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Para Mário Gobbi, clubes estão em um 'quadro caótico'

Para Mário Gobbi, clubes estão em um ‘quadro caótico’ Para Mário Gobbi, clubes estão em um ‘quadro caótico’ Para Mário Gobbi, clubes estão em um ‘quadro caótico’ Para Mário Gobbi, clubes estão em um ‘quadro caótico’

São Paulo – Por pouco mais de uma hora, o presidente do Corinthians, Mário Gobbi, recebeu a reportagem em sua suntuosa sala no Parque São Jorge. Enquanto queimava a vela que o dirigente mantém ao lado das imagens de Jesus Cristo, Nossa Senhora de Fátima, São Jorge, Nossa Senhora Aparecida, São José e outros santos, ele não falou apenas do Corinthians. Falou sobretudo sobre o atual momento do futebol brasileiro e fez seu diagnóstico: os clubes não suportam mais o mercado inflacionado que eles mesmos criaram.

Agência Estado – Depois da Copa, abriu-se uma ampla discussão sobre o futebol brasileiro. Como o Corinthians pode contribuir para o debate?

Mário Gobbi – O Brasil precisa rever conceitos e métodos de gestão dos clubes. Passamos por uma crise muito difícil porque deixamos inflacionar as despesas, tudo em busca de querer montar o melhor time. Isso tem de mudar. Não se monta time em três meses. Você tem de dar tempo ao grupo. Foi assim que o Corinthians chegou ao Mundial. O futebol brasileiro vive hoje em um patamar de finanças incompatível com a economia do País. Pagamos salários que não são mais possíveis de os clubes arcarem.

AE – O senhor defende teto salarial?

Mário Gobbi – Se você deixar cada um fazer o que pensa, não vamos chegar a um consenso. Tem de ter regras limitativas. A principal delas é que um clube não pode gastar mais do que recebe. É o que o Proforte propõe, sob pena de o dirigente arcar com o seu patrimônio particular e o clube arcar tecnicamente saindo do campeonato e caindo de divisão. Impor teto salarial é complicado porque cada profissional tem o seu valor. Equacionar isso é difícil, mas a união de todos para buscar uma solução é imperativo.

AE – Qual é o valor ideal de uma folha de pagamento?

Mário Gobbi – Nossa folha é de R$ 8 milhões e teríamos de cortar no mínimo 50%. Temos de adequar os custos à receita atual. É claro que cada clube tem a sua folha de pagamento, mas todos precisam se adaptar à nova realidade financeira do País. Os clubes não suportam mais manter esse ritmo alucinante de contratações e salários de valores exorbitantes.

AE – A Globo chamou os clubes justamente para falar sobre essa questão. Como foi a sua conversa com a emissora?

Mário Gobbi – Em nenhum momento se falou que a audiência caiu e que a Globo queria aumentar a receita dela. A Globo nos chamou para estudarmos medidas para arrumar o desarranjo financeiro pelo qual os clubes passam. A reunião foi para melhorar o quadro caótico em que entramos. Eles querem fortalecer os clubes e cortar a hemorragia financeira para o campeonato ser mais atrativo.

AE – Os clubes menores dizem que a divisão das cotas de transmissão é injusta. O senhor aceita rever esses valores?

Mário Gobbi – As cotas não podem mudar até 2018 porque há um contrato em vigor. É muito cedo para falar sobre isso agora. É claro que quem ganha menos quer ganhar mais e quem ganha mais entende que ganha mais porque merece. É uma discussão sem fim. Podemos sentar e achar outros critérios para, quem sabe, corrigir uma eventual disparidade, mas cada um tem o seu valor e a sua força de mercado.

AE – Uma espécie de Clube dos 13 pode voltar?

Mário Gobbi – A experiência pela qual passamos com o Clube dos 13 foi um fracasso. Todos os clubes estão pagando até hoje uma prestação para saldar o débito que restou lá. A solução está entre nós, não importa a nomenclatura. Temos de sentar com federações, CBF e clubes para formar um esqueleto da gestão necessária para fazer mudanças no futebol. A presidente Dilma Rousseff tem nas mãos a chance de fazer um grande bem para o futebol. O Proforte nada mais é do que equacionar a forma de os clubes pagarem suas dívidas. Não é anistia, nem perdão. Você faz um projeto de lei e envia para o Congresso e, quando chega lá, todo mundo tem uma emenda e não sai nada. A medida provisória é um ato não democrático, mas necessário em uma situação de necessidade.

AE – O Corinthians assume a sua parcela de culpa nesse quadro caótico que o senhor falou?

Mário Gobbi – Na parte financeira, sim. O Corinthians, nos últimos anos, foi a sensação do futebol brasileiro e colaborou para o valor exacerbado a que chegou o patamar de salários, luvas e imagem de técnicos e jogadores.

AE – Contratar o Alexandre Pato foi um erro?

Mário Gobbi – Compramos o Pato porque o Corinthians precisava de um artilheiro para fazer gols e alavancar as vendas. Ele é um ícone, que depois venderíamos para recuperar o investimento de 15 milhões de euros (R$ 43 milhões). Depois que trouxemos o Pato, o dinheiro começou a sumir do mercado. Isso foi um baque que não só o Corinthians, mas os outros grandes clubes sentiram do mesmo jeito. Quem não comprou o Pato afundou da mesma forma. Temos de torcer para que ele jogue bem e consiga produzir o que pode para a gente recuperar o investimento.

AE – Como o Corinthians pode voltar a revelar jogadores?

Mário Gobbi – O Corinthians revela, o problema é que não vinga. Nem sempre o garoto quando sobe para o profissional consegue render o que jogava na base. O Jô, por exemplo, foi revelado aqui, assim com o Everton Ribeiro e o Willian. Na época, ninguém teve paciência para esperar eles atingirem o patamar em que estão hoje. O mal do futebol é o imediatismo.

AE – Qual é a sua avaliação da temporada do Corinthians?

Mário Gobbi – Começamos a montar um time no meio do Campeonato Paulista e querem que a gente ganhe tudo. O time que estamos montando é muito bom, mas no ano que vem será melhor ainda. Nosso time tem potencial, mas é preciso ter paciência.

AE – Como está a gestão do Itaquerão (a Arena Corinthians)?

Mário Gobbi – O estádio tem uma gestão independente. É incompatível tocar o Corinthians e o estádio. Tem um fundo que cuida de receitas e despesas. Será assim durante os 10 anos que temos para pagar as dívidas. Receitas que entram lá ficam lá para abater a dívida. A bilheteria está estourando, temos renda de quase R$ 2 milhões por jogo, mas não entra um centavo para o clube. Vai tudo para amortizar a dívida.

AE – O ex-presidente Andrés Sanchez anunciou que estava de saída da gestão do estádio. Quem será o novo gestor?

Mário Gobbi – O Andrés não se afastou e continua como gestor. É um cargo pesado, estressante. O Andrés vem num ritmo alucinante. Às vezes acaba desabafando, mas foi só isso.

AE – E os “naming rights”?

Mário Gobbi – Estamos em busca e ele virá. Assinei duas vezes a autorização para o negócio ser fechado, mas não deu certo. Estamos conversando com as empresas.

AE – O senhor diz que mantém uma relação de respeito e diálogo com as torcidas organizadas. Depois de tantos casos de violência, o senhor acha que essas facções respeitam o Corinthians e têm de dialogar com a diretoria?

Mário Gobbi – Não compete aos clubes combater a violência. Se torcedores praticam atos de vandalismo, o aparato estatal tem de investigar e prender. Não vejo problema em receber na minha sala um grupo de torcedores. Aqui, eles se comportam bem. Na testa de cada um não está escrito quem é bandido.