O tarifaço de Trump e os riscos para o agro capixaba

O mês de agosto começa com um alerta vermelho para o agronegócio brasileiro, especialmente, para o Espírito Santo. A decisão do presidente dos Estados Unidos de aplicar uma tarifa de 50% sobre todos os produtos importados do Brasil promete reconfigurar as rotas do comércio internacional e impactar duramente setores produtivos, industriais e agropecuários do país. No caso capixaba, a situação é ainda mais delicada: somos o estado mais exposto proporcionalmente ao mercado americano entre todas as “Onças Brasileiras”, grupo de estados com forte dinamismo econômico, alto IDH e presença marcante nas exportações nacionais.

Segundo dados da Futura Inteligência, cerca de 28,6% de tudo que o Espírito Santo exportou em 2024 teve como destino os Estados Unidos. Apenas esse dado já seria suficiente para acender o sinal de alerta, mas os detalhes da pauta exportadora agravam ainda mais o cenário: os cinco produtos mais exportados do estado para os EUA (ferro e aço, rochas ornamentais, celulose, minério de ferro e café) estão todos sujeitos à nova tarifa. Juntos, eles representam mais de 96% da nossa pauta de exportação para aquele país.

Além disso, o Espírito Santo exportou, em 2024, mais de US$ 3 bilhões em produtos para os Estados Unidos, valor superior ao total exportado por estados tipicamente agroexportadores, como Mato Grosso e Goiás. Enquanto esses estados destinaram cerca de 1,5% e 3,3% de suas exportações ao mercado americano, respectivamente, o Espírito Santo concentrou quase 30% de sua pauta no comércio com os EUA, o que o coloca como o mais vulnerável ao chamado tarifaço de Trump.

E os impactos não se restringem ao estado. Projeções do Nemea/Cedeplar-UFMG indicam que o Brasil pode perder R$ 51 bilhões em exportações no curto prazo. O PIB nacional deve recuar cerca de R$ 19 bilhões, com perda estimada de 110 mil empregos, sendo o setor agropecuário o mais afetado, com redução de mais de 41 mil postos de trabalho.

No Espírito Santo, os reflexos serão sentidos no PIB estadual. Estimativas apontam uma possível queda de R$ 605 milhões, com efeito direto sobre a produção, o emprego e a arrecadação. Em um estado onde o agro e as exportações sustentam uma fatia expressiva da economia, esse impacto não é apenas estatístico: ele compromete o dia a dia de produtores, agroindústrias, cooperativas e trabalhadores rurais.

E o que isso significa para o agro capixaba?

Significa, em primeiro lugar, insegurança para centenas de empresas e milhares de produtores que se especializaram em atender o mercado americano. Empresas exportadoras de rochas ornamentais, por exemplo, que fizeram grandes investimentos em modernização e certificações para garantir acesso ao exigente mercado dos EUA, agora se veem diante da incerteza de manter contratos ou preços competitivos. O mesmo vale para o setor cafeeiro, em que mais de 200 milhões de dólares em exportações partindo do ES para os EUA podem ser comprometidos.

Do total exportado de café brasileiro para os Estados Unidos, 89% têm origem nos estados classificados como “Onças”, e o Espírito Santo se destaca como um dos principais polos produtores desse grão que carrega identidade e tradição. Uma tarifa de 50% pode representar a perda de competitividade num dos mercados mais estratégicos do mundo.

Além disso, a medida afeta diretamente o modelo de desenvolvimento econômico do Espírito Santo, que tem na exportação de commodities com valor agregado uma de suas principais fontes de crescimento. É preciso lembrar que exportar é mais do que vender produtos: é gerar emprego, girar a economia, financiar inovação.

Oportunidade em meio à crise?

Em momentos de crise, o agro sempre demonstrou capacidade de reinvenção. É hora de ampliar estratégias de diversificação de mercados, de fortalecer relações comerciais com países da Europa, Ásia e Oriente Médio, além de investir em acordos bilaterais que ofereçam mais segurança e previsibilidade para os produtores brasileiros.

Também se torna urgente o fortalecimento das governanças locais e regionais, com políticas públicas que apoiem a internacionalização de pequenas e médias agroindústrias, capacitação em inteligência comercial e incentivos para o uso de tecnologia nas cadeias exportadoras.

Enquanto aguardamos as movimentações diplomáticas em Brasília, o agro capixaba precisa fazer o que sempre fez: se adaptar, resistir e transformar adversidade em estratégia. Mas fique claro: o campo capixaba não pode pagar sozinho o preço de um embate geopolítico.

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Stefany Sampaio
Stefany Sampaio

Colunista

Stefany Sampaio revela o universo do agronegócio capixaba de Norte a Sul, destacando dados, histórias inspiradoras, produtores e os principais acontecimentos do setor.

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