. No entanto, é claro que também precisamos olhar para o nosso Estado, que será fortemente afetado pela reforma tributária. 

Com a estrutura portuária atual, já podemos pensar de forma mais estratégica.

Qual é a proposta principal do Fórum InfraLeste?

O fórum será no dia 11 de junho, às 14 horas. Teremos representantes do governo federal, de diversas instituições e cinco federações industriais. A ideia é replicar o debate em outros estados e pensar o Brasil de forma integrada. Conexão e sinergia são palavras-chave.

Como você avalia o impacto do ParkLogBR/ES na geração de riqueza?

Foi uma iniciativa muito importante. Há grandes investimentos sendo feitos. Na região de Aracruz, por exemplo, temos três portos: Portocel (multi cargas), Imetame e Barra do Riacho, além de uma ZPE. São investimentos atrativos que geram outros investimentos. 

Há, inclusive, discussões para um ParkLogBR/ES no Sul do Estado. Porém, para isso ter sinergia com o restante do Brasil, precisamos conectar tudo via infraestrutura ferroviária. Essa conexão será central no fórum.

Qual a importância da “conexão” nesse momento?

Total. Precisamos unir os estados com seus interesses próprios em torno de uma “artéria principal”. Depois, cada estado pode desenvolver seus ramais. No entanto sem essa artéria central, não temos nada. A ideia é criar um eixo comum.

Ferrovias são a solução logística que o Brasil precisa?

Sim, pelo déficit ferroviário atual. Porém estamos falando de um projeto de 20 anos, então precisamos integrar ferrovias com rodovias. Enquanto as ferrovias não vêm, podemos usar as rodovias para ir superando gargalos. Nesse sentido, o mais importante é termos um projeto de país, não de governo.

E para o ES funcionar como mecanismo eficiente de comércio exterior, o que ainda falta?

Ainda faltam muitos investimentos, especialmente nas BRs 101 e 262, que são federais. O governo estadual tem investido muito em mobilidade, mas depende do governo federal para essas vias principais. 

A duplicação da BR-262 é cara e complexa, no entanto urgente. Por outro lado, temos um complexo portuário em operação e em construção que é invejável no Brasil. A conexão entre esses modais é fundamental e é disso que trata o nosso projeto: uma solução logística para o Brasil.

O ES é constantemente citado como hub logístico. Como fazer isso deixar de ser apenas discurso?

A gente precisa vender mais o nosso Espírito Santo. E temos feito isso. Empresários e governo têm promovido grandes ações. Nas últimas décadas, o Estado construiu um ambiente favorável, com uma indústria diversificada. Somos o quinto estado mais industrializado do Brasil.

Deixamos de ter aquela “síndrome de estar entre Rio e Bahia” e passamos a ser reconhecidos nacionalmente. 

Inauguramos recentemente a Olam, em Linhares, e estamos entre os maiores exportadores de café solúvel. Tudo isso mostra que já estamos saindo do discurso e ganhando reputação nacional.

Falar em infraestrutura é falar de médio e longo prazo. Porém com a união entre setor empresarial, indústria e governo, que tem sido o maior interessado, acredito que estamos no caminho certo.

Você já citou antes essa relação do empresariado com o poder público no ES. Que diferença isso faz?

Muita diferença. Acho que, inclusive, o Espírito Santo tem sido um exemplo nisso. Eu converso com as outras federações nas nossas reuniões em Brasília, na CNI, em que se reúnem os 27 estados. Nesse sentido, de fato, é uma diferença muito grande. Ou seja, nós temos acesso, o setor produtivo de um modo geral — não só a nossa federação, mas todas as federações, instituições. A gente tem um grande acesso a discussão em todos os níveis com o Executivo e com o Legislativo também. A Assembleia está sempre disposta a ouvir e a entender, e o Judiciário da mesma forma.

Isso foi criado nas duas últimas décadas. E do mesmo modo a gente precisa ultrapassar esse estigma que tem do setor público e do setor privado. Eu acho que esse é um exemplo que o Espírito Santo tem dado. 

Acho que o setor público e o setor privado precisam desmistificar um pouco essa dificuldade de diálogo. E o mundo que deu certo está aí: é o setor público e o setor privado interagindo diretamente.

Falando dessa interação e de decisões públicas, a gente tem passado, no começo deste ano, por uma guerra tarifária, muito em função de decisões do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Como isso afeta o ES?

Sempre afeta um pouco. No entanto, claro, são decisões que ultrapassam o nosso controle, são decisões internacionais. Países defendendo seus mercados… O mundo está um pouco se reinventando nessa parte comercial. Temos a China, que de vez em quando é objeto de discussões por conta das exportações. Temos a Europa tentando se reindustrializar, como o Brasil, os Estados Unidos da mesma forma. Então, às vezes, são ações de defesa da sua produção.

No Brasil também não é diferente. A gente também tenta algumas defesas. Acho que, às vezes, precisávamos defender um pouquinho mais a nossa indústria.

A gente tem muita dificuldade no Brasil quando se fala em incentivos. A Europa, os Estados Unidos, a China, todo mundo dá incentivos. Quando a gente fala em incentivos no Brasil, parece às vezes pecado. O mundo inteiro faz isso, faz parte da competitividade. 

Do mesmo modo, acho que esse é um aspecto que a gente precisa discutir um pouco mais. Enfim, acho que essas ações do Trump talvez tenham sido um pouco exageradas, mas são uma defesa do mercado dele.

Afeta o Brasil, claro, mas o Brasil foi o país menos afetado em termos percentuais. Traz preocupações, mas acho que temos capacidade de ultrapassar essas preocupações.

Quando você fala em defesa do governo, a gente pensa logo em imposto. Vamos baixar aqui, tirar dali… porém aí vem a alta do IOF. Como você vê esse aumento?

De forma muito negativa. A indústria — e a CNI, através de todas as nossas federações — reagiu. O setor econômico, de um modo geral, reagiu. No caso da indústria, mais ainda, porque estamos num processo de reindustrialização. O próprio governo federal lançou a NIB, a Nova Indústria Brasileira, e anunciou recentemente um aporte maior de recursos.

E aí vem esse aumento do IOF, que vai na contramão disso, porque você está taxando o capital, o investimento, os recursos, os empréstimos. Se uma empresa for buscar financiamento lá fora — Europa, Estados Unidos, Ásia, não importa —, vai pagar IOF sobre o capital que foi buscar. 

Quando a gente fala em tributos, o tributo que deve ser menor é o da produção. A produção deve ter o menor tributo. O tributo tem que ser no consumo, não na produção. Esse é o modelo do mundo que dá certo. E há muitos exemplos por aí.

A Findes tem alguma medida ou iniciativa para tentar amenizar os efeitos desse aumento? 

Não. A Findes, junto com a CNI, outras federações e os demais setores econômicos, já está mobilizada. Estamos falando com o Congresso Nacional. E aí voltamos ao ponto que você levantou há pouco: o diálogo. Um ambiente saudável de discussão, republicano. 

Precisamos falar com nossos parlamentares, todas as federações, para mostrar a realidade.

E isso tem grande repercussão. Muitos setores do Congresso já manifestaram desacordo com essa medida e a discussão está boa. 

Precisamos entender que, no momento atual, a criação de um tributo como esse é muito ruim para o setor econômico, especialmente para a indústria.

Onde a indústria do ES deve chegar neste ano? E nos próximos?

Nós temos uma grande notícia, que vocês da imprensa já têm noticiado bastante: investimentos de R$ 100 bilhões até 2030. Claro que há desafios, como renda, mão de obra, logística… Porém são bons desafios. São grandes, não são fáceis, mas são desafios que precisamos enfrentar.

Esses R$ 100 bilhões não vêm de uma vez. São investimentos em tecnologia, novos parques tecnológicos, novos parques de produção. Acontecem gradualmente. Mas vejo com esperança. 

Acho que o Espírito Santo continuará crescendo acima da média nacional.

Como será o Fórum InfraLeste da Findes?

O Fórum InfraLeste vai debater essa questão da logística e acontece no dia 11 de junho. Estarão presentes o Ministério dos Transportes, o Ministério dos Portos e Aeroportos, a ANTT, a ANTAC e a Infra S.A.

Teremos algum documento oficial do fórum?

Nós, entre as federações, já temos essa articulação. Existe o nosso Conselho de Infraestrutura Nacional da CNI, e cada estado tem o seu conselho. Esses conselhos interagem entre si. Não há, propriamente, um documento formal, mas os cinco conselhos — já em diálogo com Mato Grosso e Mato Grosso do Sul — discutem, apresentam projetos e planos, que depois levamos aos ministros. A ideia é justamente essa: dar um “sacode” neles para ver se a situação anda.

Paulo Baraona é presidente da Federação das Indústrias do Espírito Santo (Findes)

Veja abaixo a entrevista completa:

Edu Kopernick

Editor de Economia

Edu Kopernick é jornalista formado na Faesa, especialista em Comunicação Organizacional pela Gama Filho, com experiência em reportagens especiais para veículos nacionais e séries sobre economia do Espírito Santo. Já teve passagens pelos principais veículos de TV, rádio e webjornalismo do Estado. É editor de Economia do Folha Vitória desde 2024, apresentador de TV e host do videocast ValorES.

Edu Kopernick é jornalista formado na Faesa, especialista em Comunicação Organizacional pela Gama Filho, com experiência em reportagens especiais para veículos nacionais e séries sobre economia do Espírito Santo. Já teve passagens pelos principais veículos de TV, rádio e webjornalismo do Estado. É editor de Economia do Folha Vitória desde 2024, apresentador de TV e host do videocast ValorES.