A recém-sancionada Lei nº 15.211/2025, conhecida como ECA Digital, vai impactar diretamente o mercado de jogos eletrônicos, loot boxes e plataformas digitais a partir de março de 2026.
Entre as principais mudanças estão a proibição das loot boxes pagas — as populares caixas de recompensa com conteúdo aleatório — em jogos voltados ou acessíveis a crianças e adolescentes, além de regras rígidas para moderação, controle parental e proteção da comunicação entre usuários.
A nova norma ganhou ainda mais atenção após declarações do influenciador Felca, que denunciou a exposição precoce de crianças a ambientes digitais com forte conteúdo adulto. O debate viralizou nas redes, mas, segundo Marcelo Mattoso, sócio do Barcellos Tucunduva Advogados (BTLAW) e especialista em games e eSports, o problema vai além da exposição: trata-se de uma lacuna legal que agora começa a ser preenchida com rigor.
“Não é mais suficiente um jogo dizer que é ‘para maiores’ na loja de apps. A lei analisa se há atratividade, facilidade de acesso e risco real para crianças. Se houver, o jogo se enquadra e deve seguir todas as regras”, explica.
O que a lei exige de jogos e plataformas
De forma clara, a nova legislação determina que loot boxes pagas estão proibidas em qualquer jogo com classificação etária abaixo de 18 anos ou que tenha acesso provável por menores. Isso vale mesmo que o game não tenha sido criado especificamente para o público infantil.
“A lei não se limita ao direcionamento declarado. Ela considera fatores como linguagem simples, visual colorido, marketing apelativo e presença massiva de jogadores menores. Isso muda completamente o cenário regulatório no Brasil”, afirma o advogado.
Além disso, jogos com interações por texto, voz ou vídeo deverão, por padrão, ter essas funções bloqueadas para menores, a não ser que os responsáveis legais ativem a liberação. Também será obrigatória a implementação de moderação ativa, filtros e mecanismos de denúncia.
Quem descumprir a lei poderá receber multas de até 10% do faturamento do grupo econômico, além de ter o jogo suspenso ou até banido do país. “As empresas precisarão reavaliar toda a jornada do usuário jovem: desde o design até a operação do jogo. Isso envolve classificação, monetização, comunicação e medidas de proteção ativa. Não é uma opção: é uma obrigação legal”, destaca Mattoso.
Ainda de acordo com o especialista, na prática, se o item virtual tiver seu conteúdo claramente informado antes da compra, a venda é permitida, mesmo em jogos acessíveis por crianças ou adolescentes.
A exceção não depende de idade ou classificação: qualquer jogo pode vender conteúdos pagos, inclusive cosméticos ou vantagens, desde que informados previamente ao jogador. “A venda de “pacotes surpresa” ou “cofres misteriosos”, mesmo com aviso parcial, não é válida, exceto se a informação for completa, clara, precisa e acessível.”, finaliza.
Lei vale também para jogos e plataformas estrangeiras
A abrangência da nova lei inclui qualquer produto digital acessível no Brasil, mesmo que seja estrangeiro. Isso coloca no radar plataformas como Steam, Google Play, App Store, Discord, Roblox e outros serviços com forte apelo entre o público jovem. Caso ofereçam jogos ou espaços com loot boxes pagas ou interação sem controle parental, estarão sujeitos às mesmas penalidades.
Além da parte voltada a jogos, a lei também trata da remoção imediata de conteúdos relacionados a abuso, exploração sexual, aliciamento ou sequestro de menores, com notificação obrigatória às autoridades competentes, tanto nacionais quanto internacionais. As empresas devem ainda reter dados e conteúdos relacionados aos incidentes, conforme o Marco Civil da Internet.
“O ECA Digital representa um novo patamar de responsabilidade para todo o ecossistema digital. A partir de agora, oferecer uma plataforma para menores sem os devidos controles pode gerar consequências sérias no âmbito jurídico e reputacional”, conclui o especialista.