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Em Donetsk, Bernard dribla tanques e já pensa em sair de time

Amparado por sua família, o garoto das "pernas alegres", está na mira do Arsenal, da Inglaterra, e esse poderá ser o seu caminho para "fugir" da guerra civil

Teresópolis - Talvez Bernard não precise mais do plano de fuga de Donetsk montado pela embaixada brasileira na Ucrânia, com a ajuda de seu clube, o Shakhtar. Porque talvez o atacante da seleção brasileira nem volte para a Ucrânia, embora tenha contrato por mais quatro anos com seu time. Obrigatoriamente, ele terá de se reapresentar na cidade após a Copa do Mundo, mas poderá repensar sua carreira e vida em função dos conflitos entre o exército da Ucrânia e os rebeldes separatistas na região, que se intensificaram e registraram combates violentos, causando a morte de mais de 40 pessoas, entre elas civis, de acordo com o prefeito de Donestk, Alexander Lukianchenko. O leste do país ferve.

Amparado por sua família (pai, mãe e irmã, e mais um amigo, que considera um primo), o garoto das "pernas alegres", como definiu Felipão na Copa das Confederações, no ano passado, está na mira do Arsenal, da Inglaterra, e esse poderá ser o seu caminho para "fugir" da guerra civil. Donetsk não é mais uma cidade confiável, mesmo ele morando em condomínio fechado na cidade. Se o próprio clube e o embaixador brasileiro na região já lhe ofereceram um plano de fuga em caso de aperto, não há porque correr risco e voltar. Não nesse momento, entende.

Sua casa na Ucrânia está fechada. Enquanto Bernard se apresentou na seleção, a família fez as malas e retornou para Belo Horizonte. Ninguém pensa em embarcar novamente para Donetsk quando a Copa acabar. O Shakhtar tem dado total apoio ao jogador brasileiro, mas pediu para Bernard evitar comentar sobre o assunto. Não querem que ele se desgaste ou fique mais assustado com a situação do que deve. O fato é que após os conflitos, a vida do atacante da seleção mudou completamente em Donetsk.

O jogador, que nunca viveu nada parecido em sua carreira, já teve de passar por poucas e boas na Ucrânia. Bernard, por exemplo, disputou algumas partidas do Shakhtar, em Donetsk, com portões fechados. A polícia prefere evitar aglomerações de pessoas em locais fechados, mesmo que esportivo, desconfiada também de que alguma tragédia possa acontecer e porque não tem condições de oferecer segurança à população civil.

Se os combates persistirem, a cidade poderá receber ajuda humanitária da Rússia, que já se colocou à disposição de Kiev. O povo hoje clama por socorro. Nessas condições, Bernard e sua família não voltarão para Donetsk após a competição.

O jogador não entende os motivos do confronto civil, tampouco consegue se envolver a ponto de tomar partido de um lado ou do outro, do governo de Kiev ou dos separatistas. Nem quer. Bernard diz que essa briga não lhe pertence, não é sua, e sempre ressalta a situação de paz do povo brasileiro.

Para quem deixou há um ano a capital de Minas Gerais, onde a cordialidade e o tratamento das pessoas com os forasteiros são invejáveis, morar em uma cidade em conflito é assustador. Bernard tem de desviar de tanques de guerra para chegar ao clube em dias de treinos. Já foi parado nos bloqueios de rua feitos pelo exército, embora nunca tenha chegado perto dos combates com os separatistas. Anda de carro de casa para o clube e do clube para casa, sempre na mesma rota.

O Shakhtar tem sido honesto com ele e sua família. Não esconde os riscos dos conflitos armados e procura preservar o brasileiro de se deparar com situações perigosas. Por vezes, Bernard teve de esperar na sede do time por mais de uma hora antes de ir embora, para não cruzar na estrada com manifestantes separatistas.

Embora entenda pouco dessa guerra, a família do jogador da seleção repensa a carreira do filho. Enquanto tenta ajudar o Brasil a comemorar seu sexto caneco mundial, Bernard ganha tempo e torce para os ucranianos se acertem pela paz.

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